O veto presidencial de Jair Bolsonaro ao art. 21 da lei 14.457/22 abre brechas para a aplicação fraudulenta da lei que implementou o Programa “Emprega + Mulheres”.
Fruto da conversão da Medida Provisória 1.116, de 04 de Maio de 2022, a lei 14.457 institui o Programa “Emprega + Mulheres” e altera algumas previsões da Consolidação das leis do trabalho.
A referida lei destina-se à inserção e manutenção das mulheres no mercado de trabalho, por meio do estímulo à aprendizagem profissional e de medidas de apoio aos cuidados dos filhos pequenos, a chamada parentalidade na primeira infância.
Dentre as medidas previstas, destacam-se: a regulamentação do reembolso-creche, a flexibilização do regime de jornada de trabalho, a antecipação das férias, a possibilidade de suspensão do contrato, a possibilidade de compartilhamento da prorrogação da licença maternidade entre a mãe e o pai e adoção de medidas obrigatórias pelas CIPAs visando à conscientização dos empregados.
Embora a lei represente, de um modo geral, um avanço na construção de uma sociedade mais igualitária e acolhedora para a mulher e para a mãe trabalhadora, deve-se ter um olhar atento para evitar que seja utilizada para interesses opostos às aparentes intenções que levaram à sua elaboração.
Isto porque o texto legal aprovado pelo Congresso Nacional não foi integralmente sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro: houve veto ao art. 21, e com isso foram abertas brechas que facilitam fraudes na aplicação da lei.
O art. 21 (vetado), foi adicionado pelo Legislativo durante a tramitação da conversão da medida provisória em lei, e restringia a possibilidade da implementação das medidas de flexibilização por acordo individual, permitindo seu uso em apenas duas hipóteses:
1. Em casos de empresas ou de categorias de trabalhadores para as quais não haja acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho celebrados, ou;
2. Caso o acordo individual contenha medidas mais vantajosas às normas coletivas.
Notadamente, o veto presidencial reforça as investidas dos últimos anos para enfraquecimento das entidades sindicais, e permite uma extensa gama de flexibilizações através de acordos individuais, inclusive com relação a medidas que até o momento apenas poderiam ser implementadas por norma coletiva, a exemplo da suspensão do contrato de trabalho e do regime de compensação por banco de horas que exceda 06 meses.
Considerando a natural hipossuficiência da trabalhadora na relação de emprego, a permissão de utilização de acordos individuais para flexibilização de normas que possam causar prejuízos (inclusive financeiros) à empregada é preocupante, pois facilita eventuais fraudes durante a implementação das medidas previstas na lei 14.457/22.
Neste ponto, o papel dos sindicatos será fundamental na fiscalização da aplicação da nova lei, para evitar que seja utilizada como mais uma ferramenta de precarização nas relações de emprego, sob o manto de suposta legalidade.
Importante destacar que o veto presidencial ainda será apreciado pelo Congresso Nacional, que poderá inclusive derrubá-lo se houver maioria absoluta de votos. Nesta hipótese (derrubada do veto) a previsão do art. 21 passa a valer, o que se mostrará razoável e necessário para preservar o propósito protetivo e inclusivo que deu origem à lei.
De qualquer modo, se bem utilizada, a lei 14.457/22 poderá servir para estimular a empregabilidade, integração e qualificação das mulheres no mercado de trabalho, fomentar espaços de conscientização acerca da responsabilidade parental aos pais, além de proporcionar maior apoio às trabalhadoras que possuam filho na primeira infância.
É imprescindível a existência de leis que preceituem ações e diretrizes afirmativas na busca pela igualdade de oportunidades às mulheres, mas a efetividade estará sempre posta em xeque se não houver mecanismos para blindar a sua utilização fraudulenta, além de serem necessários empenhos constantes voltados à conscientização sobre a origem social do problema.