Em parecer, os juristas e professores Celso Antônio Bandeira de Mello e Fabio Konder Comparato afirmam que "a atual pretensão de impeachment, em termos jurídicos, é literalmente absurda, pois não tem o mais remoto suporte no direito positivo".
O documento foi elaborado em resposta à consulta do advogado Flávio Crocce Caetano, que em julho deixou o cargo de secretário da Reforma do Judiciário no MJ, para chefiar a defesa da presidente Dilma Rousseff em uma investigação judicial em trâmite no TSE.
Flávio Caetano traz questões relacionadas, entre outros, ao alcance do art. 86, §4º, da CF, ao parecer do TCU pela rejeição de contas presidenciais, às hipóteses configuradoras do crime de responsabilidade, e à possibilidade de cassação de mandato de presidente e vice-presidente da República pelo TSE.
O art. 86, §4º, da CF, estabelece que "o presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções". Para os juristas, o texto é claro ao falar que só deve ser retirado do cargo o presidente da República que, "no curso de seu atual mandato, haja atentado gravemente contra a Lei Maior. No mesmo sentido, argumentam que mandatos sucessivos são mandatos distintos e "não se somam, como se fora um contínuo, a formar uma unidade, que houvera resultado de uma única eleição".
"Não se pode, pois, suplantar a vontade popular expressa no resultado eleitoral para buscar em outro momento histórico e jurídico o fundamento requerido para o 'impeachment', sem estar com isto ofendendo até mesmo o princípio republicano."
Com relação ao parecer do TCU pela rejeição das contas eleitorais, os professores explicam que tal entendimento deve passar por aprovação do Congresso e, mesmo que a rejeição venha a ser aprovada, esta não se confunde com a prática do crime de responsabilidade. Além disso, caso esteja configurado o crime de responsabilidade, segundo Bandeira de Mello e Comparato, "somente condutas comissivas dolosas perfariam um comportamento tão agressivo aos valores da República ao ponto de requererem a expulsão do primeiro mandatário".
"O instrumento jurídico do 'impeachment' não pode ser brandido de maneira a cumprir aquilo que na expressiva dicção utilizada na linguagem do esporte mais popular do Brasil, se traduz no dito corrente de 'ganhar no tapetão', quando um clube de futebol, esmagado em campo por força da superioridade do adversário, quer vencê-lo de qualquer modo, nem que seja por esta via inidônea e não se peja de assumir uma atitude desabrida."
Por fim, sustentam que o TSE não pode desconstituir os mandatos do presidente da República e do vice-presidente, em ação de impugnação de mandato eletivo. "Dado que a própria Constituição regrou o tema do impedimento não se pode aceitar nenhuma forma de efetuá-lo senão aquela mesma ali estabelecida."
Confira a íntegra do parecer.
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CONSULTA:
I - Qual o alcance e o significado do art. 86, parágrafo 4º da Constituição Federal?
II - Eventual parecer do Tribunal de Contas da União pela rejeição de contas presidenciais precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional?
III - Tal reprovação caracteriza hipótese caracterizadora de crime de responsabilidade?
IV - Em se tratando da prática de eventual crime de responsabilidade, o Presidente da República poderá responder tanto por conduta comissiva como omissa? Pode ser responsabilidade apenas na modalidade dolosa ou na culposa também?
V - Pode o Presidente da República e seu vice terem o seu mandato cassado por decisão do Tribunal Superior Eleitoral em ação de impugnação de mandato eletivo, ao arrepio dos artigos 85 e seguintes da Constituição Federal?
RESPOSTAS:
I – O alcance e o significado do art.86, parágrafo 4º da Constituição Federal, são os de retirar do cargo de Presidente da República aquele que, no curso de seu atual mandato, haja atentado gravemente contra a Lei Maior, afim de impedir que continue em condições de fazê-lo;
II - Eventual parecer do Tribunal de Contas da União pela rejeição de contas presidenciais precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional para produzir dito efeito, já que é ao Congresso Nacional, auxiliado por aquele órgão, quem tem o poder de rejeitá-las;
III - Tal reprovação não é bastante para caracterizar a figura do crime de responsabilidade, até porque não há quorum especial para o Legislativo reprová-las, ao passo que o simples recebimento de acusação de crime de responsabilidade do Presidente da República, a afim de que este possa ser submetido a julgamento perante o Senado Federal, só pode ser aceito por dois terços da Câmara dos Deputados;
IV- Em se tratando da prática de eventual crime de responsabilidade, o Presidente da República só poderá responder por conduta comissiva e dolosa;
V - Nem o Presidente da República, nem seu vice podem ter seus mandatos cassados por decisão do Tribunal Superior Eleitoral em ação de impugnação de mandato eletivo, ao arrepio dos artigos 85 e seguintes da Constituição Federal.