Dia da caça, dia do caçador
Ecad é condenado por cobrar direitos autorais em casamento
O juiz Paulo Roberto Jangutta, do 7º JECiv do RJ, condenou o Ecad a restituir R$ 1.875 pagos por uma noiva, a título de arrecadação de direitos autorais, para poder executar músicas na sua festa de casamento. A noiva ainda receberá R$ 5 mil de indenização por danos morais.
Para o magistrado, casamentos são, por definição, festas íntimas e familiares nas quais inexiste intenção de lucro. Assim, não há justificativa para a cobrança dos direitos autorais das músicas veiculadas.
"É razoável, portanto, que, para a ocorrência do crédito relativo ao direito autoral, o evento gere algum tipo de benefício àquele que o promove. (...) Festas de casamento podem ser realizadas com fim religioso, como celebração de um ritual civil ou como mera comemoração de uma realização pessoal, porém, não lhes é inerente qualquer aspecto empresarial, ainda que se trate de um evento de alta produção", ressaltou o juiz na decisão.
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Processo : 0402189-92.2011.8.19.0001
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Descrição: Processo nº.: 0402189-92.2011.8.19.0001 Autora: K.B.V. Ré: ECAD PROJETO DE SENTENÇASentença
Dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei 9.099/95, passo a decidir.
A autora alega, em síntese, ter sofrido danos de ordem material e moral em virtude de cobrança indevida efetuada pela ré, a título de arrecadação de direitos autorais para a execução pública musical na ocasião de seu casamento.
Requer a restituição dos valores pagos indevidamente, no total de R$1.875,00, e indenização por danos morais.
A ré sustenta a regularidade da cobrança e a inexistência de danos indenizáveis.
Divergem as partes quanto à possibilidade de cobrança de valor a título de direitos autorais por execução de obras musicais em festa de casamento.
Sustenta a parte ré que, por uma interpretação conjugada dos arts. 5º V, 28, 29 e 68 da lei 9.610/98, o evento realizado pela parte autora estaria sujeito à cobrança em questão e, portanto, não haveria direito da autora a qualquer restituição da quantia paga.
Não é esse, entretanto, o entendimento jurisprudencial sobre o tema.
Ainda que a lei 9.610/98 tenha deixado de mencionar expressamente a necessidade da obtenção de lucro para a incidência de cobrança a título de direitos autorais - como o fazia a lei 5.988/73 - entende-se, atualmente, pela manutenção do requisito, conforme os seguintes julgados:
CIVIL. DIREITOS AUTORAIS. FESTAS POPULARES. PROMOÇÃO PELA MUNICIPALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INTUITO DE LUCRO. IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA. PRECEDENTES. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. CPC, ART. 557. RECURSO DESPROVIDO. I - Na linha do entendimento que se formou, não se pode cobrar direitos autorais pela retransmissão de músicas em festas populares promovidas pelas municipalidades, uma vez inocorrente a finalidade lucrativa. II - Em face da orientação predominante no âmbito das duas Turmas que compõem a Seção de Direito Privado deste Tribunal, plenamente justificável o julgamento de plano do recurso especial, nos termos do art. 557, CPC. (AgRg no REsp 209.979/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 10/08/1999, DJ 13/09/1999, p. 70)
CIVIL. DIREITO AUTORAL. FESTAS SOCIAIS SEM INTUITO DE LUCRO. A EXECUÇÃO DE MUSICAS GRAVADAS, EM DISCOS E FITAS, EM FESTAS COMUNITARIAS DE MORADORES DE CONJUNTOS HABITACIONAIS, SEM OBJETIVO DE LUCRO, DIRETO OU INDIRETO, NÃO ESTA SUJEITA AO PAGAMENTO DE DIREITOS AUTORAIS E NEM DE LICENÇA DO ORGÃO ENCARREGADO DE SUA ARRECADAÇÃO. (REsp 26.543/PR, Rel. Ministro DIAS TRINDADE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/10/1992, DJ 23/11/1992, p. 21886)
Dessa forma, nota-se que a cobrança de direitos autorais é feita com o fim de retransmitir aos autores os valores auferidos com a divulgação de sua obra, evitando-se o enriquecimento indevido daquele que a utiliza e obtém algum tipo de lucro, seja de forma direta ou indireta.
Assim, não há que se falar em pagamento de valores a este título por aquele que em nada se beneficiou com a propagação da obra.
É razoável, portanto, que, para a ocorrência do crédito relativo ao direito autoral, o evento gere algum tipo de benefício àquele que o promove.
O casamento é, por definição, uma festa íntima, na qual inexiste intenção lucrativa, seja de forma direta ou indireta. Festas de casamento podem ser realizadas com fim religioso, como celebração de um ritual civil ou como mera comemoração de uma realização pessoal, porém, não lhes é inerente qualquer aspecto empresarial, ainda que se trate de um evento de alta produção.
