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NLLC: gestão, transcendência e intranscendência das sanções

Nova Lei de Licitações amplia prazo para defesa a 15 dias úteis, substituindo os 5 dias da antiga lei. No caso de inidoneidade, o prazo recursal segue a regra geral de 15 dias úteis, enquanto para advertência não há previsão expressa.

16/1/2024

A Nova Lei de Licitações e Contratos criou algumas inovações no âmbito da aplicação das sanções aos licitantes contratados pela Administração Pública.

Uma das novidades foi a ampliação do prazo para defesa no processo administrativo sancionatório: 15 dias úteis (arts. 157 e 158) ao invés dos 5 dias da moribunda lei 8.666/93 (art. 87§2º).

O prazo recursal no caso da inidoneidade na lei velha é de 10 úteis e no caso da NLLC segue a regra geral de que os prazos recursais para aplicação de sanções é de 15 dias úteis.

O prazo recursal no caso de advertência da NLLC não tem previsão expressa. Duas são as hermenêuticas possíveis: regra geral do prazo recursal (15 dias) ou prazo previsto no edital da licitação.

Nossa modesta opinião inclina-se pela possibilidade jurídica de fixação de prazo menor caso haja expressa previsão no edital.

A pena de advertência não é uma pena propriamente dita já que é uma sanção substancialmente moral inobstante sua previsão jurídica.

Não há consequência concreta e imediata com a aplicação da pena de advertência que é mera indicação prospectiva da possibilidade de aplicações punitivas substanciais como a multa, a suspensão do direito de licitar e a inidoneidade.

O prazo recursal tem relação direta com o “quantum” da pena a ser aplicada e a pena de advertência tem nome de pena mas substância de mera admoestação.

Ressalte-se que a advertência, por si só, não tem o condão de causar qualquer gravame ao licitante penalizado e, portanto, pode ser aplicada de imediato com a eventual reversão no caso de procedência do recurso administrativo.

Ainda que a “pena” de advertência persista por um tempo antes de sua reversão nenhum efeito concreto acarretará ao licitante, salvo na hipótese de ser mantida e constar no cadastro da entidade para fins de desempate por avaliação de desempenho (art. 60, II da NLLC).

As penas de advertência e multa tem caráter de “intranscendência”, ou seja, são aplicadas no caso concreto e específico não sendo, em regra, cumulativas para os demais contratos distintos.

Assim, prevê o novo códex licitatório:

“Art. 156. Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas previstas nesta Lei as seguintes sanções:

  1. advertência;
  2. multa;
  3. impedimento de licitar e contratar;
  4. declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.

§ 1º Na aplicação das sanções serão considerados:

  1. a natureza e a gravidade da infração cometida;
  2. as peculiaridades do caso concreto;
  3. as circunstâncias agravantes ou atenuantes;
  4. os danos que dela provierem para a Administração Pública;
  5. a implantação ou o aperfeiçoamento de programa de integridade, conforme normas e orientações dos órgãos de controle.” (grifos nossos).

Ou seja, a aplicação das sanções deve ser aplicada casuisticamente notadamente naquelas multas intranscendentes: advertência e multa.

Não se afiguraria proporcional tampouco equânime que advertências e multas tivessem a mesma natureza ”transcendente” que as sanções de impedimento de licitar e inidoneidade.

O caráter intranscendente é da substância das sanções de advertência e multa. Noutras palavras, são aplicadas apenas no caso concreto não sendo, a princípio, motivo para agravamento das penas de outro contrato administrativo, salvo a reiteração culposa/dolosa.

Apenas na hipótese de insuficiência das penas de multa e de advertência é que as penas “transcendentes” serão aplicadas.

Transcendentes são aquelas penas que extravasam o contrato administrativo específico atingindo um conjunto de contratos administrativos.

A pena de impedimento de licitar atinge um ente político por inteiro. A pena de inidoneidade atinge os entes políticos em todos os seus contratos.

As penas de advertência e multa podem ser aplicadas por servidor da secretaria por delegação do secretário.

A pena de suspensão do direito de licitar e a inidoneidade são aplicadas após parecer da Comissão de Suspensão e Inidoneidade prevista no artigo 158 da lei Federal 14.133/21.

A suspensão (precedida de parecer da CSI) pode ser aplicada por servidor indicado pelo Secretario da pasta específica e a inidoneidade (precedido de parecer jurídico e parecer da CSI) somente pode ser aplicada pelo Secretário/Ministro da Pasta respectiva.

No termo de referência deve constar o modelo de gestão e, também, o responsável pela fiscalização e gestão do contrato. Havendo delegação para aplicação de penas deverá haver registro no termo de referência.

Assim, prevê o artigo 6º, XIII da Lei de Licitações:

Art. 6º (...)

XXIII - termo de referência: documento necessário para a contratação de bens e serviços, que deve conter os seguintes parâmetros e elementos descritivos:

(...)

f) modelo de gestão do contrato, que descreve como a execução do objeto será acompanhada e fiscalizada pelo órgão ou entidade;”

Apesar de não haver previsão escancarada do fiscal e do gestor do contrato no artigo 6º, a interpretação sistemática com outras regras do Códex licitatório leva-nos a concluir pela necessidade de sua inclusão no termo de referência.

Note-se que o fiscal do contrato deverá ser alguém da área específica, indicado pelo Secretário (ou cargo equivalente) no termo de referência devendo observar o princípio da segregação de funções. A recomendação é indicar o cargo do servidor de maneira a deixar claro quem será o substituto legal em sua ausência. A ausência de indicação do gestor implica na responsabilidade do respectivo secretário/ministro da pasta.

Em acanhadas urbes, é comum que pessoas desprovidas de boa-fé queiram imputar ao chefe das licitações, pregoeiro ou procurador a tarefa de “fiscalizar” o contrato administrativo. A segregação de funções impede tal escolha “mui cômoda”, porém, ilícita. Da mesma forma o órgão de assessoramento jurídico (normalmente a Procuradoria) também não pode exercer a fiscalização e/ou gestão pelos mesmos motivos de segregação de funções.

Em poucas palavras: secretaria meio (Secretaria de Administração e Procuradoria) não pode exercer função fim. 

Trata-se de verdadeira heresia hermenêutica, além de “ergofobia1.

Em síntese: na nova lei de licitações a gestão do contrato é feita pelo secretário/ministro da pasta respectiva com possibilidade de delegação até a pena de impedimento de licitar sendo de sua competência exclusiva e indelegável a pena de inidoneidade. Em regra as penas intranscendentes (advertência e multa) são específicas de cada contrato e as penas transcendentes (impedimento de licitar e inidoneidade) são aplicadas na insuficiência das penas intranscendentes.

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1 Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/393095/nllc--ergofobia-e-fiscalizacao-dos-contratos-nllc

Laércio José Loureiro dos Santos
Laércio José Loureiro dos Santos, é mestre em Direito pela PUCSP, Procurador Municipal e autor do Livro, "Inovações da Nova Lei de Licitações", 2ª Ed. Dialética, 2.023.

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