Migalhas Quentes

Judiciário pode determinar ao Executivo a realização de obras em presídio

STF entendeu que determinação é possível para garantir dignidade da pessoa humana e respeito à integridade física e moral de detentos.

13/8/2015

Por unanimidade, na sessão plenária desta quinta-feira, 13, o STF decidiu que o Poder Judiciário pode obrigar a União ou governos estaduais a realizar obras em presídios para garantia constitucional da integridade física dos presos.

O plenário deu provimento a RExt interposto pelo MP/RS contra acórdão do TJ gaúcho que entendeu ser descabida ação civil pública para determinar ao poder Executivo a realização de obras em presídio, mesmo pleiteadas a título de direito constitucional do preso, por não caber ao poder Judiciário imiscuir-se em matéria reservada à Administração.

Os ministros acompanharam o voto do relator, Ricardo Lewandowski.

No recurso, o MP alegou que o dever de assegurar a integridade física e moral dos presos não depende de prévia dotação orçamentária, uma vez que se trata de direito de natureza fundamental de aplicabilidade imediata. Para o parquet, questões de ordem orçamentária não podem impedir ou postergar políticas públicas dirigidas à implementação de direitos de natureza fundamental.

Em seu voto, Lewandowski relatou a situação das penitenciárias brasileiras, que encarceram atualmente mais de 600 mil detentos, revelando situações subumanas, violadoras do principio constitucional da dignidade da pessoa humana, além de revoltas, conflitos, estupros e até homicídios, incluindo casos de decapitação. No caso do Albergue de Uruguaiana, discutido no recurso em julgamento, o presidente revelou que um preso chegou a morrer eletrocutado, em consequência das péssimas condições do estabelecimento. O próprio TJ/RS, lembrou o presidente da Corte, apesar de reformar a decisão do juiz de primeiro grau, reconheceu a situação degradante dos presos.

O ministro ressaltou que a sujeição dos presos às condições degradantes mostra com "clareza meridiana” que o Estado hoje está os sujeitando "a uma pena que ultrapassa a mera pena privativa de liberdade prevista na sentença, porquanto acresce a ela um sofrimento físico, psicológico e moral, o qual além de atentar contra toda noção que se possa ter de respeito a dignidade da pessoa humana, retira da sanção qualquer potencial de ressocialização." A intervenção do Judiciário, nesses casos, de acordo com ele, também tem a função de impedir esse excesso de execução.

Para Lewandowski, o valor da dignidade da pessoa humana no sistema constitucional "permite sim a intervenção judicial para que seu conteúdo mínimo seja assegurado aos jurisdicionados em qualquer situação em que estes se encontram." O presidente disse ainda que não se pode falar em desrespeito ao princípio da separação do Poderes, e citou o princípio da inafastabilidade da jurisdição, uma das garantias basilares para efetivação dos direitos fundamentais. O dispositivo constitucional (artigo 5º, inciso XXXV) diz que a lei não subtrairá à apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito. Esse postulado, conforme ressaltou, é um dos pilares do Estado Democrático de Direito.

Lewandowski apontou que o tratamento dispensado aos detentos no sistema prisional brasileiro rompe com o dogma universal "segundo o qual eles conservam todos os direitos não afetados pelo cerceamento de sua liberdade de ir e vir, garantia expressa com todas as letras no artigo 3º da nossa lei de execução pena." Para ele, não há falta de verba, "há falta de vontade política" na questão.

Acompanhando o relator, o ministro Edson Fachin salientou que o magistrado não pode, nem pretende, substituir o gestor público, mas deve compelir através de medidas eficazes - que a luz das escolhas políticas do gestor público - seja cumprindo o programa constitucional que é vinculante.

No mesmo sentido, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que o Judiciário deve interferir para determinar a realização de obras em presídios cuja situação seja atentatória a dignidade da pessoa humana. Barroso pontuou que a reserva do possível não pode ser um artifício para que o Estado deixe de cumprir situações nas quais ele tem o dever jurídico evidente de atuar. Segundo ele, o Estado tem que alocar recursos escassos observando as prioridades impostas na Constituição. "Preservar os aspectos mínimos da dignidade da pessoa humana não é uma escolha política, é uma imposição da Constituição, e que não está sujeita a reserva do possível."

A ministra Rosa Weber também acompanhou o relator. Para ela, quando estão em jogo direitos fundamentais, e diante de uma omissão injustificada do Administrador Público, "pode sim o poder judiciário impor a implementação de politicas públicas que são asseguradas pela nossa CF."

Ao votar, a ministra Cármen Lúcia lembrou que algumas políticas públicas não "dão" voto, como é o caso das que favorecem as penitenciárias. "Na verdade, não se investe nisso por vontade política porque a política fica impregnada na possibilidade de depois contar o que fez para angariar votos."

O ministro Gilmar Mendes asseverou que o STF não estava determinando a formulação de uma politica pública, estava "determinando que atos administrativos e atos concretos sejam tomados para corrigir excessos inclusive no que diz respeito ao próprio excesso de execução."

Veja a íntegra do voto do relator.

Confira a íntegra do voto do ministro Barroso.

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