Migalhas de Peso

A lei de maior eficácia e publicidade no tocante a legislação especial penal ainda gera muitas dúvidas

A Lei Maria da Penha criou apenas um crime: desobedecer a medida protetiva. Os crimes de feminicídio, lesão, ameaça, entre outros, estão previstos no Código Penal, a Lei Maria da Penha não mudou isso.

22/9/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

A lei 11.340 de 2006, a famosa Lei Maria da Penha, que comemorou 15 anos de existência no último mês de agosto de 2021, foi (e é) uma Lei que criou mecanismos e formas, conceitos e definições, com o objetivo de prevenir e proibir violência contra a mulher em âmbito doméstico e/ou familiar.

Volta e meia identificamos notícias e comentários a respeito da possibilidade de utilizar a Lei Maria da Penha para proteção e prevenção de crimes contra homens e homossexuais, porém isso não é permitido e essa afirmação se sustenta pelo próprio texto legal da referida lei. Vejamos:

Art. 1º, Lei 11.340/2006: Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Ou seja, juízes de primeira instância que, equivocadamente, fornecem decisões que passeiam de medidas protetivas às condenações baseadas na lei, considerando inclusive seu assistencialismo e priorização, estão não somente atentando contra a legislação pátria, mas criando uma insegurança jurídica e afetando a própria eficácia da lei, afinal, quanto maior os equívocos relacionados a um tema, mais fragilizado ele ficará. De sorte, os tribunais superiores vêm reprimindo essa atuação extensiva e pró ativa de juízes de primeiro grau.

No tocante à esfera punitiva, diferentemente do que muito se fala por aí, a Lei Maria da Penha não criou os crimes de feminicídio, lesão corporal contra a mulher, perseguição ou ameaça, por exemplo. A Lei Maria da Penha criou apenas um crime: desobediência à medida protetiva de urgência, cuja pena é de 3 meses a 2 anos de reclusão e, por conceito, a medida protetiva de urgência é a forma de prevenir que o agressor fique próximo da vítima e, caso este fira a medida protetiva, ele estará cometendo o crime previsto na Lei Maria da Penha. Vejamos o texto legal:

Art. 24-A, Lei 11.340/2006: Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.

E só. Não que os demais crimes não sejam importantes, mas eles já estão previstos no Código Penal e a Lei Maria da Penha não alterou isso, assim como não alterou a atuação das ações penais, seus trâmites e demais égides legislativas.

Tratam-se de 46 artigos, divididos por 7 títulos onde a palavra mulher se consolida em 77 oportunidades, não há o que contrapor.

Esta lei, de fato, se consolidou como um símbolo de proteção e prevenção contra a violência em desfavor das mulheres, proveniente de quem quer que seja em âmbito doméstico e/ou familiar, podendo, a partir desta, expor mais notícias sobre casos, quantificar relatos, oportunizar melhorias técnicas, administrativas e repressivas, sem falar na conotação preventiva que fundamentalmente esta lei possui.

Irvyng Ribeiro
Especialista em Direito Penal, formado pela UERJ, Sócio Proprietário de um Escritório de Advocacia, Servidor Público e Colunista nas horas vagas.

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