Danos morais
Casal receberá indenização por rompimento de preservativo
A empresa fabricante argumentou dizendo que todos os produtos do mesmo lote foram avaliados, obtendo resultado satisfatório, o que deixava evidente que o produto estava livre de defeito. Porém não conseguiu provar a impossibilidade de ruptura, como também não comprovou que o defeito deu-se por uso incorreto do produto pelo consumidor.
Para os desembargadores ficou claro que houve exposição e constrangimento do casal, principalmente da mulher. "Os apelantes, sem dúvida alguma, viram-se numa situação constrangedora, pela exposição de um fato íntimo, que só aos dois dizia respeito, qual seja a própria relação sexual. O rompimento trouxe o dano moral", disse o desembargador Ricardo Rodrigues Cardozo, relator do caso.
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Processo : 0006002-28.2003.8.19.0211 - clique aqui.
Confira abaixo a íntegra da decisão.
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ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO
15ª CÂMARA CÍVEL
Gabinete do Desembargador
RICARDO RODRIGUES CARDOZO
APELAÇÃO CÍVEL no. 0006002-28.2003.8.19.0211(E.Gab)
Apelantes : C. B. F. S. E OUTRO
Apelado 1 : JOHNSON & JOHNSON INDUSTRIAL LTDA.
Apelado 2 : FARMACIA PARQUE ANCHIETA LTDA.
RELATOR : Des. RICARDO RODRIGUES CARDOZOEmenta
“INDENIZATÓRIA. PRESERVATIVO. ROMPIMENTO. Alegam os Apelantes que adquiriram da 1ª Ré um preservativo masculino, fabricado pela 2ª Ré, que se rompeu durante o ato sexual, deixando resíduo no saco vaginal, o que indicaria vicio na fabricação do produto. A responsabilidade das Rés é objetiva.Relação de consumo. No caso concreto, tenho como bastante verossímil os fatos narrados. Há nos autos provas indicativas do fato. Os Apelantes, sem dúvida alguma, viram-se numa situação constrangedora, pela exposição de um fato íntimo, que só aos dois dizia respeito, qual seja a própria relação sexual. O rompimento trouxe o dano moral o que demonstra o nexo causal. O fabricante não logrou comprovar que seria impossível ocorrer a ruptura e tampouco comprovou que a ruptura deu-se pelo uso incorreto do produto pelo consumidor. Comprovado o fato, o dano e o nexo, reconhece-se a responsabilidade tanto do fabricante, como do vendedor do produto, diante da solidariedade verificada entre aqueles que participam da cadeia de consumo. Apelo provido, nos termos do voto do Relator.”
ACÓRDÃO
VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS estes autos, ACORDAM os Desembargadores que compõem a 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em conhecer o recurso e provê-lo, nos termos do voto do Desembargador Relator.
VOTO DO RELATOR
Ação Indenizatória por dano moral, proposta pelos Apelantes com o objetivo de serem compensados pelos danos que experimentaram em função do rompimento dum preservativo defeituoso fabricado pela primeira Apelada e comercializado pela segunda Recorrida.
O Juízo a quo, através da sentença de fls.254/261, julgou improcedente o pedido porque os Autores não se desincumbiram do ônus de provar o alegado vício do produto, deixando, assim, de estabelecer o nexo causal entre a conduta imputada aos Réus e o evento acoimado de lesivo.
Inconformados, os demandantes apelaram, alegando que restou demonstrado que a primeira Ré fabricou o preservativo utilizado e que a previsão de falha na utilização do dispositivo não pode afastar sua responsabilidade pelo defeito apresentado pelo produto.
Aduziram que a fabricante não demonstrou sua alegação no sentido de que o preservativo havia sido utilizado de forma inadequada.
Pugnaram pela reforma do decisum.
A primeira Apelada apresentou suas contrarrazões às fls274/287.
É o relatório.
A sentença merece reforma.
Inicialmente, deve ser destacado que a questão posta sob julgamento deve ser apreciada a luz do direito consumerista. Alegam os Apelantes que adquiriram da 1ª Ré um preservativo masculino, fabricado pela 2ª Ré, que se rompeu durante o ato sexual, deixando resíduo no saco vaginal, o que demonstraria o vicio na fabricação do produto.
