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Bis in idem de obrigações contra os titulares de patentes

Importante ressaltar que a restrição ao acesso a medicamentos relacionados ao combate de pandemias, em especial do covid-19, não é causado pelo sistema de patentes, muito pelo contrário.

23/11/2022

A lei 14.200/21, referente ao PL 12/21, que trouxe, em geral, alterações na lei 9.279/96, com relação à licença compulsória de patentes e pedidos de patentes nos casos de declaração de emergência nacional ou internacional ou de interesse público, ou de reconhecimento de estado de calamidade pública de âmbito nacional, obteve o veto parcial do chefe do Poder Executivo, justificando, entre outras razões, que tais dispositivos legislativos contraria o interesse público, vão de encontro ao sistema patentário nacional e que é o Poder Executivo Federal o ente competente para exercer os atos executivos, inclusive para expedir de ofício o referido ato durante o período de emergência. Ainda, a proposição legislativa trata de tema já disciplinado no art. 5º do decreto 3.201/99, que estabelece as condições para o ato de concessão da licença compulsória, o que torna essas proposições inócuas. Isso significa, que os vetos foram corretamente acertados, pois caso contrário, teríamos um verdadeiro bis in idem de obrigações contra os titulares de direitos de propriedade intelectual.

Contudo, está em tramitação no Senado Federal o PL 2505/22, que visa alterar a lei 9.279/96, para tratar das obrigações do titular da patente ou do pedido de patente nos casos de licença compulsória para exploração de patentes de invenção ou de modelos de utilidade em situações emergenciais ou de interesse público, que desde setembro do corrente ano, o projeto aguarda despacho de comissões para análise. Em linhas gerais, esse PL possui uma disposição de argumentação bastante parecida do PL 12/2021. Ou seja, tais previsões, tem como objetivo “combater o controle excessivo sobre tecnologias de saúde patenteadas, exercido por empresas farmacêuticas durante situações críticas de saúde global, que resultam em escassez, atrasos e preços fora do alcance para os sistemas públicos de saúde”. Entretanto, essa tentativa de reescrever tais disposições, que já foram vetadas e justificadas na MENSAGEM Nº 432/2021, do Poder Executivo, já se encontram em vigor na legislação pertinente, inclusive na nossa constituição.

“A sociedade deve estar consciente e alerta, que proposições como essas, geram insegurança jurídica, pois tentam distorcer os propósitos do sistema de patentes e enfraquecê-lo, promovendo o desincentivo à inovação e à capacitação tecnológica no Brasil, dificultando, assim, o acesso da população a novos medicamentos”.

Importante ressaltar que a restrição ao acesso a medicamentos relacionados a combate à pandemias, em especial o COVID19, não é causado pelo sistema de patentes, muito pelo contrário, a patente estimula a inovação que gera o desenvolvimento de várias vacinas, como ocorreu durante a pandemia, em tempo recorde. Além disso, o sistema de patente propicia a capacitação técnica de laboratórios nacionais para produção de vacinas, como foi o caso do acordo realizado entre a Fiocruz e a biofarmacêutica AstraZeneca para produzir, no Brasil, a vacina contra o COVID19 desenvolvida pela Universidade de Oxford. Ainda, a própria Fiocruz dentro dos acordos assinados, garantiu a transferência de tecnologia para permitir a produção totalmente nacional incluindo a fabricação do IFA nas instalações de Bio-Manguinhos/Fiocruz.

Assim, as verdadeiras causas que dificultam o acesso a medicamentos não são e nunca foram às patentes, como já mencionado, mas outros fatores estruturais, como aspectos tributários e de orçamento, questões logísticas nacionais e internacionais de abastecimento, instalações fabris, entre outros, que precisam ser considerados e, também, aperfeiçoados com urgência para garantir acesso não somente à vacinas, mas outros medicamentos para tratamento de diversas doenças, que, também, são responsáveis por salvar milhares de vidas.

A sociedade deve estar consciente e alerta, que proposições como essas, geram insegurança jurídica, pois tentam distorcer os propósitos do sistema de patentes e enfraquecê-lo, promovendo o desincentivo à inovação e à capacitação tecnológica no Brasil, dificultando, assim, o acesso da população a novos medicamentos.

Gabriel Di Blasi
Engenheiro industrial, agente de propriedade industrial, advogado e sócio-sênior do Escritório Di Blasi, Parente & Associados.

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