A juíza de Direito Sandra Cristina Candeira de Lira, da 2ª vara Cível de Taguatinga/DF, negou indenização por danos morais contra a Rede Globo em ação ajuizada por uma mulher, de prenome Yara, que afirmou ter sido ofendida em quadro do programa humorístico Zorra Total.
A mulher alegou que no programa Zorra Total, no dia 2/4/11, no quadro intitulado "...Dorinha acha que está sendo traída por Darcênio...", o nome Yara foi usado e relacionado com uma pessoa de reputação e conduta duvidosas. Segundo a autora, haveria a necessidade de fixação de indenização compensatória não só para ela, mas para todas as Yaras ofendidas.
A juíza esclareceu que a Globo não teve o objetivo de macular o nome da autora, nem tampouco atingir sua honra ou imagem. Quanto às outras Yaras que porventura tenham se sentido ofendidas, a juíza explicou que caberia ao MP o encargo de pleitear danos morais em caráter plural. "Há que se guardar a realidade de que se o desapego aos bons costumes está impregnando a sociedade, não é a atuação da autora que irá minorar os lastimáveis e reflexos efeitos que o despudor está a causar", afirmou.
A mulher foi condenada a pagar custas e honorários advocatícios, fixados pela magistrada em R$ 400.
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Processo : 2011.07.1.011509-0
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Processo no 2011.07.1.011509-0
AUTORA: Y.B.P.
RÉ: REDE GLOBO DE TELEVISÃO
SENTENÇA
Y.B.P. ajuizou ação sob o rito sumário contra REDE GLOBO DE TELEVISÃO deduzindo pedido de reparação por danos morais. Enfatiza que no programa ZORRA TOTAL, transmitido em rede nacional e também pela Globo Internacional no dia 02.04.11, no quadro intitulado "...Dorinha acha que está sendo traída por Darcênio...", o nome YARA foi usado e relacionado com uma pessoa de reputação e conduta duvidosas. Ao seu sentir, "....as mulheres que guardam o prenome Yara ficaram com suas honras maculadas..." (fls. 06), vendo o nome relacionado à traição e a adjetivos pejorativos como "...VAGARANHA.."; ..."ÉGUA DE CASCO e CELA...". Aponta o ato ilícito assim perpetrado e a necessidade de fixar-se uma indenização compensatória. Por fim, tece pedido cautelar incidental de exibição de documentos, consistente na cópia da gravação do programa referido.
A inicial veio instruída com os documentos de fls. 13/14.
Determinada a emenda da inicial, a autora juntou documentos de fls. 19/38.
Decisão interlocutória de fls. 40, em que se deferiu o pedido de exibição de documento.
Designada Audiência de Conciliação, e regularmente citada e intimada a ré (fls. 49,v), consta em termo que o acordo não foi possível. A requerida ofertou contestação escrita.
Em suas razões, aduz a ausência de ato ilícito praticado contra a autora, pois em momento algum do programa humorístico referido, houve menção direta à pessoa da autora, como a própria reconheceu em sua petição inicial. Acresce que o programa ZORRA TOTAL tem cunho exclusivamente humorístico e de sátira, que busca transformar os fatos do cotidiano em piadas, sem objetivo de humilhar ou constranger quem quer que seja. Junta jurisprudência em favor de sua tese e postula pela improcedência do pedido. Juntou cópia do programa exibido (fls. 75).
É o relatório. DECIDO.
Não há questões processuais pendentes. Então, estando presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, estando as partes bem representadas, adentra-se no mérito da causa.
Dúvidas não sobejam de que o encargo probatório está em prevalência imputado à autora. Sua é a incumbência de demonstrar o dano injusto suportado por ato ilícito praticado pela ré contra si, ante o teor do artigo 333, inciso I do CPC. Ademais, o dano moral é uma lesão personalíssima e inerente aos atributos da personalidade, na forma tutelada pela Carta Magna - artigo 5º, inciso X.
