O Dia da Consciência Negra é celebrado no Brasil na data de 20 de novembro, em referência a Zumbi, líder do Quilombo de Palmares, que lutou contra a escravidão no Nordeste, até seu falecimento, em 1695.
Tal data foi incluída no calendário escolar pelo artigo 79-B, da lei 10.639/03, e oficialmente instituída no país pela lei 12.519/11. Apesar de legalmente novo, o Dia da Consciência Negra é pauta de discussão no Brasil desde a década de 1970, quando um grupo de quilombolas gaúchos trouxe à tona o assunto, questionando o legado da escravidão no país, que culminou no trágico assassinato de Zumbi.
A despeito de todo reconhecimento trazido junto à celebração do Dia da Consciência Negra, a luta antirracista ainda enfrenta grandes batalhas. É evidente a necessidade da evolução de uma sociedade que, ainda, se mostra segregacionista e que carrega o pesado fardo da escravidão no Brasil.
Nessa conjuntura, a mídia mostra, com frequência, casos em que o racismo violenta e, até mesmo, mata os negros no Brasil e no mundo. Recentemente, ganhou grande destaque o caso de assassinato de George Floyd, após um policial branco se ajoelhar em seu pescoço até sufocá-lo, mesmo enquanto George pedia por sua vida dizendo “não consigo respirar”. O caso aconteceu em Minnesota, nos Estados Unidos, mas ganhou repercussão mundial.
Foi então que ascendeu o movimento “Black Lives Matter” ou, em português, “Vidas Negras Importam”, criado em 2013 por ativistas negros norte-americanos. O Black Lives Matter teve início com o objetivo principal de combater a violência racista, mas abrangeu sua luta como um movimento pelos direitos da população negra como um todo.
É preciso compreender que o racismo não se trata apenas de atitudes visíveis e óbvias, como foi o assassinato de Georde Floyd, mas também da ausência de direitos necessários enquanto reparação histórica pela escravidão. O racismo, antes de tudo, é uma questão estrutural, que acontece de forma sistemática e singela, e que deve ser combatido desde a sua raiz.
A plataforma Change.org lançou um abaixo-assinado ‘Justiça para George Floyd’, iniciado em maio deste ano, registrando um fenômeno que se tornou recordista em assinaturas, chegando a 19,6 milhões de apoiadores em todo o mundo, conforme informação obtida em 1/10/20. O Brasil é o quarto país mais engajado nessa causa, que levou a discussão sobre o antirracismo para um novo patamar de visibilidade.
Diante disso, não somente a legislação do país, mas também as outras esferas abarcadas pelo Direito trazem consigo a necessidade de reparar o infeliz legado deixado pela desigualdade racial e, majoritariamente, pelo período da escravatura.
A luta antirracista é constante e atual e, por isso, faz-se necessária a devida criação e aplicação de um sistema legislativo e jurídico que abrace essa causa, compreendendo que a Constituição de 1988 é um marco contra a discriminação. O Princípio Constitucional de Igualdade, pelo qual é garantido tratamento isonômico pela Lei, é reiterado no que se refere ao racismo no artigo 4º, VIII:
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
(...)
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
Dentro do dever de repúdio ao racismo e de reparação histórica, fala-se sobre o sistema de cotas universitárias, por exemplo, que vem com o objetivo de mudar as estatísticas, que sempre mostraram uma menor frequência de negros nos ambientes acadêmicos e que, agora, têm o seu lugar garantido nas universidades.
O CESA - Centro de Estudos das Sociedades de Advogados realizou um levantamento informal em 2016, junto a alguns dos escritórios associados, que indicou que menos de 1% de todo o quadro profissional é composto por pessoas negras. Segundo o mesmo estudo, nas seleções promovidas para a contratação de estagiários – principal meio de ingresso aos escritórios de advocacia – o número de candidatos negros é ínfimo ou, em alguns casos, inexistente. O CESA lançou o Projeto Incluir Direito, cujo objetivo é a maior participação de negros no universo jurídico e desenvolver uma atuação coerente e afirmativa, que contribua para a redução das desigualdades e da discriminação. Para maiores informações: (Clique aqui)
Não apenas no âmbito da educação, como também no mercado de trabalho, em campanhas publicitárias, na arte, na moda e em tantas outras esferas sociais, o que se busca é a representatividade e a inclusão devida da população negra em todos os setores e segmentos, que, por tanto tempo, foi marginalizada.
É imperioso o entendimento de que a luta antirracista também é uma luta contra a omissão e contra o desleixo diante da carga histórica carregada pelos negros. É uma luta a favor de quem ocupa mais da metade da população brasileira, que assim se declara, e, ainda assim, não goza do mesmo lugar que a branquitude ocupa. Faz-se sempre importante o papel do Direito e dos juristas em buscar não apenas a criação de um corpo legislativo que abomine a discriminação racial, mas que, principalmente, o aplique e o faça respeitado por todos.
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*Stanley Martins Frasão é sócio advogado do escritório Homero Costa Advogados.
*Nathália Caixeta Pereira de Castro é colaboradora do escritório Homero Costa Advogados.