Migalhas Quentes

O real e a ficção

Polêmica sobre Rui Barbosa e a mini-série Mad Maria

14/3/2005


Rui Barbosa, ainda polêmico


Confira abaixo o esclarecimento da Fundação Casa de Rui Barbosa sobre a polêmica forma que a minissérie da Rede Globo Mad Maria está retratando o grande conselheiro Rui Barbosa.
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O real e a ficção


Rejane de Almeida Magalhães,

Marta de Senna*


"Que a ficção tenha o direito de inventar o que bem lhe aprouver é fato reconhecido por qualquer pessoa sensata. Entretanto, quando uma história é apresentada ao público telespectador com foros de verdade histórica e, ao mesmo tempo, comete distorções calamitosas como a que a série Mad Maria vem fazendo com a figura de Rui Barbosa, é preciso que se reaja, numa tentativa de restabelecer essa verdade.

Na minissérie levada ao ar pela TV GLOBO, cujo roteiro é baseado no romance de Márcio Souza, a história da construção da Estrada de Ferro Madeira - Mamoré é apresentada em dois focos: o chamado núcleo amazônico, em que, segundo a Revista da TV do jornal O Globo deste domingo, só há, “de verdade mesmo”, o médico Lovelace; e o núcleo do Rio, que, segundo ainda a mesma Revista, “traz personagens inspirados em figuras reais”, como Hermes da Fonseca, presidente da República na época em que se desenrola a trama; o empresário americano Percival Farquhar, que teria o sonho de dominar o sistema ferroviário da América do Sul; o empresário Alexander Mackenzie, na vida real, um canadense, diretor da recém-chegada Rio de Janeiro Tramway, Light and Power Co. Ltd; o político baiano J.J. Seabra, que foi ministro de Estado no governo Hermes da Fonseca, resguardado na mini-série sob o nome de Juvenal de Castro; e Rui Barbosa, de quem não apenas se preservou o nome verdadeiro como ao qual se chegou ao requinte de representar no espaço real de sua casa, hoje sede da Fundação Casa de Rui Barbosa, na rua São Clemente, número 134.

Em meio a tanta “realidade”, é natural que o telespectador acredite que são reais a personalidade e o caráter do personagem, apresentado ficcionalmente como um indivíduo vaidoso, inescrupuloso, desonesto e mau. Ora, por dever de ofício, conhecemos a atuação de Rui Barbosa como homem público e como cidadão comum. É nossa função, enquanto pesquisadoras do Setor Ruiano da Fundação Casa de Rui Barbosa e líderes de um grupo de pesquisa cadastrado no CNPq, desenvolver estudos constantes, diuturnos, sobre a vida e a obra desse grande brasileiro. Todas as evidências que há em nossos arquivos e em obras que se escreveram sobre Rui e sobre o período em que atuou no espaço público do País, nos apresentam, antes de tudo, um patriota, para quem o interesse do Brasil esteve sempre acima de qualquer outro. Não temos qualquer indício da mais remota ligação de Rui com o empresário Farquhart. Rui foi, sim, consultor jurídico da Rio de Janeiro Tramway, Light and Power Co. Ltd., a partir de 1905, depois de já ter sido deputado provincial, deputado geral, conselheiro do Império, senador da República, ministro da Fazenda. Entre essa data e o presente da narrativa apresentada na minissérie, viria ainda a ser delegado extraordinário e embaixador plenipotenciário à Conferência da Paz em Haia, e candidato, em oposição justamente a Hermes da Fonseca, à presidência da República, em campanha política memorável, que a história do Brasil consagrou como campanha civilista. Deixou uma obra monumental, na qual está mapeado todo o momento histórico em que viveu e de que foi personagem atuante. Não merecia ser tratado como um pilantra oportunista e perverso. Se ao roteiro da mini-série convinha um personagem com essas características – e esse é um direito inerente à ficção, literária ou midiática – que lhe tivessem dado outro nome, que o construíssem sem denegrir a imagem de um personagem histórico que, se não foi um santo, nem jamais teve a pretensão de sê-lo, foi um brasileiro de quem a posteridade pode e deve orgulhar-se.

Aos ódios e às injúrias estou habituado, Sr. Presidente. A calúnia e o ultraje têm sido a bagagem constante de minha vida pública. Elas poderiam formar hoje uma montanha, se as casas limpas costumassem acumular o seu lixo. Mas a verdade, essa tem direito de ser ouvida e restabelecida.

Sirva este fragmento de um discurso de Rui Barbosa, pronunciado no Senado Federal em 20 de novembro de 1906, como conclusão a estas considerações, nas quais nos sentimos, na medida possível de nosso alcance, compelidas a tentar fazer ouvir a verdade e restabelecê-la."

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* Pesquisadoras da Fundação Casa de Rui Barbosa











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