Recentemente, no artigo “O sistema jurídico nacional e a inexistência do poder fiscalizatório na atividade do propagandista de medicamentos”¹ foi realizada uma abordagem de nosso sistema jurídico frente ao artigo 62, I da CLT, especificamente para a atividade (fato) do propagandista de medicamentos.
Naquela oportunidade, foi examinado o poder fiscalizatório (ou poder de controle) como uma das subespécies do poder empregatício, o seu regramento, na CLT, no Título II (DAS NORMAS GERAIS DE TUTELA DO TRABALHO), em seu Capítulo II (DA DURAÇÃO DO TRABALHO), e as atividades que estão expressamente excluídas deste poder fiscalizatório, entre as quais se destaca o exercente de atividade externa, incompatível com a fixação de horário de trabalho (art. 62, I, da CLT).
Ao final, após exame daquilo que é determinado no dispositivo legal em referência frente às características da atividade exercida pelo propagandista de medicamentos (ou atividade similar), concluía o estudo que a atividade destes profissionais, efetivamente (na prática) são incompatíveis com a possibilidade de o empregador fixar o que marca o início e o fim da jornada de trabalho.
E quais são os motivos/razões que me fazem pensar desta forma e acreditar nisto?
Além daquelas já trazidas no artigo anteriormente mencionado, outras, de origem histórica, legislativa (sistema), jurisprudencial e também interpretativa me levam a mesma conclusão.
1.Evolução histórica da legislação
Sabemos que a legislação (gênero), ainda que não na mesma velocidade, vai se alterando/renovando em decorrência de alterações na sociedade e, especificamente, a legislação trabalhista (espécie) vai se alterando/renovando de acordo com a evolução das relações de trabalho.
E como estava escrito o artigo 62 da CLT, desde sua origem, em 1943??
Em sua redação original, o dispositivo em comento estava assim redigido:
Art. 62. Não se compreendem no regime deste Capítulo:
a) os vendedores pracistas, os viajantes e os que exercerem, em geral, funções de serviço externo não subordinado a horário, devendo tal condição ser, explicitamente, referida na carteira profissional e no livro de registro de empregados, ficando-lhes de qualquer modo assegurado o repouso semanal;
b) os vigias, cujo horário, entretanto, não deverá exceder de dez horas, e que não estarão obrigados à prestação de outros serviços, ficando-lhes, ainda, assegurado o descanso semanal;
c) os gerentes, assim considerados os que investidos de mandato, em forma legal, exerçam encargos de gestão, e, peIo padrão mais elevado de vencimentos, só diferenciem aos demais empregados, ficando-lhes, entretanto, assegurado o descanso semanal;
d) os que trabalham nos serviços de estiva e nos de capatazia nos portos sujeitos a regime especial.
Posteriormente, a lei 7.313, de 1985, suprimiu o inciso “b”, sem qualquer alteração na alínea “a”, passando o dispositivo legal em referência ter a seguinte redação:
Art. 62. Não se compreendem no regime deste Capítulo:
a) os vendedores pracistas, os viajantes e os que exercerem, em geral, funções de serviço externo não subordinado a horário, devendo tal condição ser, explicitamente, referida na carteira profissional e no livro de registro de empregados, ficando-lhes de qualquer modo assegurado o repouso semanal;
b) os vigias, cujo horário, entretanto, não deverá exceder de dez horas, e que não estarão obrigados à prestação de outros serviços, ficando-lhes, ainda, assegurado o descanso semanal; (Suprimida pela Lei 7.313, de 1985)
b) os gerentes, assim considerados os que investidos de mandato, em forma legal, exerçam encargos de gestão, e, peIo padrão mais elevado de vencimentos, só diferenciem aos demais empregados, ficando-lhes, entretanto, assegurado o descanso semanal; (Renumerada pela lei 7.313, de 1985)
c) os que trabalham nos serviços de estiva e nos de capatazia nos portos sujeitos a regime especial. (Renumerada pela lei 7.313, de 1985)
Especificamente em relação a questão em debate (jornada externa), a alínea “a” trazia duas hipóteses objetivas de funções/atividades (os vendedores pracistas, os viajantes), incluía uma situação/atividade bastante abrangente (“... e os que exercerem, em geral, funções de serviço externo”) e trazia apenas um requisito formal para a exceção (...”não subordinado a horário...”), sendo significativamente “aberto” o dispositivo legal.
Ao final de 1994, o artigo 62 da CLT teve uma alteração sensível, passando a ter apenas dois incisos, sendo que o relacionado a jornada externa passou a ser assim redigido, permanecendo o requisito objetivo de necessidade de anotação na CTPS e no livro de registro de empregados, requisito este existente desde a primeira redação do dispositivo legal em comento:
Art. 62 - Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo: (Redação dada pela lei 8.966, de 27.12.1994)
I - os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados; (Incluído pela lei 8.966, de 27.12.1994)
(...)
O que se observa é que o legislador trouxe sensível alteração na forma como passou a entender o que seria uma das exceções ao regime de duração do trabalho (exercentes de jornada externa), tornando-se muito mais restritivo, literal e específico.
Com efeito, se antes o legislador considerava como uma hipótese de exceção ao regime de duração do trabalho, na alínea “a”, “os vendedores pracistas, os viajantes e os que exercerem, em geral, funções de serviço externo não subordinado a horário...”, a partir de dezembro de 1994, considerou esta exceção, no inciso I, apenas para “os empregados que “(sic)...exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho...”, sendo significativamente “restrito e específico” o dispositivo legal.
Clique aqui para conferir o artigo na íntegra.