Portanto, a responsabilidade das Rés é objetiva, cabendo aos Apelantes a prova do fato, do dano e do nexo. Provados os três elementos, apenas pela demonstração de um fato exclusivo deles, autores, é que as rés se eximem da responsabilidade.
No caso concreto, tenho como bastante verossímil os fatos narrados.
A prova é obviamente difícil, porque ato ocorrente, em geral, entre quatro paredes e na presença apenas do homem e da mulher envolvidos. Todavia, há nos autos elementos indicativos de que, realmente, os fatos se passaram conforme narrados.
Os Apelantes juntaram à fl. 21 as embalagens do preservativo, indicando marca da 2ª ré e compra na 1ª. Disseram que o uso do preservativo deu-se no dia 11/10/2003 e há nos autos boletim de emergência lavrado por hospital público indicando que no dia 12/10/2003, às 9.45, a 1ª autora foi atendida tendo sido “ retirado fragmento de preservativo do fundo do saco vaginal”.
O preservativo foi enviado à perícia (fl.232), que embora não tenha podido identificar os padrões de qualidade por falta de equipamento, assentou a presença de esperma.
Todos estes fatos são indicativos de que houve um ato sexual, com uso de preservativo masculino, rompido, com fragmentos que restaram no saco vaginal. Este fato, a meu ver, encontra-se comprovado e não foi elidido pela Apelante fabricante.
Provado, pois, o fato, vejamos o dano.
Os Apelantes, sem dúvida alguma, viram-se numa situação constrangedora, pela exposição de um fato íntimo, que só aos dois dizia respeito, qual seja a própria relação sexual. E mais, para a mulher, o constrangimento foi maior, porque teve atendimento num hospital para a retirada de um fragmento da vagina. Basta imaginar a situação para perceber o constrangimento vivenciado.
Com o rompimento, ambos ficaram apreensivos e, sem dúvida, ansiosos, diante da possibilidade de uma nova gravidez, não desejada e não recomendada para a mulher. Tudo gerou dano moral para ambos, embora em maior monta para a mulher, conforme destacado.
O rompimento trouxe o dano moral o que demonstra o nexo causal.
Embora a empresa tente demonstrar a seriedade com que trata as relações de consumo, bem como a segurança dos seus produtos, mais especificamente os preservativos, que são submetidos a vários testes de qualidade e segurança, no que percebe este desembargador ser verdadeiro, nem por isto, se deixa de ouvir e saber sobre rompimentos de preservativos, não se constituindo fato incomum.
Ocorre que, no caso concreto, a fabricante não logrou comprovar que seria impossível ocorrer a ruptura. Sabe-se, porque notório, que isto pode ocorrer. Tampouco comprovou que a ruptura deu-se pelo uso incorreto do produto pelo consumidor. Lembro que em se tratando de relação de consumo, apenas um fato exclusivo da vítima excluiria a responsabilidade.
Assim, entendo comprovado o fato, o dano e o nexo, razão pela qual se impõe reconhecer a responsabilidade tanto do fabricante, como do vendedor do produto, diante da solidariedade verificada entre aqueles que participam da cadeia de consumo.
A pretensão dos Autores deve ser atendida.
Resta fixar o valor da indenização.
Já se falou do constrangimento vivenciado pelos Autores, contudo, pouco maior para a mulher. Este fator deve ser considerado no momento da fixação da verba compensatória.
Considerando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, entendo de fixar para a mulher o valor de R$3.000,00 e para o varão, R$2.000,00, totalizando R$5.000,00.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso para reformar a sentença e julgar procedente o pedido formulado na inicial, e condenar os Réus, ora apelados, solidariamente, a pagar para a 1º Autora o valor de R$3.000,00 (três mil reais) e para o 2º autor, o valor de R$2.000,00 (dois mil reais), com correção monetária da data deste julgamento e juros da citação.
Arcarão os Réus com o pagamento de todas as despesas processuais e honorários que fixo em 15% do valor da condenação, o que faço em atenção ao árduo trabalho desenvolvido pelo patrono autoral. É como voto.
Rio de Janeiro, 26 de julho de 2011.
Desembargador RICARDO RODRIGUES CARDOZO
Relator
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