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STF assegura permanência de estagiários no MP/SP

O ministro relator Luiz Fux, do STF, concedeu parcialmente a liminar pleiteada pela procuradoria-geral de Justiça de SP no MS impetrado contra decisão do CNMP que impugnou o programa de estágio do Ministério Público do Estado de São Paulo.

10/8/2011


Programa de estágio

STF assegura permanência de estagiários no MP/SP

O ministro relator Luiz Fux, do STF, concedeu parcialmente a liminar pleiteada pela procuradoria-geral de Justiça de SP no MS impetrado contra decisão do CNMP que impugnou o programa de estágio do MP/SP.

A liminar parcial do STF assegurou a permanência dos estagiários que se encontram em exercício, inclusive no período estendido (após a conclusão do bacharelado).

Como a liminar não atendeu integralmente a pretensão da PGJ, foi interposto recurso para apreciação da questão pelo plenário do STF.

Clique aqui e veja a decisão do CNMP.

Clique aqui e veja a inicial do mandado de segurança.

Clique aqui e veja o agravo regimental.

Veja abaixo a íntegra da liminar do ministro Luiz Fux.

__________

DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra ato do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), consubstanciado na decisão proferida no Procedimento de Controle Administrativo nº 64/2010-91, instaurado para fins de verificação da adequação ao programa de estágio a estudantes, à luz do que dispõem a Lei Federal nº 11.788/08 e a Resolução nº CNMP 42/09.

A referida decisão do CNMP, integrada por acórdão que rejeitou embargos declaratórios, determina, verbis:

“Procedência do pedido para determinar ao Ministério Público de São Paulo que, no prazo de 60 (sessenta) dias, firme Convênios com as Instituições de Ensino (propiciando o controle da matrícula e frequência do educando), contratando os estagiários aprovados em seleção interna, apenas através de Termos de Compromisso; contrate seguro contra acidentes para seus estagiários; adote um prazo máximo de duração do contrato de estágio de 02 anos, improrrogáveis, salvo no caso de portadores de deficiência e, dentro do prazo de 01 (um) ano, edite ato normativo de acordo com as disposições da Resolução CNMP nº 42 e adequado aos ditames da Lei nº 11.788/08 e rescinda os contratos de estágio de estudantes que já concluíram o curso de direito, desligando-os dos quadros da Instituição, desconsiderando o período de estágio como tempo de serviço público para fins de direito e para fins de contagem da atividade jurídica.”

Alega o Impetrante, em brevíssima síntese, que a decisão padece de nulidade, em virtude dos seguintes argumentos:

1. a decisão do CNMP seria nula, por rejeitar embargos declaratórios e, com isso, não suprir as omissões apontadas, que seriam suficientes para assegurar desfecho distinto;

2. a referida decisão também padeceria de nulidade em virtude da ausência de notificação dos estagiários interessados, que não tiveram oportunidade de manifestação;

3. a Lei Federal nº 11.788/08 seria inaplicável ao Ministério Público do Estado de São Paulo, à luz consagração constitucional da sua autonomia institucional e administrativa, do princípio federativo, da reserva de iniciativa de lei para o tema e de reserva de lei complementar em esfera estadual;

4. o tema seria disciplinado pela Lei Federal nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e, no Estado de São Paulo, pela Lei Complementar nº 734/93, modificada pela Lei Complementar nº 1.083/08, segundo a qual o estagiário seria órgão auxiliar do Ministério Público;

5. a Lei Federal nº 11.788/08 e a Resolução CNMP nº 42/09 apresentariam indícios de inconstitucionalidade ao exigir a celebração de convênios com Instituições de Ensino, ocasionando violação da isonomia e da acessibilidade geral às funções públicas, ferindo, ainda, a razoabilidade;

6. o CNMP teria operado o controle velado de constitucionalidade de lei estadual cuja validade não foi afastada por nenhum tribunal;

7. a aplicação da Lei Federal nº 11.788/08 seria inadequada, em virtude da distinção entre estágio acadêmico e estágio profissional, a exemplo do que ocorreria com o estágio de advocacia, disciplinado pelo Estatuto da OAB, e com a residência médica;

8. o CNMP, ao imiscuir-se na organização administrativa do MP/SP, teria desbordo de suas competências constitucionais.

