Carta enviada a OAB/SP contesta resultado do 128º Exame da Ordem
Grande celeuma que envolve o ponto 3 da prova de civil da segunda fase da OAB foi motivo de revolta dos estudantes da PUC-SP, USP e MACKENZIE.
Segundo os alunos, eles foram injustamente prejudicados por um entendimento da OAB e por isso enviaram uma carta diretamente ao presidente Luiz Flávio Borges D’Urso para contestar o resultado (veja íntegra da carta abaixo). Sobre o assunto, veja também os pareceres dos ilustres professores Candido Rangel Dinamarco (clique aqui) e Flávio Luiz Yarshel (clique aqui).
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São Paulo, 5 de abril de 2006
EXCELENTÍSSIMO DR. LUIZ FLÁVIO BORGES D’URSO PRESIDENTE DA OAB, SECÇÃO SÃO PAULO – OAB/SP
Ref.: 128º Exame de Ordem – 2ª Fase – Direito Civil – Ponto No 3
O Centro Acadêmico “XI de Agosto”, o Centro Acadêmico “22 de Agosto” e o Diretório Acadêmico “João Mendes Jr.”, entidades representativas dos estudantes das Faculdades de Direito da Universidade de São Paulo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Universidade Presbiteriana Mackenzie, respectivamente, vêm, por meio deste, expor o que segue para ao final requerer.
Fomos procurados por muitos bacharéis em Direito formados em nossas faculdades, nessa última segunda-feira, 3 de abril do corrente ano, os quais nos apresentaram o Ponto 3, sua respectiva Questão e o Gabarito da Prova de Direito Civil da 2ª Fase do 128º Exame de Ordem:
“PONTO 3 - Empresa de Cosméticos Cara-Pintada Ltda, situada na cidade de Osasco (SP) é fabricante de toda a linha de maquilagem Beija-Flor e fornece produtos para MM Loja de Departamentos S/A, localizada em São Paulo (SP). Suzana Costa adquire o kit vendido pela loja contendo batom, sombra, rímel, perfume, cremes para o corpo e rosto e paga pelo produto R$ 1.000,00. Todavia, o uso dos produtos provoca séria alergia em Suzana que se vê obrigada a custear um tratamento dispendioso, necessitando de internação hospitalar e repouso de duas semanas. Ingressa com ação de reparação de danos contra as empresas e obtém a condenação solidária que as obriga à indenização de R$ 300.000,00 em razão dos danos morais e materiais sofridos. A ação é proposta em Santos (SP), local onde reside Suzana. Na fase de execução definitiva do julgado, tem-se conhecimento que as empresas confundiram seus patrimônios com os dos sócios, baixaram suas portas e encerraram suas atividades de modo irregular. O Juiz, aplicando o art. 28 do Código de Defesa do Consumidor entende por bem desconsiderar a pessoa jurídica, ordenando que a execução prossiga contra seus sócios, entendendo que todos eles são responsáveis secundários pela dívida. Tal decisão foi proferida em janeiro de 2005.
No ato de penhora, é apreendido um imóvel residencial situado em São Paulo, na Vila Olímpia, avaliado em R$ 400.000,00 de propriedade de Paulo Torto, sócio minoritário que detém 1% do capital social da 1a empresa e 2% da 2a. Paulo adquiriu o imóvel através de sucessão hereditária, conta com 70 anos de idade e é o único bem que possui para sua moradia”.
“QUESTÃO: Como advogado(a) de Paulo promova a ação cabível, observando que os sócios majoritários eram administradores da sociedade e que Paulo Torto não teve qualquer administração na gestão societária. Considere, ainda, que Paulo Torto temconhecimento que os sócios majoritários possuem diversos bens livres e desembaraçados que possam sofrer a constrição no município por onde corre a
execução”.
“GABARITO – DIREITO CIVIL – PONTO 3 – EMBARGOS À EXECUÇÃO, PODENDO USAR O BENEFÍCIO DA EXCUSSÃO E PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO (ART. 596 E 1211-A CPC)”.
