Os tempos de campanha eleitoral denotam o aquecimento das atividades estatais, sobretudo no âmbito da segurança pública, com o crescimento das operações policiais contra candidatos à cargos eletivos, que tem sua candidatura frustrada pela veiculação televisa de investigações policias em seu desfavor, ou até mesmo prisões preventivas e temporárias.
Sabe-se, contudo, que uma campanha eleitoral demanda gastos consideráveis, os quais não se restringem às despesas rotineiras e pessoais do candidato e de seus assessores, mas, também, na aquisição e contratação de produtos e serviços necessários até mesmo para que a mensagem lançada pelo candidato chegue ao eleitor.
Nesta linha, para que se faça uma boa administração dos recursos disponíveis para a campanha, são necessários dispêndios em diversos setores, tais como marketing, propaganda, papelaria, mídia e até mesmo jurídico.
Desta forma, o período pós-eleições também tende a ser de agitação nos corredores da justiça, com o julgamento das contas de candidatos – eleitos ou não – que tem por obrigação justificar os valores desembolsados, provenientes do fundo eleitoral ou de doações.
Neste contexto, a necessidade de prestação de contas à justiça eleitoral dos gastos realizados em campanha, bem como as sobras de valores não utilizados, apresenta-se como importante meio para que descortine a possível prática de atos de corrupção e, em tese, até mesmo de lavagem de dinheiro.
A vista disto, os tribunais brasileiros tem adotado entendimento de que é possível a prática do crime de corrupção – Art.317 do Código Penal – utilizando-se o agente corruptor das doações eleitorais ao candidato, através da transferência de valores travestidos de doação eleitoral e que, em realidade, foram prometidos para viciar a prática de atos a serem praticados futuramente pelo agente público.
Neste caso, a doação eleitoral é um ato lícito em sua formalidade, mas viciado em sua vontade, visto que motivado pela corruptela de candidato que, sob promessa de vantagem futura, recebe a doação como forma de patrocínio de campanha. Um quid pro quo com o uso de instrumentos tipicamente democráticos.
Noutro cenário, incorreria em prática de lavagem de capitais o candidato que recebe valores travestidos de doação objetivando o uso posterior do cargo público para obter vantagens ao donatário, situação em que, por certa perspectiva, os valores recebidos já viriam limpos, não oriundos de qualquer prática criminosa, visto que acobertados pela roupagem do expediente donativo.
Contudo, tal contexto desafiaria a lógica consumativa dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, visto que o momento de consumação de ambos os crimes ocorreria de forma concomitante, considerando-se que a transferência de bens e valores para o custeio de campanha eleitoral sob a promessa de benesses futuras caracteriza a corrupção e, portanto, não haveria crime antecedente para que se tipifique a lavagem.
Sob outra perspectiva, possibilitar-se-ia a lavagem de valores que, por quaisquer motivos, não foram integralmente utilizados na campanha eleitoral e, ao invés de retornarem ao partido ou ao tesouro nacional como sobras de campanha, são maquiados como gastos, retornando ao candidato através de rotinas fraudulentas como, por exemplo, a contratação de empresas de publicidade registradas em nome de laranjas.
Em síntese, nota-se que os períodos eleitorais, além de possuírem um curioso potencial para aquecer as atividades acusatórias e investigativas em detrimento de candidatos aos cargos eletivos, também abrem um largo espectro para a prática de delitos econômicos que se tornam de difícil persecução, dada a utilização de instrumentos públicos para a sua consecução.