É o relatório. Passo a decidir.

Há que se ter em conta que o estágio profissional é atividade de tirocínio, na qual sobreleva a característica de formação do estudante para, após graduado, inciar a sua atividade profissional e inserir-se no mercado de trabalho. O estagiário é familiarizado, ainda durante o curso, com os aspectos práticos da profissão que abraçará quando formado, mas ainda é um estudante.

Quando o estágio se dá no âmbito dos órgãos públicos, é correto admitir que o estagiário, em benefício de sua formação profissional, desempenha tarefas próprias dos órgãos públicos, mas sempre com restrições e necessariamente sob supervisão. Mesmo assim, prepondera sua condição de estudante.

O estágio profissional, por definição, é realizado ainda durante o curso. Não se pode admitir o estágio pós-bacharelado, incompatível, inclusive, com a Lei nº 8.625/93, cujo art. 37, parágrafo único, restringe o estágio ao período do curso de bacharelado. Não é por outra razão, aliás, que diversos órgãos públicos do país vêm instituindo programas de residência jurídica, concebidos como extensão ou pós-graduação dirigida a bacharéis que desejam ampliar seu tirocínio profissional mesmo depois de formados.

Sendo assim, afigura-se razoável, em sede de cognição sumária, a conclusão do CNMP a respeito da aplicabilidade da Lei Federal nº 11.788/08 ao estágio desempenhado no âmbito do Ministério Público por estudantes de Direito. A previsão de normas para a disciplina do estágio enquadra-se, em princípio, na atribuição de competência legislativa à União para dispor sobre diretrizes e bases da educação nacional, prevista no art. 22, XXIV, da Constituição Federal.

Ainda que assim não fosse, ou seja, mesmo que, ad argumentandum tantum, se tratasse de uma relação de trabalho, decerto não seria a relação de cunho estatutário, à semelhança da relação jurídica que o Ministério Público trava com seus membros e integrantes do respectivo quadro de apoio. Não parece haver distinção substancial entre o regime jurídico dos estagiários de Direito em tirocínio público ou privado, o que remeteria a disciplina a normas de Direito do Trabalho, também sob a competência legislativa da União (art. 22, I, da Constituição Federal).

É bem de ver que a disciplina do regime jurídico de estágio de estudantes não diz com a organização administrativa do Ministério Público, na medida em que não dispõe sobre as tarefas específicas assinadas aos estagiários, os órgãos em que exercerão suas atividades ou como se dará a sua supervisão. Portanto, a Lei Federal nº 11.788/08 não fere, em princípio, o art. 61, § 1º, II, “c”, ou o art. 128, § 5º, da Constituição da República.

A circunstância de haver disciplina do tema na Lei nº 8.625/93 não constituiria óbice à aplicação da Lei nº 11.788/08. Não se trataria de inconstitucionalidade, mas de derrogação da lei, considerando-se que, como já afirmado, não se vê relação de especialidade que justifique, por exemplo, que o período de estágio do estudante de Direito no Ministério Público seja superior ao exercido num escritório particular de advocacia. Por conseguinte, revogadas as normas gerais nacionais, terá ocorrido a suspensão da eficácia da legislação complementar paulista, como determina o art. 24, § 4º, da Constituição Federal.

Por outro lado, é certo que o estágio em órgãos públicos submete-se, como quaisquer outras formas de ingresso para o exercício de funções públicas, às regras e princípios constitucionais atinentes à Administração Pública, insculpidos no art. 37 e seus incisos. Mesmo em tirocínio e sob supervisão, o estagiário de Direito regularmente admitido no Ministério Público desempenhará determinadas funções públicas e, por isso, seu ingresso deve pautar-se por critérios de isonomia e impessoalidade.

Correta, portanto, a observação do Impetrante de que a exigência, contida na Resolução CNMP nº 42/09, de que o Ministério Público admita estagiários exclusivamente mediante a celebração de convênios com Instituições de Ensino Superior. Com efeito, trata-se de previsão sobremodo restritiva, que excluiria estudantes de Instituições de Ensino impedidas, por razões legais alheias à vontade dos mesmos (irregularidade fiscal da Universidade, por exemplo), de estagiar no Ministério Público, o que importaria afronta à igualdade e também uma restrição irrazoável à acessibilidade, violando o art. 37, I, da Carta de 1988.

