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Comercialização de imóveis na planta

A partir do momento em que se pretende adquirir um imóvel na planta, o comprador deve saber exatamente quais são as condições e o que será entregue antes de firmar o negócio.

7/11/2022

No cotidiano das médias e grandes cidades brasileiras, podemos verificar, pela leitura de placas publicitárias, uma série de novos lançamentos imobiliários, com condições de pagamento imperdíveis e ofertas que, num primeiro momento, parecem excelentes.

Para o comprador, as condições de pagamento e a imagem do imóvel pronto são suficientes para a tomada de decisão pela compra, o que muitas vezes o faz desprezando a atividade e providências adotadas pelo incorporador para que o empreendimento possa efetivamente ganhar vida.

Antes do empreendimento começar a ser construído, o incorporador se obriga à adoção de inúmeras providências, dentre as quais, a própria incorporação, incluindo o seu registro em cartório, o que em momento algum poderá ser desconsiderado, uma vez que comercializar um imóvel na planta, demanda a comprovação de que o projeto sairá efetivamente do papel, atribuindo confiabilidade à empresa e segurança aos adquirentes, o que por outro lado, e concomitantemente, contribuirá para a criação da boa imagem da incorporadora no mercado.

Seguindo esta linha de raciocínio,  existem diversos cuidados que devem ser adotados no momento da comercialização e aquisição de um imóvel – especialmente na planta.

Isso porque, como regra, os compradores utilizam-se de recursos de financiamento imobiliário para pagar o preço do imóvel. Ao optar por tal modalidade de pagamento, o comprador precisa ter a certeza de que não haverá arrependimentos posteriores à assinatura dos contratos com o banco e com a incorporadora, evitando-se dissabores para ambos os lados.

Além disso, existem outras situações que podem causar frustrações ao comprador e ao incorporador, sendo que para o primeiro, exemplificativamente, pode ser considerada a demora no avanço da construção e consequente atraso na entrega do imóvel, além de falhas estruturais e vícios construtivos, imóvel entregue com características diferentes das prometidas no contrato e nas ofertas, entre outras e para o segundo, problemas com o solo, com altos índices pluviométricos, com a escassez de material e de mão de obra, o que não raramente enseja os atrasos na entrega e os famosos pedidos de rescisão de contrato.

Percebe-se que muitas vezes por desconhecimento do incorporador ou por mero lapso, o empreendimento imobiliário deixa de ser registrado junto ao cartório de registro, ou seja, o denominado registro de incorporação imobiliária sequer ocorre para assegurar a construção do empreendimento e a sua entrega. Além disso, em muitos casos, pode ocorrer a venda de unidades em duplicidade, o que torna essencial, por exemplo, o registro de compromissos de compra e venda à margem da matrícula do imóvel, nos termos do art. 463 do Código Civil, que assim preconiza:

Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive.

Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente.

Assim, pretende-se com o presente artigo, expor, em sentido jurídico, quais são os cuidados que devem ser adotados pelas partes antes da comercialização de imóvel na planta, com o fim de evitar arrependimentos posteriores e garantir a segurança da aquisição.

O primeiro cuidado: verificar a oferta

A partir do momento em que se pretende adquirir um imóvel na planta, o comprador deve saber exatamente quais são as condições e o que será entregue antes de firmar o negócio, a fim de que obtenha todas as informações de forma clara e precisa sobre o objeto da aquisição e que obrigará o fornecedor, o que pode ser corroborado pelo Código de Defesa do Consumidor:

Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

Pelo teor dos artigos, entende-se que a incorporadora deve prezar pela clareza e especificidade de suas informações quanto à unidade que pretende comercializar, pois, a oferta obriga o seu cumprimento, o que evita dissabores tanto ao consumidor, quanto ao próprio incorporador.

Neste sentido, justamente pela responsabilidade que decorre da veiculação, o comprador deve guardar e se orientar pelos folhetins de propaganda, sites, e-mails, banners de propaganda, entre outros, e a incorporadora deverá atentar-se a publicidade que realiza, eis que a vincula e integra o contrato por força do CDC. 

