No findar de 2024, importante tecer reflexões sobre o cenário previdenciário nacional, com alguns dados e criticamente projetar o ambiente vindouro, aparentemente desesperançoso.
O sistema previdenciário brasileiro, sabidamente, é um dos mais complexos do mundo, notadamente pela imensidão e profusão heterogênea das camadas e relações sociais, visivelmente diversificadas, aliás de visíveis desigualdades.
Também, associa-se tal fenômeno a um amplo sistema normativo existente, com normas de todos os tipos, lados e sentidos, aliás, que se alteram com frequência e de forma desenfreada.
A regulação de vários direitos é outro ponto de registro.
O catálogo das prestações previdenciárias, conforme art. 18 da lei Federal 8.213/91 e art. 25 do decreto 3.048/99 é destacadamente amplo, sendo para vários doutrinadores uma programação generosa de proteção de seus envolvidos.
Lado outro, a desinformação, a inexistência de uma sólida cultura previdenciária, bem como o caráter nitidamente político e econômico da recente onda reformista agravam sobremodo esse ambiente dentre outros fatores existentes e que aqui demandariam um amplo debate.
Assim, tem sido os últimos anos da pauta previdenciária em solo pátrio, ou seja, de acentuadas ocorrências, polêmicas, discussões e de poucas soluções para os tristes e negativos dilemas existentes.
Por certo principiar a presente reflexão com a conhecida tese da “RVT - Revisão da Vida Toda”, alocada ainda no STF sob o Tema 1.102 e que entre idas e vindas, até o presente momento não chegou em seu aguardado desfecho1. Curiosamente, apesar de validada pelos Tribunais inferiores, dentre eles o STJ2, o Tribunal Maior invocando premissas econômicas, notadamente, desvirtuou o aguardado debate técnico, preterindo o fundante princípio da existência de custeio em todos os casos, além do incontroverso fato que é uma tese de exceção, com vários filtros e também pelo fato que beneficia pequeníssima parcela de aposentados.
Um outro importante aspecto vivido nos últimos tempos e que demanda profundas reflexões envolve a judicialização previdenciária, cada vez mais crescente no país, em larga escala e sem qualquer plano nacional e institucional para sua contenção.
Sem dúvida alguma uma bomba-relógio ativa e pronta a explodir de modo a confirmar a ineficiência do INSS e de toda gestão previdenciária governamental.
Em recente repercussão, restou apurado que é o INSS responsável por mais de 5 milhões de processos judiciais em andamento, um recorde até então, provando a evidente falibilidade do órgão, há muito engessado, ultrapassado e deficitário.
Em matéria, foi registrado que: "O INSS - Instituto Nacional do Seguro Social superou a marca de cinco milhões de processos pendentes. Esse dado faz parte do painel Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça, e corresponde às ações pendentes até 31 de outubro, quando o placar foi atualizado. Esse número diz respeito a todos os processos, de todos os anos".
Associado a esse triste cenário, aliás, bem conhecido por toda sociedade brasileira, está o INSS em posição de destaque negativo com relação a atuação administrativa.
De fato, filas e filas, um volumoso quantitativo de postulações internas represadas e em todos os níveis administrativos, com uma morosidade gigante no setor de análises.
Estima-se um crescimento de mais de 30% somente nos últimos meses, com aproximadamente 1,8 milhão de pedidos realizados e sem análise.3
Portanto, crises e mais crises do sistema.
Inobstante as pequenas e paliativas medidas tomadas para tratar esse crítico setor, é bem verdade que o Judiciário através da tese do dano moral tem tentado compensar, restabelecer e corrigir rotas da atuação previdenciária, com condenações diversas em vários Tribunais do país.
Precedentes como fraude em empréstimos indevidos4; suspensão indevida; ineficiência e extravio de documentos5; dentre outros, são alguns dos vários casos de 2024 e que demonstram não somente a crise institucional previdenciária com evidente amplitude, bem como, de outro lado a relevância dessa emergente tese judicial ao triste momento vivido por todos.
De outro lado, intenta a política de gestão do INSS em alterar substancialmente o benefício de prestação continuada, conhecido como BPC/LOAS6. De fato, vem por aí um pacote de restrições, inovações e de critérios rígidos na concessão e manutenção deste benefício que atende expressiva parcela de marginalizados da sociedade, sem renda alguma, com deficiências diversas e desamparados, cumprindo assim o constitucional papel do bem-estar; da dignidade humana e da justiça social.
Portanto, os desafios e polêmicas novidades não ficam por aqui, serão alvo de intensos debates e discussões na jornada vindoura, muita das vezes com um debate atécnico, apressado e com acentuado viés econômico.
Em suma, foi 2024 outra jornada de visíveis entraves, óbices e barreiras quanto ao exercício pleno das conquistas sociais previdenciárias firmadas na programação de 1988, sonhos esses ainda vivos, contudo e infelizmente, distantes da presente geração.
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1 https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-mantem-decisao-que-definiu-que-segurado-nao-pode-escolher-calculo-mais-benefico-para-aposentadoria/
2 https://www.jusbrasil.com.br/artigos/stj-declara-o-direito-a-revisao-da-vida-toda-por-unanimidade/791752730
3 https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/fila-do-inss-cresce-mais-de-30-em-3-meses-e-passa-de-17-milhao-de-pedidos/
5 https://web.trf3.jus.br/noticias/Noticiar/ExibirNoticia/434695-caixa-e-inss-devem-indenizar-aposentada-por-emprestimos
5 https://www.migalhas.com.br/quentes/408429/trf-3-mantem-indenizacao-a-segurada-por-extravio-de-ctps-pelo-inss
6 https://previdenciarista.com/blog/regras-para-concessao-do-bpc-tornam-se-mais-rigidas-veja-o-que-muda/