Note-se, ademais, que a própria Lei nº 11.788/08 não exige a celebração desses convênios, abrindo ao contratante – público ou privado – que adote o processo seletivo (dinâmica de grupo, concurso etc.) mais adequado ao atendimento de suas necessidades. É certa a disciplina legal, pois a remissão a seleção interna da Instituição de Ensino poderia submeter o Ministério Público, por via transversa, a receber estagiários selecionados sem a observância da isonomia e da impessoalidade.

Repute-se importante, contudo, a celebração de Termo de Compromisso com o estagiário, em que figurem como signatários o Ministério Público, o estudante/estagiário e a Instituição de Ensino em que se encontra regularmente matriculado. É uma forma de controle da restrição do estágio ao estudante, de modo a não desvirtuar a admissão para tirocínio e transformá-la em contratação irregular de agente público.

Também não se vislumbra, por ora, inconstitucionalidade na exigência legal de contratação de seguro contra acidentes para os estagiários, disposição do art. 9º, IV, da Lei nº 11.788/09 que considera a proteção do estudante no curso de sua atividade de tirocínio. Há que se cuidar apenas da fixação de prazo razoável para tanto.

Impende, ainda, assinalar que o tempo de estágio não se confunde com tempo de serviço público, hajam vista a disparidade de regimes jurídicos e a inexistência de contribuição ao regime próprio de previdência dos servidores públicos, pelo que o período de estágio não pode ser considerado, no âmbito do Ministério Público, como tempo de serviço público para quaisquer fins de direito e, especificamente para fins de admissão à carreira do Parquet, como tempo de atividade jurídica, a teor do que dispõe o art. 129, § 3º, da Constituição, uma vez que, como já assinalado, não há falar em estágio pós-bacharelado.

O fumus boni iuris, como se observa, se revela apenas em parte das alegações do órgão Impetrante. Diversamente se dá com o periculum in mora, mais evidente no caso em exame.

Pertinente, nos termos da Lei nº 11.788/08, que as novas contratações de estagiários se deem pelo prazo máximo de 2 (dois) anos, como determinou o CNMP. Entretanto, a rescisão imediata dos contratos de estágio já celebrados atinge, num só golpe, a confiança dos estagiários que, de boa-fé e com base na lei, celebraram contratos com o Ministério Público e criaram a expectativa legítima de cumprir estágios mesmo após a graduação, e a regularidade e a continuidade dos serviços do Ministério Público do Estado de São Paulo. Dispensar imediatamente todos os estagiários poderá comprometer sobremaneira o exercício das missões institucionais do Ministério Público, pelo que se apresenta prudente a sua manutenção.

Dessa forma, devem ser mantidos os contratos de estágio vigentes com os estudantes ainda no curso de bacharelado e também os celebrados com estagiários já formados, pelo tempo de sua vigência. Inviável, contudo, a prorrogação de contratos de estágio de bacharelandos por prazo posterior às respectivas graduações, pelas razões já expendidas.

Diante do acima exposto, CONCEDO EM PARTE A MEDIDA LIMINAR, para:

1. dispensar o Ministério Público do Estado de São Paulo da celebração de convênios com Instituições de Ensino para a admissão de estagiários;

2. conceder novo prazo de 60 (sessenta) dias para que o Ministério Público do Estado de São Paulo contrate seguro contra acidentes pessoais para seus estagiários;

3. dispensar o Ministério Público do Estado de São Paulo da rescisão de contratos em curso dos estagiários regularmente admitidos, de modo a que possam os mesmos levar a termo seus períodos de estágio, mesmo que já se trate de estagiários que concluíram o bacharelado, vedada, no entanto, a prorrogação de contratos de estágio para além da graduação e a celebração de novos contratos de estágio por prazo superior a 2 (dois) anos.

Notifique-se a autoridade impetrada para a prestação de informações, na forma do art. 7º, I, da Lei nº 12.016/09.

Dê-se ciência à Advocacia-Geral da União, consoante o disposto no art. 7º, II, do mesmo diploma legal.

Publique-se.

Brasília, 4 de agosto de 2011.

Ministro Luiz Fux

Relator

Documento assinado digitalmente

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