Relataram que promoveram, como resposta a essa questão, a ação de embargos de terceiro, entretanto, a única medida aceita como certa pela Comissão Permanente de Estágio e Exame de Ordem da OAB/SP, conforme pode ser verificado em fonte oficial www.oabsp.org.br, foi a ação de embargos à execução, o que resultou em suas respectivas reprovações.
Contudo, convictos de seu conhecimento, buscaram amparo na legislação, doutrina e jurisprudência, além dos pareceres dos eminentes juristas CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO e LUIZ FLÁVIO YARSHELL, em anexo, os quais expõem a divergência existente acerca da questão e, mais do que isso, confirmam e fundamentam a a plena admissibilidade e correição técnica da ação proposta por esses bacharéis – embargos de terceiro.
Tal entendimento baseia-se no fato de a questão constante do Ponto nº 3 da Prova de Direito Civil da Segunda Fase do 128º Exame de Ordem não apresentar, no bojo de seu substrato fático, a circunstância de ter o propenso peticionário sido citado, portanto, inserido na relação jurídica processual consistente na ação de execução movida contra a sociedade de que seria sócio.
Nesse contexto, levando-se em conta a orientação correntemente fornecida pela própria Ordem dos Advogados do Brasil, de que a resolução das questões dos exames deve levar em conta exclusivamente as informações contidas em seus enunciados, os examinandos não poderiam atribuir ao peticionário a condição de parte do processo de execução. Isso porque, como conceitou CHIOVENDA, é parte no processo “aquele que pede, aquele em cujo nome é pedida ou aquele em relação ao qual se pede a atuação da vontade concreta da lei”. Em outras palavras, parte é aquele que integra a relação jurídica processual, sendo sujeito da dialética do processo, e, portanto, inserido no contraditório instituído perante o juiz. Em medida alguma o enunciado do referido Ponto nº 3 deixa evidente ser o peticionário dotado de tais características.
Ademais, a condição de parte não é adquirida de maneira aleatória, devendo existir um fato jurídico processual que determine a inclusão de um sujeito no processo. Sob a sistemática processualista brasileira, torna-se parte, o autor, mediante a propositura da demanda, e o réu, mediante a citação válida e plenamente eficaz.
Do que se apreende que, não estando explícita a ocorrência de citação do peticionário na questão proposta, adequado serio o entendimento dos examinandos que assumissem como premissa que tal citação não teria ocorrido, não podendo o peticionário, portanto, ser considerado parte do processo de execução: deveria ser tido, por conseguinte, com inarredável acerto, como terceiro relativamente àquela relação jurídica processual.
Ora, dentre os remédios processuais destinado à desconstituição da constrição judicial incidente sobre bens sujeitos a execução forçada, apenas um é adequado à defesa da posse ou propriedade detidas por indivíduos que não figurem como parte do respectivo processo de execução: a ação de embargos de terceiro.
Significa dizer que tal ação é o instrumento processual do qual o terceiro poderia lançar mão para a proteção de bens de sua propriedade ou posse submetidos a penhora. Soma-se às divergências doutrinárias e jurisprudenciais, a discordância de entendimento entre os próprios membros da Comissão de Estágio e Exame de Ordem da OAB/SP, na medida em que temos conhecimento de, pelo menos, três casos de bacharéis que promoveram como resposta a mesma ação, obtiveram pontos na correção dessa questão e foram aprovados.
Diante do exposto, reforçamos os diversos pedidos de recursos referentes a essa questão solicitando, respeitosamente, que a resposta seja reconsiderada, sob pena de se punir a qualidade da formação e senso crítico oferecida por nossas tradicionais instituições de ensino jurídico - as quais proporcionaram o aprofundamento do estudo dessa matéria e a conseqüente conclusão da possibilidade da ação de embargos de terceiro - e de se privar injustamente a integração desses bacharéis nos quadros de nossa Ordem dos Advogados do Brasil. Agradecemos a atenção dispensada.
Cordialmente,
CENTRO ACADÊMICO "XI DE AGOSTO"
Caio Miranda Carneiro
Presidente
CENTRO ACADÊMICO "22 DE AGOSTO"
Steban Saavedra Sandy
Presidente
DIRETÓRIO ACADÊMICO "JOÃO MENDES JR."
Leonardo Marchant
President
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