Migalhas Quentes

McDonald’s é condenado por oferecer sanduíches no lugar de refeições

Sanduíche, batata-frita e refrigerante não é refeição.

16/8/2012

O TRT da 15ª região entendeu que "não se pode considerar o fornecimento diário de sanduíches, batata frita e refrigerante, como 'refeição', de modo que condenou o McDonald's a indenizar as cestas básicas não fornecidas ao longo do contrato com funcionário.

_________

5ª TURMA – 9ª CÂMARA

PROCESSO TRT/15ª REGIÃO Nº 0000256-78.2010.5.15.0153

RECORRENTE: ARCOS DOURADOS COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA

RECORRIDO: J.V.A.

ORIGEM: RECURSO ORDINÁRIO DA 6ª VARA DO TRABALHO DE RIBEIRÃO PRETO

JUIZ SENTENCIANTE: RODRIGO ADÉLIO ABRHÃO LINARES

EMENTA. CESTAS BÁSICAS. SUBSTITUIÇÃO POR LANCHES EM LOJA DE REDE DE FAST-FOOD. IMPOSSIBILIDADE. Norma coletiva a prever o direito a cesta básica para empregados que não recebam “refeição gratuita” durante a jornada de trabalho. Empresa que se constitui em loja de rede mundial de fast-food. Não se pode considerar o fornecimento diário de sanduíches, batata frita e refrigerante, como “refeição”. Dever de indenizar as cestas básicas não fornecidas ao longo do contrato.

Da r. sentença de fls. 215/222, complementada as fls. 234, em que o MM. Juízo de origem julgou procedentes em parte os pedidos, recorre o reclamado.

Através das razões de fls. 241/271, quer a reforma da sentença quanto às horas extras, intervalo intrajornada, domingos e feriados, intervalo interjornadas, hora noturna e adicional noturno, reflexos em DSR, cesta básica, multa convencional e expedição de ofícios. Prequestiona a matéria.

Regular a representação.

Recolhimentos legais as fls. 238/239.

Contrarrazões apresentadas as fls. 276/290

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público, nos termos dos artigos 110 e 111, do Regimento Interno do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.

É o breve relatório.

VOTO

Conheço do recurso, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade.

DAS HORAS EXTRAS

O recorrente não se conforma com a sentença que o condenou ao pagamento de horas extras excedentes da 6ª diária e da 36ª semanal. Alega que a autora foi contratada para trabalhar 8 horas diárias e 44 horas semanais, para escala móvel e variável, com prévio acordo entre as partes em relação ao horário de trabalho. Sustenta a possibilidade de pagamento de salário proporcional à jornada trabalhada.

O reclamado juntou às fls. 97/104 parte dos cartões de ponto que correspondem ao período contratual de agosto de 2008 a março de 2009. Assim, uma vez demonstrado que o reclamado mantinha registros de horário, a ele competia trazer a Juízo a totalidade da referida documentação, prova pré-constituída a que estava obrigado.

Tal situação leva a presunção de veracidade das alegações da autora no que tange à carga horária, invertendo-se o ônus da prova, nos termos da Súmula nº. 338 da Jurisprudência Uniforme do C. Tribunal Superior do Trabalho.

Os registros de ponto revelam a prática, pela reclamante, de jornada variável, das 8 às 17h; das 9 às 17h; das 10 às 18h; das 12 às 21h; das 15 às 22h e das 16 as 00:30h, configurando o labor em turnos ininterruptos de revezamento, previsto no artigo 7º, inciso XIV, da Constituição Federal, que assim preceitua: “XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva.”.

Nesse regime de trabalho, o empregado não tem jornada única e trabalha em jornadas variáveis, que se alternam periodicamente, não havendo necessidade de que a empresa funcione por vinte e quatro horas ao dia, inclusive em domingos e feriados, ou que existam três ou quatro turnos de labor.

A norma constitucional determina uma jornada máxima de seis horas quando os turnos de trabalho em jornadas de revezamento não são interrompidos, e sim contínuos. Nesse sentido o entendimento contido na Súmula 360 do TST, que dispõe: “A interrupção do trabalho destinada a repouso e alimentação, dentro de cada turno, ou o intervalo para repouso semanal, não descaracteriza o turno de revezamento com jornada de 6 (seis) horas previsto no art. 7º, inciso XIV, da C/F88”.

A jornada de trabalho inferior ao limite legal previsto no inciso XIII do artigo 7º da Constituição Federal, quando do trabalho em turnos de revezamento, decorre dos vários prejuízos causados ao empregado a partir do labor nesses turnos, sendo eles de natureza biológica, psicológica e social. No regime laboral em questão, ocorre a alteração das funções do corpo pela alternância de horários e turnos, principalmente pela irregularidade do sono. A jornada em turnos de revezamento priva o empregado de conviver normalmente com seus familiares, além de impossibilitar a sua participação em outra atividade ou mesmo a regular freqüência em cursos, por exemplo.