O segundo cuidado: verificar o registro do empreendimento

O registro é o procedimento para atestar a veracidade e dar publicidade às informações de um imóvel. No caso, destacar expressamente que está sendo utilizado para uma incorporação imobiliária, expor as condições do empreendimento e a situação do imóvel.

Aqui cabe ressaltar o dever do comprador de guardar as publicidades do imóvel, bem como do incorporador de registrar, uma vez que, segundo a Lei das Incorporações, 4.591/64, devem constar o número e o cartório do registro da incorporação em cada publicidade.

A lei preconiza que o empreendimento deve ser registrado antes de o incorporador efetuar as vendas dos apartamentos, sob pena de ser responsabilizado criminalmente. E é certo que: na hipótese de ausência de registro, a venda não pode ser válida, o que enseja ao comprador o direito de rescindir o negócio e requerer a devolução dos valores.

Nas palavras de Mattos e Silva, deve o comprador:

“Assim, para aquele que pretende adquirir um imóvel de uma incorporadora é necessário a verificação do registro da incorporação no cartório imobiliário. O comprador deve ir ao cartório e pedir para ver todos os documentos relativos à incorporação (peça para ver o “memorial de incorporação”). Nesse momento, pode ser interessante a ajuda não apenas de um advogado especializado na matéria, mas também de um engenheiro civil, para que o comprador possa entender quais serão os detalhes técnicos das obras a serem realizadas, de modo a aferir a qualidade do que deverá ser construído.”

Além de verificar o registro e o memorial de incorporação, de igual importância a verificação do projeto devidamente aprovado pela prefeitura, o que deve ser prioridade para o incorporador.

O terceiro cuidado: A incorporadora

A incorporação imobiliária, por envolver engenharia, questões jurídicas, tributárias, ambientais, fora os trâmites com a Administração Pública e cartórios em geral, consiste em uma atividade complexa. Logo, exige uma estrutura capaz de comportar todas essas etapas, para o fim de possibilitar o devido andamento às obras.

Assim, além de se verificar a oferta e a situação do imóvel, certo que poderá ser analisada a empresa com a qual se pretende contratar. Dessa forma, a incorporadora deverá atentar-se ao fato de que primar pelo seu bom nome será um grande atrativo e que impactará de forma positiva para o negócio, o que atualmente, com as ferramentas tecnológicas disponíveis, pode chancelar facilmente a aquisição pelo potencial comprador. Diante disso, se torna possível verificar a situação econômica da empresa, seu histórico no mercado, quantidade de empreendimentos já entregues, avaliações de clientes, entre outros.

A análise pode ser mais prática, mediante uma simples consulta pública aos sistemas processuais dos Estados em que a incorporadora atua, bem como em sistemas de avaliação on-line, como o Reclame Aqui, o que torna importante a atuação da incorporadora sempre pautada nas melhores práticas de mercado e em atenção aos regramentos legais.

A análise pode, por outro lado ser mais complexa, a partir da leitura de certidões específicas da empresa, bem como de seus sócios. Algumas incorporadoras podem responder a ações civis públicas e até mesmo ações criminais por violações à lei. Nesse sentido, não restam dúvidas de que quanto maior for a transparência e seriedade da incorporadora nas suas operações, maior será a credibilidade e menor o risco de que os seus empreendimentos venham a ser afetados em decorrência de pedidos de distratos.

O quarto cuidado: a análise do contrato

Os contratos elaborados por incorporadoras (promessas e compromissos de compra e venda), em regra, devem se amoldar ao art. 35-A da lei 4.591, no que se incluem a elaboração dos quadros-resumos (resumo das cláusulas que compõem a totalidade do contrato) os quais contemplam os seguintes itens:

I - o preço total a ser pago pelo imóvel;

II - o valor da parcela do preço a ser tratada como entrada, a sua forma de pagamento, com destaque para o valor pago à vista, e os seus percentuais sobre o valor total do contrato;

III - o valor referente à corretagem, suas condições de pagamento e a identificação precisa de seu beneficiário;

IV - a forma de pagamento do preço, com indicação clara dos valores e vencimentos das parcelas;

V - os índices de correção monetária aplicáveis ao contrato e, quando houver pluralidade de índices, o período de aplicação de cada um;

