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Pablo Marçal, redes sociais e abuso de poder econômico: O que está por trás da decisão?

Outsider nas eleições para a prefeitura de São Paulo, destaca-se pelo grande alcance nas redes sociais e seu charme, superando até Datena. Contudo, enfrenta uma ação judicial que questiona o uso excessivo de poder econômico e midiático. O estudo de 2024 revela que no Brasil, as redes sociais são mais usadas para notícias do que a TV.

26/8/2024

Plano Marçal surgiu como um outsider político nas eleições municipais para a prefeitura de São Paulo. Influenciador digital, ele tem habilidades de um grande comunicador e sabe muito bem como se portar em público, exalando o seu sucesso pessoal, magnetismo, beleza e charme. Realmente, coitados de Nunes e Boulos, que apesar da experiência política estão muito distantes do showman que é o empresário da internet.

Filiado ao PRTB, partido pequeno, Marçal supera o apresentador Datena na TV em alcance de redes sociais.

Suas redes sociais contam com milhões de seguidores e isso pesa muito na balança eleitoral. Ninguém tem o alcance, inserção e profundidade de sua audiência.

O Relatório de Notícias Digitais de 2024 (Digital News Report 2024) investiga a importância das plataformas no consumo e produção de notícias. Examina o impacto das redes sociais mais visuais, baseadas em vídeo, como TikTok, Instagram e YouTube, e ainda analisa as atitudes do público em relação ao uso da inteligência artificial no jornalismo. O estudo também explora o papel dos influenciadores e criadores de notícias e avalia quanto os consumidores estão dispostos a pagar pelas notícias, entre outros pontos importantes. Nesse estudo da Reuters Institute, organização associada à Universidade de Oxford, mostrou que, no Brasil, as redes sociais (57%) já são mais usadas para consumo de notícias do que a própria televisão (51%).

E como fica a situação de Pablo Marçal nisso tudo?

A AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11.527) 0601153-47.2024.6.26.0001 / 001ª ZONA ELEITORAL DE SÃO PAULO SP, proposta pelo PSB da Candidata Tabata Amaral, alega que há abuso de poder econômico e midiático no uso das suas redes sociais.

Marçal tem um império de comunicação e marketing digital, prosperou pela capacidade de usar suas redes com mestria e de persistir no mercado ainda em ascensão e conseguir a projeção que hoje tem.

Mas a questão é: quando esse fenômeno deixa a internet e passa a se tornar candidato, poderia continuar gerindo suas redes sociais da mesma forma? Ou seja, poderia continuar fazendo propaganda e remunerando seguidores e produtores da mesma forma?

As redes sociais são de grande valia nas campanhas eleitorais, porém têm suas restrições.

1. Restrições econômicas: as campanhas têm um limite de gastos, é a forma que o TSE restringe as discrepâncias econômicas entre candidatos. Um termo bem antigo é a plutocracia, ou governo do dinheiro. Assim, cada candidato pode se autofinanciar até o limite do teto e de acordo com o declarado no Imposto de Renda Pessoa Física do ano anterior. Marçal para poder concorrer com os demais, mas deve fazer nas mesmas condições e dentro desse limite, mesmo tendo "sucesso" econômico muito superior.

2. Não é possível o financiamento empresarial: isto significa que os patrocinadores e a própria empresa do influencer não podem continuar financiando seus produtos dentro da rede social do candidato, pelo menos não na época de campanha, o que geraria uma confusão entre a pessoa pública e política e o empresário. De forma que seu potencial econômico e digital não podem ser usados para desequilibrar a balança eleitoral. Observe o trecho da sentença:

"Apontou que o art. 29, § 8°, da Res. 23.610/2019 prevê a necessidade do dever de rotulagem e clareza da propaganda eleitoral na internet, a impossibilidade de propaganda feita ou custeada por pessoa jurídica e a exclusividade de que propaganda paga na internet se dê apenas por meio de partidos, coligações, federações e candidatos, com o uso de recursos disponibilizados a todos pelas próprias plataformas que tenham previamente se cadastrado perante a Justiça Eleitoral".