Ademais, o excesso de jornada foi confirmado pelas testemunhas ouvidas em Juízo.

A testemunha Anne Krissa Cardoso Medcalf, afirmou que não registravam corretamente o horário trabalhado e quando a jornada era das 9 às 17h, “extrapolavam a jornada saindo às 18 horas”. Declarou, também que a reclamante por vezes saia 24:00/01:00 hora. (fls.30).

Por outro lado, o depoimento da testemunha Kedma Renata, ouvida a convite do reclamado, além de não se recordar o período em que trabalhou com a autora, afirmou que a reclamante trabalhava no período diurno das 8 às 17h, o contraria os registros de ponto (fls.30/31).

Consoante se verifica, a prova testemunhal produzida confirma a prestação habitual de horas extras pela reclamante.

Por conseguinte, diante do conjunto probatório, nada há a reformar na sentença quanto às horas extras e a jornada fixada, reflexos, inclusive em DSR’s.

Quanto ao intervalo intrajornada, embora reconhecido o direito à jornada legal de 06 horars, constada jornadas superiores a esta, em razão da prestação de horas extras, faz jus a reclamante a intervalos intrajornada de uma hora, nos termos do art. 71, caput da CLT. Cite-se, a propósito, a OJ SDI-I 380 do, C. TST:

OJ-SDI1-380 INTERVALO INTRAJORNADA. JORNADA CONTRATUAL DE SEIS HORAS DIÁRIAS. PRORROGAÇÃO HABITUAL. APLICAÇÃO DO ART. 71, “CAPUT” E § 4º, DA CLT (DEJT divulgado em 19, 20 e 22.04.2010). Ultrapassada habitualmente a jornada de seis horas de trabalho, é devido o gozo do intervalo intrajornada mínimo de uma hora, obrigando o empregador a re-munerar o período para descanso e alimentação não usufruído como extra, a-crescido do respectivo adicional, na forma prevista no art. 71, ?caput? e § 4, da CLT.

Conforme declarado pela testemunha Anne Krissia, usufruíam apenas de quinze ou vinte minutos para refeição.

Assim, mantém-se a sentença.

DOS DOMINGOS E FERIADOS

A recorrente sustenta que o labor em domingos era devidamente compensado com dupla folga semanal e que os feriados foram pagos com adicional de 100% conforme consta nos demonstrativos de pagamento.

Nos termos do artigo 1º da Lei nº 605/49, é assegurado a todo o empregado o direito ao repouso semanal remunerado de vinte e quatro horas. Assim, no caso de labor nesses dias, sem a correspondente folga compensatória, é devido o pagamento em dobro, consoante determina o disposto no artigo 9º da citada lei.

Na hipótese dos autos, verifica-se que a autora, por diversas ocasiões, trabalhou em domingos e feriados, sem a correspondente folga até o sétimo dia consecutivo de labor. A título de exemplo, cito o período de 01 a 11 de agosto de 2008, em que a autora trabalhou por onze dias corridos sem o correspondente repouso semanal (fls. 97). Tampouco houve, em razão dos domingos laborados, o correspondente pagamento do adicional de 100% sobre as horas trabalhadas (fl. 112).

Assim, comprovado o labor em domingos e feriados sem a devida folga compensatória ou o correspondente pagamento, é devido o pagamento em dobro.

Nesse sentido, é a Súmula nº 146 do TST:

"TRABALHO EM DOMINGOS E FERIADOS, NÃO COMPENSADO. O trabalho prestado em domingos e feriados, não compensado, deve ser pago em dobro, sem prejuízo da remuneração relativa ao repouso semanal".

E a Orientação Jurisprudencial nº 410 da SDI -1 do TST estabelece:

"REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. CONCESSÃO APÓS O SÉTIMO DIA CONSECUTIVO DE TRABALHO. ART. 7º, XV, DA CF. VIOLAÇÃO. Viola o art. 7º, XV, da CF a concessão de repouso semanal remunerado após o sétimo dia consecutivo de trabalho, importando no seu pagamento em dobro".

Nega-se provimento.

DO INTERVALO INTERJORNADAS

Busca o reclamado a reforma da sentença em relação aos intervalos interjornadas não haver prova de que tais intervalos tenham sido violados.

Como bem analisado pelo Julgador de origem, tendo em vista a jornada arbitrada, o horário mínimo de 11 horas entre duas jornadas (art. 66 da CLT) e de 11 horas após o repouso semanal de 24 horas (art. 67 da CLT) não foi respeitado. Em relação aos domingos que o reclamante laborou não havia folga compensatória, o que resultava a ausência de intervalo de 35 horas. Assim sendo, nego provimento ao recurso.

