“(...) Advocati nascuntur (...)” Calamandrei
Calamandrei teria escrito outro livro,
Se hoje bebesse cá, nas águas tropicais do Paraíso ...
E assim começaria seu dito,
Tal como eu o imagino:
“Guardem consigo
Todos os elogios,
O vero advogado não se move por isso,
Mas pelo senso de dever cumprido ...
Sua lida é talhada, sem garantias,
Na dura forja da ciência e da paciência;
Sua via, longa e curvilínea,
É sem descanso ou serventias ...
Seu feitio combativo é, pela ação do tempo, mais lhano;
Seu ofício, moldado na persuasão de argumentos, mais humano:
Não julga, nem condena,
Expurga a culpa, e afasta a pena ...
Recolham também as pompas,
E poupem-no de todas as cerimônias;
Basta-lhe o devido respeito,
Que respeito é o apanágio do Estado de Direito ...
Advogado não exerce poder,
A não ser
O da palavra,
Não tentem, portanto, cerceá-la ou intimidá-la ...
Não lhe digam como escrever seus libelos,
Se densos ou singelos,
Nem como portar-se de antemão na tribuna,
No exercício da sua bravura ...
Não criminalizem sua atividade,
Isso seria criminalizar a liberdade,
Em terras tão devotas, como a nossa,
Do culto da autoridade ...
Não lhe diminuam o digno fruto da sua arte,
Nem aviltem seu nobre sustento;
Não, não fique ao sabor do vento
O que é da legalidade ...
Não lhe falem por fim de interesse público,
Essa escusa vetusta e insossa;
Todo advogado sabe que ele não vale um carvalho
Diante da vida de uma única pessoa ...”
Fica, então, aqui, saudoso amigo,
Versejado, este breve delírio,
Para o teu livro imaginário,
Reinventado e jamais escrito!
Afinal, como tu,
Velho marinheiro,
Bem o sabes,
Ter medo é nevoeiro ...