TJ/MG - Arma que falha não isenta de crime
Conforme denúncia proposta pelo MP de Minas Gerais, por volta das 21h30 do dia 30/8/06, o acusado atacou a esposa e uma prima com intenção de matá-las.
Segundo testemunhas, O.O.S., "nitidamente embriagado" e armado com um revólver, dirigiu-se à sua casa, onde sua mulher, M.O.S., oferecia um jantar a diversos convidados. Chegando lá, ele começou a discutir com a esposa, arrastando-a para um quarto, agredindo-a a coronhadas, colocando a arma na boca da vítima e ameaçando-a de morte.
Um casal conseguiu apartar os dois e permitiu a fuga da mulher, mas o porteiro, irritado com a intervenção, investiu contra G.M.C.S., sua prima, colocou a arma em sua cabeça e apertou o gatilho por três vezes seguidas. Embora produzisse som de disparo, o cartucho da arma não detonou e não houve tiro. O homem ainda intimou G.M.C.S. a buscar M.O.S., mas a PM já havia sido chamada pela filha de ambos e ele foi preso em flagrante.
Para o MP, o assassinato não foi alcançado "por circunstâncias alheias à vontade do acusado", pois, após laudo pericial de eficiência da arma, ficou comprovado que o equipamento não estava danificado e seria capaz de ferir. Em março de 2007, a denúncia foi aceita pelo MP, sob o fundamento de que "o acusado não estava amparado por nenhuma causa que isentasse de pena ou excluísse o crime".
Condenação
Propondo que se tratava de "crime impossível", categoria prevista no CP (clique aqui), já que "o revólver descarregado configura meio absolutamente ineficaz e objeto impróprio" para ferir alguém, e insistindo que se encontrava completamente embriagado, o porteiro pediu para ser sumariamente absolvido de todas as acusações.
O acusado foi levado ao Tribunal do Júri, que o condenou pelos crimes de homicídio tentado e ameaça. A pena, determinada em setembro de 2008 pelo juiz Henrique Alves Pereira, da 2ª vara da comarca de Pedro Leopoldo, foi de dois anos e um mês de reclusão, inicialmente em regime aberto, e dez dias-multa. O.O.S. recorreu da sentença em outubro do mesmo ano.
Na 2ª instância, a turma julgadora da 4ª Câmara Criminal do TJ/MG manteve a decisão. Para o relator do recurso, desembargador Júlio Cezar Guttierrez, por si só o fato de a arma, com munição e eficiente, não disparar não gera a ocorrência de crime impossível, pois "a arma é instrumento apto a atingir a integridade física de outrem". "O que ocorreu é que, por sorte da vítima e do réu, o cartucho percutiu, mas não deflagrou", ponderou. Segundo o magistrado, "a ineficácia do meio empregado é relativa: a arma possuía potencialidade lesiva, embora tenha falhado".
Citando o juiz Eugenio Raúl Zaffaroni e o advogado criminalista José Henrique Pierangeli, o desembargador explicou que o crime impossível se caracterizaria apenas quando o meio utilizado para cometer um crime não pode provocar dano, "tal como querer envenenar com açúcar" alguém que não seja diabético ou "demolir um edifício com alfinetes". Acompanharam o relator os desembargadores Doorgal Andrada e Herbert Carneiro.
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Processo : 1.0210.06.037815-0/002
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