Inegável, ainda, que a esse tipo de festa é ínsita a restrição à participação, permitindo-se apenas o comparecimento dos convidados dos noivos, razão pela qual não se pode acatar a tese defensiva de que se trata de evento de freqüência coletiva pelo simples fato de realizar-se em clubes ou congêneres.
Ademais, a própria lei 9.610/98 prevê, em seu art. 46 VI, ressalva quanto aos eventos familiares sem intuito de lucro.
Percebe-se, portanto, que a evolução legislativa manteve a ratio leggis de exigência de finalidade vantajosa ao promotor do evento para que se justifique a cobrança por direitos autorais.
Não há dúvidas de que o casamento deva ser considerado uma extensão do âmbito familiar e, portanto, enquadrado na mencionada isenção legislativa.
Nesse sentido decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, em questão análoga:
DIREITOS AUTORAIS. Festa de casamento realizada em salão alugado no clube local, com música operada por DJ. Aplicação do art 46, VI, da Lei 9610/98. Hipótese de isenção. Recesso familiar, independentemente da grandiosidade da festa ou do local do evento. Restrição a participação. Ausência de finalidade lucrativa, ainda que indireta. Sentença mantida. (APELAÇÃO N° 542.012.4/2, 4ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP, Comarca de SOROCABA, Rel. Enio Zuliani, 14/05/2009)
O mencionado acórdão fundamentou-se, com acerto, na doutrina de SILVIO DE SALVO VENOSA, para quem a lei atual manteve os princípios adotados na lei anterior, não existindo ofensa a direitos autorais sobre execução musical realizada no recesso familiar e sem intuito de lucro: 'Na área da execução musical, muitos são os julgados determinando a incidência da lei, desde que exista audição pública como complemento de atividade mercantil ou empresarial, o intuito de lucro direto ou indireto tem sido o critério orientador. Assim sendo, não é devido direito autoral decorrente de execução de músicas gravadas em festas sociais sem finalidade de lucro. (Superior Tribunal da Justiça, RE n° 26543-9/PR, Rei. Min. Dias Trindade)'. (DIREITO CIVIL: Direitos reais, volume 5, 7. ed., São Paulo: Atlas, 2007, p. 576)
Assim, por tratar-se de fato impeditivo do direito da autora, nos termos do art. 333 II do CPC, caberia à parte ré apresentar provas de que o casamento em questão extrapolou o âmbito familiar, constituindo-se em verdadeiro evento no qual a exploração da música teria fins diversos do mero entretenimento dos convidados da autora.
Não há como presumir-se que a festa em questão não foi celebrada de forma usual e que houve exploração lucrativa da música veiculada, ainda que de forma indireta, que justifique a cobrança dos respectivos direitos autorais.
Dessa forma, à autora devem ser restituídos os valores pagos, conforme comprovados às fls. 09. Os danos morais restaram configurados, tendo em vista o abuso de direito praticado pela parte ré.
A indenização deve compensar a autora em sua integralidade, sem, no entanto, gerar seu enriquecimento sem causa.
Haja vista ainda o caráter pedagógico-punitivo da condenação e os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, fixo a indenização no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais).
Isso posto, JULGO PROCEDENTES os pedidos, nos termos do artigo 269 I do Código de Processo Civil, para:
1. Condenar a ré a pagar à autora a quantia de R$1.875,00, a título de indenização por danos materiais, com correção monetária a partir do desembolso e juros de 1% ao mês a partir da data da citação, nos termos da Súmula 97, do Egrégio TJRJ e dos artigos 406 do Código Civil c/c artigo 161 do Código Tributário Nacional;
2. Condenar a ré a pagar à autora a quantia de R$5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização por danos morais, com correção monetária a partir da data designada para a leitura da sentença e juros de 1% ao mês a partir da data da citação, nos termos da Súmula 97, do Egrégio TJRJ e dos artigos 406 do Código Civil c/c artigo 161 do Código Tributário Nacional. Sem custas e honorários de sucumbência, nos termos do artigo 55 da Lei 9.099/95.
Fica a ré ciente, desde já, de que o não pagamento do valor da condenação no prazo de quinze dias após o trânsito em julgado da sentença acarretará, nos termos do artigo 475-J do Código de Processo Civil, a incidência de multa de 10% sobre tal valor, independentemente de nova intimação. Sem custas e honorários de sucumbência, nos termos do artigo 55 da Lei 9.099/95.
Certificado o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se. Submeto o presente projeto à homologação pela M.M Juíza de Direito. Rio de Janeiro, 27 de fevereiro de 2012. ANA CLAUDIA LUVIZOTTO BERGO Juíza Leiga
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