DA HORA NOTURNA E ADICIONAL NOTURNO

O reclamado afirma que sempre que a reclamante trabalhou no período compreendido entre as 22:00 e 05:00 horas anotou corretamente os horários nos registros de ponto, sendo que não houve qualquer apontamento de diferenças que pudessem ensejar o pagamento.

O § 1º do art. 73 da CLT determina que “A hora do trabalho noturno será computada como de 52 (cinquenta e dois) minutos e 30 (trinta) segundos”.

De outra parte, o adicional noturno deve repercutir nas horas extras trabalhadas em período noturno. Nesse sentido, o entendimento contido na Súmula nº 264, do TST, bem como na OJ nº 97, da SDI-I, também do TST. Diante disso, correta a condenação ao pagamento de adicional noturno sobre as horas extras deferidas em decorrência da inobservância da hora reduzida noturna, bem como as diferenças de horas extras e de adicional noturno, inclusive os reflexos nas férias, acrescidas de 1/3, 13º salários, aviso-prévio e reflexos de todas estas parcelas no FGTS com acréscimo de 40%.

Mantém-se.

DA CESTA BÁSICA

O reclamado investe contra a sentença que o condenou a indenização a título de cestas básicas. Afirma que fornecia lanches confeccionados por ele próprio (trata-se de loja da rede McDonalds).

A cláusula 9ª da CCT (fls. 143/152) estabelece o direito a cesta básica no valor de R$ 55,00 aos empregados que não recebam refeição gratuita durante a jornada de trabalho. Assim, o que a norma coletiva permite é a substituição da cesta básica pelo fornecimento de “refeição gratuita”. Neste conceito, não se pode considerar o fornecimento diário de sanduíches, batata frita e refrigerante, conforme admitido pela reclamante em depoimento pessoal, como “refeição”, notadamente, levando-se em conta que a reclamada, loja de uma das maiores redes de fast-food do mundo (McDonald's) franqueava o consumo desses seus próprios produtos à reclamante.

Portanto, mantenho a condenação.

DA MULTA CONVENCIONAL

Busca o reclamado a exclusão da multa por descumprimento das normas coletivas. Sustenta não ter descumprido qualquer das cláusulas das CCT’s, nem mesmo quanto ao forneciemento de cesta básica.

As convenções preveem como se vê na cláusula quadragésima terceira (fls. 151), a multa de 5% do piso salarial em caso de descumprimento de quaisquer das cláusulas da convenção em favor da parte prejudicada.

O critério é objetivo e tendo sido verificado o descumprimento da convenção quanto à cláusula nona, que determina o fornecimento de uma cesta básica, é devida pelo reclamado o pagamento da referida multa.

Nega-se provimento.

DOS OFÍCIOS

O reclamado alega não ter cometido qualquer irregularidade a ensejar a expedição de ofício, sustentando que eventuais irregularidades devem ser apuradas pelo órgãos competentes.

A determinação de expedição de ofícios tem o intuito de dar conhecimento às autoridades de eventuais irregularidades constatadas em processo judicial. Assim, mantém-se a determinação de expedição de ofício contida na r. decisão recorrida.

A jurisprudência do TST e também nesse sentido, veja-se recente decisão:

“EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS. A jurisprudência desta Corte superior é firme no sentido de reconhecer competência à Justiça do Trabalho para determinar a expedição de ofícios a órgãos fiscalizadores quando se deparar o Juízo com irregularidades em face da legislação trabalhista. Ileso os artigos 7º, XIII e XXVI, e 8º, III e VI, da Constituição da República. Resulta inviável, daí, o conhecimento do recurso de revista pelo permissivo do § 6º do artigo 896 consolidado, com arrimo nas alegadas violações constitucionais. Agravo de instrumento a que se nega provimento.”

Processo: AIRR - 228840-74.2007.5.02.0013 Data de Julgamento: 07/03/2012, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/03/2012.

Nega-se provimento.

DO PREQUESTIONAMENTO

A fundamentação supra, ao apreciar as razões do recurso, adotou tese explícita ou implícita acerca dos dispositivos invocados pelo reclamado, não cabendo ao Julgador manifestar-se acerca de todos os argumentos expendidos pelas partes, mas sim explicitar o fundamento da decisão proferida em relação às matérias ventiladas.

O prequestionamento não se confunde com interpretação de dispositivos literais de lei. A jurisprudência que deu origem à Súmula nº 297 do TST teve por finalidade que a Instância “a quo” emitisse juízo sobre a matéria submetida a julgamento, sob pena de inviabilizar a revisão. Lembra-se que o julgamento sempre se faz sobre o caso concreto, não cabendo a interpretação genérica de dispositivo legal.

DIANTE DO EXPOSTO, DECIDO: CONHECER DO RECURSO DE ARCOS DOURADOS COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo íntegra a sentença, nos termos da fundamentação supra.

FLÁVIO LANDI

JUIZ RELATOR

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