A Prescrição Intercorrente é um tema que gera grandes discussões. O instituto positivado no art. 11-A da consolidação da leis do trabalho, trazido pela reforma trabalhista, vigente a partir de 11 de novembro de 2017, é base legal para extinguir a execução diante da inércia do exequente que deixa de movimentar o processo por período superior à dois anos:
Art. 11-A, CLT. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois anos.
§ 1° A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução.
§ 2° A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.
Quanto ao conceito da prescrição intercorrente, ensina o professor José Manoel Arruda Alvim (2006, p. 26):
“Para cada ato do processo, interrompe-se a prescrição, novamente, sempre com a inutilização do período já decorrido. E só a partir da inércia, quando ao autor couber a prática de ato, e este não vier a ser praticado, durante o prazo superior ao da prescrição, é que ocorrerá a prescrição intercorrente.”
A Reforma Trabalhista, portanto, trouxe expressamente o lapso temporal para aplicação do incidente, o qual vem sendo utilizado, de forma significativa pelos Magistrados.
É preceito básico que a lei nova revoga a anterior, de modo que a nova legislação passa a regular as relações jurídicas instituídas após a sua vigência. Porém, apesar de ser considerado preceito básico, precisamos nos atentar ao fato de que a norma não retroage para julgar fatos pretéritos, respeitando o ato jurídico perfeito e o direito adquirido, motivo pelo qual, não se aplica, em tese, a prescrição intercorrente ao processo cuja decisão para impulso dos autos se deu em momento anterior à Reforma Trabalhista de 2017.
Nessa diapasão a Constituição Federal estabeleceu:
Artigo 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
A jurisprudência acerca do tema é no mesmo sentido, afastando a aplicação da prescrição intercorrente nos casos em que a decisão para prosseguimento da execução tenha se dado antes da Reforma Trabalhista:
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO EXEQUENTE. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO INCIDÊNCIA. TÍTULO JUDICIAL CONSTITUÍDO EM PERÍODO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 13.467/17. 1. Nos moldes estatuídos pela Súmula 114 desta Corte Superior, "é inaplicável na Justiça do Trabalho a prescrição intercorrente". 2. Por outro lado, a Reforma Trabalhista, lei 13.467/17, introduziu o art. 11-A na CLT, o qual preconiza que ocorre a prescrição intercorrente no Processo do Trabalho no prazo de dois anos, sendo que a fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução. 3. Por sua vez, o art. 2º da Instrução Normativa 41/2018 do TST, instrução que dispõe sobre a aplicação das normas processuais da Consolidação das leis do Trabalho alteradas pela lei 13.467/17, prescreve que "o fluxo da prescrição intercorrente conta-se a partir do descumprimento da determinação judicial a que alude o § 1º do art. 11-A da CLT, desde que feita após 11 de novembro de 2017". 4. Dentro deste contexto, como a presente execução se refere a título judicial constituído em período anterior à vigência da lei 13.467/17, é inaplicável o disposto no art. 11-A da CLT, a rechaçar a incidência da prescrição intercorrente à hipótese dos autos. Recurso de revista conhecido e provido.
(TST - RR: 2917004120005180101, Relator: Dora Maria Da Costa, Data de Julgamento: 18/11/2020, 8ª Turma, Data de Publicação: 20/11/2020)
A lei nova, apesar de ser aplicada de imediato, não tem o condão de reger situações jurídicas firmadas antes da sua vigência, com fulcro no princípio da irretroatividade, que dispõe:
“O princípio da “irretroatividade das leis” é o princípio consagrado no direito brasileiro. Isso significa que apesar da lei nova revogar toda a lei anterior e ser aplicada de forma imediata, ela não tem o condão de interferir em situações jurídicas firmadas antes de sua vigência. Isso porque haveria grande insegurança no caso da retroatividade da lei.” Acesso em 25/02/2022.
Portanto, os atos processuais já praticados antes da lei nova entrar em vigor são mantidos incólumes em todos os seus efeitos e se regram pelas leis que vigiam quando da sua prática. Por consequência, os atos posteriores à vigência da nova lei serão regulados por ela.
Essa é a disposição contida no art. 1° da Instrução Normativa 41/2018 do C. TST, que disciplina a aplicação das normas processuais alteradas pela Reforma Trabalhista dispõe:
Art. 1°. A aplicação das normas processuais previstas na Consolidação das leis do Trabalho, alteradas pela lei 13.467 de 13 de julho de 2017, com eficácia a partir de 11 de novembro de 2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidadas sob a égide da lei revogada.”
Evidente, portanto, que a aplicação da prescrição intercorrente como uma das hipóteses de extinção da execução, não pode ter efeitos retroativos sobre um direito material estabilizando antes da Reforma Trabalhista.
Outrossim, de acordo com o entendimento majoritário dos tribunais superiores é necessário para a aplicação da prescrição intercorrente a intimação pessoal do exequente:
“Ainda que se impusesse tal encargo unicamente ao exequente, é fato que deve ser ressaltado que seria necessário a intimação pessoal do exequente para, ao final, declarar a mencionada prescrição.”
ACORDAM os Magistrados da 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região em: conhecer e, no mérito, DAR PROVIMENTO ao apelo do exequente para, afastando a prescrição intercorrente, determinar que ele apresente sua conta de liquidação, no prazo de dez (10) dias, na forma e nos limites da fundamentação supra.
(Agravo de Petição 0000272-21.2010.5.02.0015, 17ª Turma, Rel. Riva Rosenthal, Julgamento 23/07/2015)
Assim, mesmo que em vigor, a nova lei só pode produzir efeitos para a relação existente a partir da sua vigência, em respeito à cláusula pétrea de proteção ao direito adquirido. Ainda, deve-se, em última instância, proceder com a intimação pessoal do credor, para que, após a sua inércia, se aplique a prescrição intercorrente.
Importante ressaltar que segundo o art. 5º da Recomendação 03/GCGJT de 2019, não correrá o prazo de prescrição intercorrente nas hipóteses em que não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, devendo o juiz, nesses casos, suspender o processo, impedindo a fruição do prazo de prescrição intercorrente.
Conclui-se, portanto, que a prescrição intercorrente como meio de penalizar a inércia do credor, passou a fazer parte da norma trabalhista e só se aplica às decisões proferidas após a vigência da reforma trabalhista, devendo a parte e seu patrono estarem atentos ao lapso temporal de dois anos, para não perderem o direito de perseguirem o seu crédito em juízo.
Por outro Turno, o devedor trabalhista, passa a ter mais um meio de defesa para afastar a responsabilidade pelo pagamento dos seus débitos, evitando-se a eternização de demandas.
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https://camargoecamargoadvogados.com.br/reforma-trabalhista-e-sua-aplicacao-no-tempo-justica-para-todos/. Acesso em 25/02/2022.
ALVIM, José Manoel Arruda. Da prescrição intercorrente. In Prescrição no código civil: uma análise interdisciplinar. Coordenadora Mirna Ciani 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p.26.
MIZIARA, Raphael. Eficácia da lei 13.467/2017 no tempo: critérios hermenêuticos que governam a relação entre leis materiais trabalhistas sucessivas no tempo. In desafios da Reforma Trabalhista. Revista dos Tribunais, 2017, p. 22-23.