Migalhas de Peso

O cadastro municipal de prestadores de serviços é declarado inconstitucional pelo STF

Trata-se de importante tema, que irá impactar inúmeros negócios no dia a dia dos prestadores de serviço.

15/3/2021

(Imagem: Arte Migalhas.)

O tema da criação, por parte de diversos Municípios, de cadastro para prestadores de serviços, sempre foi bastante polêmico, mas, até então, era admitido por nossos Tribunais.          

No entanto, através do julgamento do recurso extraordinário 1.167.509, com repercussão geral (Tema 1.020), o Supremo Tribunal Federal entendeu ser inconstitucional tal exigência. Explica-se:          

É notório que o Imposto Sobre Serviços – ISS é um tributo de competência dos Municípios, sendo regulamentado pela Lei Complementar 116/03.        

Referida Lei determina, em seu artigo 3º que, em regra, o ISS é devido para o Município em que o prestador de serviços tiver sua sede.           

Ocorre que, com o intuito de evitar a chamada guerra fiscal, vários Municípios decidiram pela criação do cadastro de prestadores de serviços, para conseguirem identificar quais são os prestadores que prestam serviços dentro da área do Município, sem estarem sediados dentro de seus limites territoriais.           

Caso o prestador de serviços não efetue tal cadastro, o tomador dos serviços é obrigado a reter o valor do ISS, ao fazer o pagamento da nota fiscal, e recolher aos cofres públicos tal valor.          

Desta forma, o prestador de serviços paga o ISS em duplicidade, isto é, efetua o pagamento para o Município em que está sediado, de acordo com a competência tributária, e também para o Município em que presta efetivamente os serviços, em decorrência de legislação municipal.           

O entendimento até então dominante era no sentido de que isso não constituía qualquer violação à Constituição Federal ou a leis infraconstitucionais, já que haveria a bitributação somente se o prestador não se sujeitasse ao cadastro obrigatório nos Municípios em que efetivamente realizasse a prestação de seus serviços. Assim, caso o cadastro fosse realizado, nenhum valor seria devido.           

Contudo, levado a Plenário no Supremo Tribunal Federal, os Ministros, por maioria de votos, de forma correta, entenderam que as leis municipais que criam referidos cadastros são inconstitucionais. Importante observar que o recurso extraordinário analisado pelo STF julgou a inconstitucionalidade da lei editada pelo Município de São Paulo, mas como dito, foram vários os Municípios que editaram leis semelhantes.           

De acordo com os votos vencedores, encabeçados pelo Ministro Marco Aurélio, as leis municipais que criam o cadastro obrigatório estão usurpando a competência instituída pela Constituição Federal.           

Isto porque, tais leis estão criando deveres instrumentais para prestadores de serviços com os quais não possuem qualquer relação tributária.           

Ora, a partir do momento em que os prestadores não estão sediados em seus limites territoriais, tais profissionais não são sujeitos passivos de ISS perante aquele Município, não tendo qualquer relação jurídica que permita a criação de regras tributárias com entes que são incompetentes para a cobrança dos tributos devidos. 

E pior, caso não seja feito o cadastramento, a sanção imposta é a criação da incidência da exação tributária, cujo valor, como dito, deve ser retido pelo tomador dos serviços.          

Com tal entendimento, o STF entendeu que as leis municipais que criam referidos cadastros deturpam os critérios espacial e pessoal da regra-matriz de incidência do ISS.

Ademais, ficou decidido também que tal matéria somente poderia ser veiculada através de lei complementar editada pela União, já que é este o ente competente para edição de normas gerais em caráter tributário.         

Portanto, com o reconhecimento da inconstitucionalidade, além de não terem mais obrigatoriedade de cadastramento, abre-se aos prestadores de serviços a possibilidade de pleitearem os valores das retenções a que foram sujeitos nos últimos cinco anos.           

Trata-se de importante tema, que irá impactar inúmeros negócios no dia a dia dos prestadores de serviço.           

Por fim, foi fixada a seguinte tese para o tema da repercussão geral: "É incompatível com a Constituição Federal disposição normativa a prever a obrigatoriedade de cadastro, em órgão da Administração municipal, de prestador de serviços não estabelecido no território do Município e imposição ao tomador da retenção do Imposto Sobre Serviços – ISS quando descumprida a obrigação acessória".

Márcio Alexandre Ioti Henrique
Advogado tributarista e sócio do escritório Henrique & Gaspar Sociedade de Advogados.

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