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Decisões do STJ abordam a prática da venda casada

Prevista no inciso I do artigo 39 do CDC, a prática é caracterizada pela presença de duas diferentes formas de condicionamento.

14/1/2013

Com a venda casada se tornando comum no mercado, STJ traz especial sobre o tema e o direito do consumidor. Prevista no inciso I do artigo 39 do CDC, a prática é caracterizada pela presença de duas diferentes formas de condicionamento, seja por vincular a venda de bem ou serviço à compra de outros itens, seja pela imposição de quantidade mínima de produto a ser comprado.

A jurisprudência do Tribunal não oferece respostas para todas as situações, mas orienta o consumidor na sua decisão. Em um julgamento de 2008, a 3ª turma do Tribunal considerou que o mutuário não é obrigado a adquirir seguro habitacional da mesma entidade que financie o imóvel ou por seguradora por ela indicada, mesmo que o seguro seja obrigado por lei no Sistema Financeiro de Habitação (Resp 804.202).

O STJ considerou que é venda casada condicionar a concessão de cartões de crédito à contratação de seguros e títulos de capitalização. Em um caso, os valores eram incluídos nas faturas dos clientes por representante de lojas de departamento, que alegou que o título era uma garantia, na forma de penhor mercantil, do pagamento da dívida contraída junto ao cartão, o que estaria permitido pelo art. 1419 do CC/02. Prevaleceu a tese de que a circunstância de os títulos de capitalização serem utilizados como garantia do crédito concedido, semelhante ao penhor mercantil, não seria suficiente para afastar o reconhecimento da prática abusiva (Ag 1.204.754).

Pipoca

Em julgado de 2007, o STJ decidiu que os frequentadores de cinema não estão obrigados a consumir unicamente os produtos da empresa vendidos na entrada das salas. A empresa foi multada por praticar a venda casada ao permitir que somente produtos adquiridos em suas dependências fossem consumidos nas salas de projeção (Resp 744.602). A decisão considerou que a situação é diferente da que ocorre em bares e restaurantes, em que a venda de produtos alimentícios constitui a essência da atividade comercial.

A empresa cinematográfica argumentou que o consumidor poderia assistir ao filme sem nada consumir, razão pela qual não havia violações da relação de consumo, e sustentou também que prevalecia o direito de não intervenção do Estado na economia.  Para os ministros do STJ, o princípio de não intervenção do Estado na ordem econômica deve obedecer aos princípios do direito ao consumidor, que deve ter liberdade de escolha.

Refrigerante

Em 2009, o STJ decidiu que um posto de gasolina não poderia vincular o pagamento a prazo da gasolina à aquisição de refrigerante.  O CDC não proíbe o fornecedor de oferecer promoções e vantagens aos clientes que queiram adquirir mais de um produto, mas proíbe expressamente condicionar a venda de um produto a outro, o que também é previsto no Código de Defesa da Concorrência (lei 8.884/94).

A empresa alegou que o cliente, no caso, não estava forçado a adquirir refrigerantes, sendo que a venda fazia parte apenas de um pacote promocional para pagamento a prazo. De acordo com os ministros, a prática abusiva se configurou pela falta de pertinência, ou necessidade natural na venda conjunta dos produtos. Embora o fornecedor tenha direito de decidir se o pagamento será a vista ou a prazo, não pode condicionar a venda de um produto a outro, como forma de suposto benefício (Resp 384.284).

Lanches

Em 2010, o Tribunal determinou a reunião na JF das ações civis públicas propostas contra as redes de lanchonetes Bob’s, McDonald’s e Burger King, em razão da venda casada de brinquedos e lanches fast-food. A Justiça de SP e a JF paulista analisam ações semelhantes propostas pelos MPF e MPE (CC 112.137).

O MP/SP ingressou na 18ª vara Cível de São Paulo pedindo a condenação da rede Bob’s em ação que visa à venda em separado de brinde, que só é entregue com a compra de lanche infantil. Em outra ação, o MPF pede na 15ª vara Cível da seção judiciária de São Paulo que as redes Bob’s, McDonald’s e Burger King não comercializem lanches infantis com oferta conjunta e não ofereçam a venda em separado de brindes. A decisão de mérito ainda não chegou ao STJ.