Nessa conjuntura, toca à requerente alinhavar todos os pressupostos da responsabilidade civil aquiliana, demonstrando a conduta culposa da ré, o resultado lesivo e o liame de causalidade a uni-los, posto que alega lhe ter sido injustamente imposto dano à sua integridade física e honra subjetiva e objetiva (artigo 944 do CC/02).
De fato, ainda que se considere a existência de relação de consumo no caso, o certo é que o CDC não exime o consumidor de provar o dano e o nexo causal unidos pela conduta culposa da prestadora de serviços, uma vez que é somente a conduta culposa dessa que se faz presumida - artigo 14 da Lei 8078/90.
Ocorre que o enfoque que conferiu a autora ao contexto não justifica a indenização vindicada, na medida em que ausente o requisito do dano a integralizar os pressupostos da responsabilidade na hipótese.
Com efeito, certa a empresa ré quando aponta que o quadro de humor do programa, não está diretamente relacionado à pessoa da autora ou foi levado ao ar com o objetivo de perjúrio de seu nome. Sendo assim, não pode a autora postular por indenização por danos morais quando não houve intenção da emissora de atingir a sua honra, bom nome ou imagem.
Nesse quadrante, se postula a autora reparação de danos em nome de todas as pessoas que detém o mesmo prenome Yara, carecedora é do direito de ação, na medida em que não ostentou poderes outorgados para tanto como determina o artigo 3º do CPC. Ademais, se o contexto do programa ultrapassa o bom senso ou os bons costumes, assolando o dano às pessoas em seu caráter plural, seria também encargo do Ministério Público como fiscal da lei, o de agir para obstar um dano assim imposto. Não consta tenha assim ocorrido.
A questão, portanto, não tem ênfase em bem personalíssimo, restando que não pode a autora vindicar direito que não tem. Há que se guardar a realidade de que se o desapego aos bons costumes está impregnando a sociedade, não é a atuação da autora no quadrante aqui posto que irá minorar os lastimáveis e reflexos efeitos que o despudor está a causar.
Somente o retrocesso aos usos e costumes de outrora, os quais eram bem praticados por nossos bisavôs, quando se prezava por um humor ingênuo, de bom tom, sem desvalia da pessoa em quaisquer de seus âmbitos, pode resgatar ou tentar resgatar a boa prática também pelas emissoras de TV.
Vertente outra, num País como o nosso, constituído em Estado Democrático de Direito, havendo liberdade de imprensa, não há como se convencer sobre o dano ao patrimônio moral veiculado indistintamente e com menção à pessoa indistinta, porque a liberdade da televisão também confere ao telespectador a liberdade de escolha, de seleção de programas que tenham afinidade com seus próprios interesses e valores. Cuidar na preservação da boa qualidade do que se assiste não pode ser repassado a ninguém, sendo encargo e prática unicamente a nós afeta.
Desta feita, ainda que tenha a autora admitido a opção pelo programa humorístico ZORRA TOTAL, há que guardar dentro da conjuntura social atual, certa reserva de equilíbrio para ver e ouvir o que não lhe convém à visão e aos ouvidos, porque esse, lamentavelmente ou não, é o estilo da televisão brasileira atual. O alto ibope se volta ao que é mais violento, mais banal, menos promissor e menos educativo.
Redimensionar os padrões sociais para o bom, o construtivo e moralmente melhor aceito não está entre as atribuições dessa modesta Julgadora pela via de opção da requerente, posta na presente ação. Essa não se mostra adequada a reparar um dano social, se é que ele efetivamente existe, conquanto certo que pode ser igualmente opção social brasileira o caminhar nessa linha, em processo abalizado pela educação, pela televisão e/ou pelas famílias.
/Pauta Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DA AUTORA, o fazendo com fulcro no artigo 269, inciso I do CPC. Assim resolvo a demanda em seu mérito.
Atenta a sucumbência, arcará a autora com as custas e honorários advocatícios que fixo, com modicidade, em R$ 400,00, com base no artigo 20, § 4º do CPC.
Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se.
P.R.I.
Taguatinga, 23 de julho de 2012.
SANDRA CRISTINA CANDEIRA DE LIRA
Juíza de Direito