Introdução
Na sexta, 12/7, o juízo, como já havia feito antes1, não concedeu aprovação preliminar para o acordo antitruste na ação coletiva dos atletas contra o UFC.2
O juiz Boulware expressou várias áreas de preocupação, dando a entender que estaria inclinado a negar o acordo e levar o caso a um julgamento com júri.
Os pontos impeditivos para a homologação do acordo
Esses seriam os 4 pontos de controvérsia que o juízo expôs:
- Conflito entre as classes de processos3: A “ação Le” está focada em ganho financeiro. Já a “ação Johnson” busca mudanças/proteções contratuais que dariam mais liberdade aos lutadores, isso porque alguns atletas que fazem parte desta última ainda estão contratualmente ligados ao evento.
- As indenizações monetárias são suficientes? O Juiz Boulware abordou a diferença no montante de dinheiro concedido aos lutadores no acordo e como ele seria distribuído, especialmente em comparação ao que os lutadores poderiam ganhar no julgamento com danos triplos.
- Muitos membros da classe Johnson assinaram renúncias de ações coletivas antitruste que agora são padrão nos contratos do UFC. Houve muita conversa sobre essa questão. Boulware estava preocupado com o fato de que, devido à renúncia, muitos lutadores atuais não receberão um prêmio em dinheiro significativo ou mudanças nos contratos.4
- Boulware discutiu o incentivo do advogado dos reclamantes para fazer o acordo. Ele deixou claro que não estava sugerindo nenhuma irregularidade, mas insinuou que a pressão para chegar a um acordo poderia custar duas vezes aos membros da Johnson, deixando-os sem grandes prêmios em dinheiro ou sem um recurso legal prático para seguir em frente.
O juiz também achou difícil aceitar o fato de que os lutadores atualmente no elenco poderiam ter renunciado à qualquer possibilidade de litígio futuro em troca de US$ 3.000, que é o que muitos que assinaram a renúncia às ações antitruste devem receber com base no acordo.
A posição dos atletas: o fator “Trump”
Eric Cramer, representante dos atletas, trouxe um ponto muito interessante, e controverso, para justificar sua pressa em fazer logo o acordo com o UFC: o relacionamento entre o presidente do UFC, Dana White, e o ex-presidente Donald Trump. White, que já se manifestou em apoio a Trump no passado, deve fazer o último discurso antes de Trump aceitar a indicação do Partido Republicano para a eleição de 2024.
Cramer argumentou que a continuação do litígio provavelmente resultaria na chegada do caso à Suprema Corte dos EUA, que provavelmente estaria pronta para decidir contra os autores da ação sob a liderança de Trump.5
A meu sentir, os impedimentos mais desafiadores para um acordo adequado são o impacto da renúncia de ação coletiva presentes nos contratos de membros da Johnson e o conflito entre o dinheiro a ser recebido e alguma medida inibitória a mudar as restritivas cláusulas contratuais atuais.
O juízo chegou a cogitar colocar a “ação Le” para julgamento. As partes ainda podem fazer um acordo, mas, da forma como o acordo foi redigido, Boulware mostra não se sentir muito à vontade para assinar o acordo.
Considerações finais
Nas ações judiciais coletivas, os autores (nesse caso, os ex-lutadores) normalmente não têm dinheiro para pagar os honorários advocatícios necessários para enfrentar uma grande corporação, portanto, o escritório contratado está trabalhando por uma taxa de contingência. Basicamente, eles não são pagos a menos que ganhem, mas, se ganharem, receberão até 50% (depende das leis estaduais)
Processos judiciais como esse podem durar anos e, enquanto as empresas têm dinheiro para arrastar esses processos, o advogado que representa o reclamante está trabalhando de graça e os reclamantes ficam presos no limbo sem saber quando/se serão compensados pelo dano que o réu (UFC) lhes causou. Isso pode exercer uma enorme pressão sobre os advogados e os autores da ação para que aceitem um acordo, mesmo que o caso seja forte e eles provavelmente tenham chance de receber muito mais se ganhassem a causa.
Nesse caso, quando um juiz está considerando não aprovar um acordo, é provável que ele não considere o acordo razoavelmente justo para os autores da ação (lutadores do UFC). Embora alguns possam argumentar que, em primeiro lugar, cabia aos autores da ação aceitar ou não o acordo, lembremos de que não se trata de um bando de milionários, mas sim de pessoas comuns que lutavam para ganhar a vida e tiveram seus ganhos, por meios ilegais, suprimidos pelo UFC. Eles precisam do dinheiro para viver agora e poderiam facilmente ser pressionados a aceitar um acordo injusto.
O juízo fará nova audiência para deliberar se aceitará ou não o acordo e as partes terão que apresentar algo diferente se quiserem evitar o julgamento.
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1 COSTA, Elthon José Gusmão da. Controvérsia! Juízo nega homologação do acordo no processo antitruste contra o UFC. Lei em Campo, Brasil, 24 jun. 2024. Disponível em: https://leiemcampo.com.br/controversia-juizo-nega-homologacao-do-acordo-no-processo-antitruste-contra-o-ufc/. Acesso em: 13 jul. 2024.
2 MOYER, Phillip. Judge weighs settlement in pair of UFC monopoly lawsuits. Courthouse News, EUA, 12 jul. 2024. Disponível em: https://www.courthousenews.com/judge-weighs-settlement-in-pair-of-ufc-monopoly-lawsuits/. Acesso em: 13 jul. 2024.
3 Cung Le, et al. v. Zuffa, LLC d/b/a Ultimate Fighting Championship and UFC, No. 2:15-cv-01045-RFB-BNW (D. Nev.). e Kajan Johnson, et al. v. Zuffa, LLC, et al., No. 2:21-cv-01189 (D. Nev.).
4 Mais em: COSTA, Elthon José Gusmão da. Comentários sobre o acordo no processo dos atletas x UFC. Lei em Campo, Brasil, 11 jun. 2024. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/409011/comentarios-sobre-o-acordo-no-processo-dos-atletas-x-ufc. Acesso em: 13 jul. 2024.
5 MOYER, Op. Cit.