3. Proibição de patrocínio de perfis: o influenciador remunera aqueles que compartilham shots de suas performances, mas a legislação eleitoral veda o patrocínio de perfis por terceiros, pessoas físicas ou jurídicas, assim quem compartilha o perfil de seu candidato em condições normais não pode ser remunerado por isso. Podemos observar no trecho abaixo da decisão judicial:

“Compartilhando o reels e marcando 3 eleitores vai ser sorteado 200,00

28 M

Acesse o perfil e siga

#Mulheres com Marçal”

Aduziu que, em razão da grande audiência do requerido Pablo nas redes sociais, de forma que o brinde consistente no boné (feito em seu perfil oficial) e também na promessa de dinheiro para quem compartilhasse propaganda teria repercussão suficiente para ser considerada no cenário de composição de abuso de poder e, até mesmo, do art. 41-A da lei das eleições".

4. É lícito o impulsionamento do perfil do candidato e de postagens, mas é vedada a conversão da propaganda. O impulsionamento deve obedecer ao limite do teto da campanha e não pode ser modalidade de propaganda, como foi no caso anterior do sorteio do boné, que já teve determinação para retirada da propaganda.

O que é abuso de poder econômico?

É justamente quando um candidato por ter uma estrutura econômica muito superior aos concorrentes pode desequilibrar a competitividade. Não temos dúvidas que Marçal tem superioridade nesse quesito em relação aos demais e seu impacto está sendo desmedido nas eleições paulistas.

Eu compararia a situação de Marçal a quando gostamos de um sapato, mas ele é dois números menor que nossos pés. Marçal, para participar do pleito, precisa ter reduzido seu alcance econômico e midiático para se tornar do tamanho de seus concorrentes.

Da mesma forma que Silvio Santos ou Luciano Huck, ou o próprio Datena, precisariam se afastar da televisão e se abster de publicidade e outras atividades que desempenhavam para serem candidatos.

Se fizermos uma analogia do poder das mídias e redes de Marçal ao poderio da televisão entenderíamos que Sílvio Santos teria muito mais alcance se continuasse a apresentar seu programa de domingo e concorresse a um cargo público. Mas a legislação veda a prática e todos os comentaristas, apresentadores e artistas de televisão estão desde o dia 1° de julho afastados de seus programas e canais de rádio e televisão. 

O afastamento de Marçal das redes se faz necessário para minimizar o desequilíbrio em relação aos demais candidatos e busca sim obrigá-lo a andar com um sapato menor que seus pés para não ir tão distante dos demais.

Como penso?

Considero devidas as restrições que o juiz eleitoral apontou ao conceder a liminar pleiteada e que não há abuso de direito do magistrado.

Apesar da natureza sui generis do candidato e do poder midiático que possui, considero impossível de reverter a decisão em qualquer instância.

O mais provável é que a maioria dos críticos à decisão consideram que foi ferida a liberdade de expressão de Marçal. Mas o caso, não pode ser tomada por parâmetro o modelo americano de campanha, que não limita gastos, nem controla o tipo de propaganda como no Brasil. Vimos o verdadeiro show que foi o comício dos democratas com as estrelas americanas, música de Beyoncé e a mega estrutura, com três dias de festa televisionadas para todo os Estados Unidos.

Há sim discrepâncias abissais entre os candidatos paulistas e a Justiça Eleitoral tem a função de reequilibrar o pleito. Não estamos nos Estados Unidos onde não há limites financeiros para campanhas, onde ganha quem mais arrecadar fundos, em que não existem limites aos discursos de ódio e intolerância racial, dentre outros graves problemas do American of Life...

Esse caso é um ponto de aprendizado para todos nós: Marçal estava nas redes e fazia suas propagandas antes de ser candidato, porém ao assumir os desafios do pleito precisa andar com os sapatos apertados da legislação eleitoral.

Garanto que Datena (deixou seu programa para ser candidato e não faz publicidade no período de campanha) e Nunes (enquanto prefeito está limitado no uso dos bens públicos, inaugurações e eventos da prefeitura durante os 3 meses que antecedem o pleito além de outras restrições de natureza gerencial) têm seus calos e que Lula também errou e praticou crime eleitoral ao declarar apoio à candidatura de Boulos durante evento público.

Tudo que é novo exige que pensemos em soluções que ainda não conhecemos e fico feliz por isso, porque sei que bom senso e a crítica da faculdade de julgar com seus imperativos categóricos do dever são atributos exclusivos do humano, demasiadamente humano.

Rosa Maria Freitas
Doutora em Direito pelo PPGD/UFPE, professora universitária, Servidora pública, Escritório Rosa Freitas Advocacia em Direito público, palestrante e autora do livro Direito Eleitoral para Vereador.

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