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Constitucionalidade da cobrança de IOF sobre os contratos de mútuo

O acórdão comentado possui caráter vinculante, sendo aconselhável que os contribuintes ofereçam à tributação os rendimentos recebidos em decorrência de contratos de mútuo, ou reestruturem suas operações.

14/10/2023

Em 6/10/23, o Plenário do e. STF concluiu o julgamento do recurso extraordinário 590.186 (“RE 590.186”) que, em sede de repercussão geral, fixou a seguinte tese para o tema 104: “É constitucional a incidência do IOF sobre operações de crédito correspondentes a mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física, não se restringindo às operações realizadas por instituições financeiras”.

Prevaleceu, à unanimidade, o voto do relator, ministro Cristiano Zanin, que entendeu pela constitucionalidade do artigo 13 da lei 9.779/991, cuja redação determina a incidência do IOF sobre os contratos de mútuo firmados entre particulares, sujeitando-se às mesmas regras aplicáveis às instituições financeiras.

Os contribuintes sustentam que o dispositivo questionado extrapola os limites estabelecidos pela Constituição Federal (“CF”), que atribuiu ao IOF natureza eminentemente extrafiscal, o qual teria sido instituído com o objetivo de conceder à União instrumento de fiscalização, de intervenção sobre o mercado financeiro e de política monetária. Por tal razão, os contribuintes alegam que somente seriam tributáveis as operações de crédito realizadas no âmbito do mercado financeiro, sob pena de desvirtuar a finalidade do tributo.

O ministro Cristiano Zanin, no entanto, esclareceu que o IOF também possui função arrecadatória, em que pese sua relevante função extrafiscal.

Assentou, ainda, que a CF2 não restringe a incidência do imposto aos contratos de mútuo realizados por instituições financeiras, bastando a qualificação do negócio como operação de crédito, independente dos sujeitos envolvidos. Foram utilizados os mesmos fundamentos adotados pela Corte quando do julgamento da ADIn 1.7633, que tratou da incidência do IOF sobre as operações de factoring.

Vale destacar que em seu voto, o Relator ressalvou os contratos de conta corrente, celebrados entre empresas do mesmo grupo, por possuírem natureza distinta dos contratos de mútuo e então deixou de analisá-los por não serem objeto do RE 590.186.

Conta corrente é modalidade contratual atípica, ajustada entre partes ligadas, as quais adotam um caixa único, com fluxo financeiro contínuo, alternando constantemente as posições de credor e devedor. Após findo determinado período, as partes apuram o saldo das obrigações, não sendo possível determinar, no momento em que acertado o negócio jurídico, quem ocupa a posição de credor ou devedor.

O acórdão comentado possui caráter vinculante, sendo aconselhável que os contribuintes ofereçam à tributação os rendimentos recebidos em decorrência de contratos de mútuo, ou reestruturem suas operações.

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1 BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 9.779/1999: “Art. 13. As operações de crédito correspondentes a mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física sujeitam-se à incidência do IOF segundo as mesmas normas aplicáveis às operações de financiamento e empréstimos praticadas pelas instituições financeiras”.

2 BRASIL. Congresso Nacional. Constituição Federal: “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: (…) V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários”.

3 (...) 2. O fato de as empresas de factoring não necessitarem ser instituições financeiras não é razão suficiente para inquinar de inconstitucional a norma questionada. E isso porque nada há na Constituição Federal, ou no próprio Código Tributário Nacional, que restrinja a incidência do IOF sobre as operações de crédito realizadas por instituições financeiras. 3. A noção de operação de crédito descreve um tipo. Portanto, quando se fala que as operações de crédito devem envolver vários elementos (tempo, confiança, interesse e risco), a exclusão de um deles pode não descaracterizar por inteiro a qualidade creditícia de tais operações quando a presença dos demais elementos for suficiente para que se reconheça a elas essa qualidade” (ADI 1763, Relator Min. Dias Toffoli. Tribunal Pleno. Julgado em 16/6/2020) (destaques acrescidos ao original).

Sylvio Fernando Paes de Barros Júnior
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da USP. Especialista em Direito Empresarial pela PUC/SP. Sócio do escritório Araújo e Policastro Advogados.

Fernanda Botinha Nascimento
Pós-graduada em Direito do Estado e da Regulação Possui MBA em Gestão Tributária. Especialização em Planejamento Tributário. Associada do escritório Araújo e Policastro Advogados.

Maria Carolina Torres
Advogada do escritório Araújo e Policastro Advogados.

Giovanna Molinaro Ferrão
Advogada do escritório Araújo e Policastro Advogados.

Laísa Fonseca Salomão
Estagiária na Araújo e Policastro Advogados.

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