Férias

No Resp 1.102.849, julgado em 2008, um consumidor comprou uma viagem para Cancun, no México, com passagem, hotel, passeios e seguro de viagem vendidos de forma conjunta por operadora de turismo, embora a responsável pelo contrato de seguro fosse outra empresa. Por problemas médicos, o consumidor realizou uma série de despesas no exterior e requereu, na hora de pagar a conta, a condenação solidária da operadora que vendeu o pacote de turismo e da seguradora.

A empresa que vendeu o pacote sustentou que se limitou a organização da viagem com reservas, pactuando, paralelamente ao contrato do pacote, o contrato de seguro com outra empresa, a qual devia responder pelas despesas realizadas. Os ministros entenderam que a responsabilidade solidária da empresa de turismo deriva, no caso, da constituição de uma cadeia de fornecimento com a seguradora que realizou contratação casada, sem que se tenha apontado ação individual da voluntariedade do consumidor na determinação das condições firmadas.

Sobre a comercialização de pacote turístico, nele incluído transporte aéreo com voo fretado, o STJ entendeu que a agência de turismo responde pela má prestação do serviço (Resp 783.016). Outra decisão, garante que agência de viagens responda por danos pessoais ocasionados pelo mau serviço prestado em rede hoteleira, quando contratados em pacote turístico (Resp 287.849).

Seguro

Ao analisar um processo sobre arrendamento mercantil em que impuseram ao consumidor a responsabilidade de pagar o seguro de um contrato de leasing, o STJ decidiu que a prática não era abusiva. O seguro, no entanto, poderia ser feito em seguradora de livre escolha do interessado, sob o risco de ferir o direito de escolha do consumidor (Resp 1.060.515).

Nos contratos de leasing, a arrendadora é proprietária do bem até que se dê a efetiva quitação do contrato e o arrendatário faz a opção, ao final do negócio, pela compra do produto. O Tribunal considerou que nos casos de leasing, o consumidor é responsável pela conservação do bem, usufruindo da coisa como se dono fosse, suportando, em razão disso, riscos e encargos inerentes à sua obrigação.

Os ministros entenderam, na ocasião, que não se pode interpretar o Código do Consumidor de modo a tornar qualquer encargo atribuído ao consumidor como abusivo, sem observar que as relações contratuais se estabelecem, igualmente, através de regras de Direito Civil.

"Ante a natureza do contrato de arrendamento mercantil ou leasing, em que pese a empresa arrendante figurar como proprietária do bem, o arrendatário possui o dever de conservar o bem arrendado, para que ao final da avença, exercendo o seu direito, prorrogue o contrato, compre ou devolva o bem",  justificou o desembargador convocado, ministro Honildo Amaral de Mello Castro.

Consumo mínimo

A segunda hipótese prevista pelo artigo 39 inciso I, que regulamenta venda casada no CDC, é aquela que o fornecedor exige que se adquira uma quantidade mínima do produto. Em 2011, o STJ pacificou o entendimento de que nos condomínios em que o total de água consumida é medido por um único hidrômetro, é ilegal a cobrança do valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de unidades residências (Resp 1.166.561).

O recurso foi interposto pela Cedae - Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro, que pedia o reconhecimento da legalidade da cobrança de água multiplicando a tarifa do consumo mínimo pelo número de unidades no condomínio, nos meses em que o consumo registrado tiver sido menor que a cota estabelecida. A companhia alegava que essa modalidade de cobrança é legal e não proporcionava lucros arbitrários à custa do usuário.

Os ministros da 1ª turma consideraram que as leis 6.528/78 e 11.445/07 instituíram a cobrança do serviço por tarifa mínima como forma de garantir a sustentabilidade econômico-financeira dos serviços públicos de saneamento básico. Isso permite aos usuários mais pobres um consumo expressivo de água a preços módicos. A cobrança, no entanto, consistente na multiplicação da tarifa mínima pelo número de residências de um condomínio não tinha amparo legal.

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