VI - as consequências do desfazimento do contrato, seja por meio de distrato, seja por meio de resolução contratual motivada por inadimplemento de obrigação do adquirente ou do incorporador, com destaque negritado para as penalidades aplicáveis e para os prazos para devolução de valores ao adquirente;

VII - as taxas de juros eventualmente aplicadas, se mensais ou anuais, se nominais ou efetivas, o seu período de incidência e o sistema de amortização;

VIII - as informações acerca da possibilidade do exercício, por parte do adquirente do imóvel, do direito de arrependimento previsto no art. 49 da lei 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor) , em todos os contratos firmados em estandes de vendas e fora da sede do incorporador ou do estabelecimento comercial;

IX - o prazo para quitação das obrigações pelo adquirente após a obtenção do auto de conclusão da obra pelo incorporador;

X - as informações acerca dos ônus que recaiam sobre o imóvel, em especial quando o vinculem como garantia real do financiamento destinado à construção do investimento;

XI - o número do registro do memorial de incorporação, a matrícula do imóvel e a identificação do cartório de registro de imóveis competente;

XII - o termo final para obtenção do auto de conclusão da obra (habite-se) e os efeitos contratuais da intempestividade prevista no art. 43-A desta lei.

Caso haja a ausência de alguma dessas informações no quadro resumo, importante que a incorporadora seja notificada para aditar o contrato no prazo máximo de até 30 (trinta) dias, sob pena de que o contrato seja rescindido com a necessidade de devolução dos valores pagos devidamente atualizados, segundo o índice do contrato. Daí a importância de que os itens constem expressamente e que tanto consumidor quanto incorporador estejam bem assessorados na elaboração e celebração destes instrumentos contratuais.

Verificado o quadro resumo, a próxima etapa e não menos importante da análise, segundo as palavras de Mattos e Silva consiste:

“(...) na leitura atenta de cada cláusula, parágrafo, item, alínea etc. do instrumento contratual que regerá o negócio, de modo que possa o comprador conhecer todos os detalhes da transação. Embora pareça óbvia tal assertiva, a maioria dos prejuízos sofridos pelos compradores decorre da ausência da devida leitura e da consulta a profissional especializado no momento da contratação. Em geral, esses contratos são extremamente complexos, razão pela qual ele deve ser estudado com grande profundidade e vagar.”

Sob a perspectiva do consumidor, a leitura consiste em verificar se não existem cláusulas injustas e que retiram direitos dos compradores, o que, no futuro, podem acarretar em prejuízos e arrependimentos posteriores à compra.

E não menos importante, sob a ótica do incorporador, sempre indispensável a maior cautela possível na inserção de cláusulas, eis que a depender do seu teor, podem vir a ser questionadas, prejudicando a manutenção do contrato.

Dentre as cláusulas mais importantes, destaca-se a do modo do pagamento, incidência de índices de correção e juros nas parcelas, taxas relativas a financiamentos e cartórios, responsabilidade por atrasos na entrega, prazo da entrega do imóvel, consequências por descumprimento contratual, e a devida metragem de área total ou área útil do imóvel.

Lembrando que o contrato deve ser analisado segundo a oferta exposta na publicidade, pois os termos vinculam a incorporadora.

Por fim, adotados os devidos cuidados relativamente à documentação e aos procedimentos da incorporação, tanto pelo consumidor, quanto pela incorporadora, a aquisição de um imóvel na planta pode ser uma excelente oportunidade de investimento ou de moradia.

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Compra de imóveis: aspectos jurídicos, cautelas devidas e análise de riscos / Bruno de Mattos e Silva. – 13. ed. – São Paulo: Atlas, 2021. ISBN 978-85-97-02619-1.

Debora Cristina de Castro da Rocha
Advogada fundadora do escritório Debora de Castro da Rocha Advocacia, especializado nas áreas do Direito Imobiliário e Urbanístico, Mestre em Direito Empresarial e Cidadania e Professora.

Leonardo Scholl
Advogado e controller do escritório Debora de Castro da Rocha Advocacia. Atua nas diversas demandas do direito imobiliário.

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