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Decreto 10.422 e a possibilidade de não pagamento do benefício emergencial pelo Governo Federal: Riscos ao empregador

O decreto trouxe ânimo às partes da relação de trabalho (empregador e empregado), pois permite a redução da jornada e salário e suspensão do contrato de trabalho por até 120 dias, de modo a preservar empresas e empregos.

16/7/2020

Em 13 de julho de 2020 foi publicado o decreto 10.422, que prorrogou os prazos para redução de jornada de trabalho e salário, bem como a suspensão do contrato de trabalho, que foram regulados pela lei 14.020/20. Essa regulamentação era esperada com muita ansiedade e expectativa por parte dos empregadores e empregados, tendo em vista os efeitos nefastos ocasionados pela pandemia de coronavírus que culminou, no aspecto econômico, na extinção de milhares de empresas e postos de trabalho por consequência.

A priori, o decreto trouxe ânimo às partes da relação de trabalho (empregador e empregado), pois permite a redução da jornada e salário e suspensão do contrato de trabalho por até 120 dias, de modo a preservar empresas e empregos.

No entanto, importante observar com demasiada cautela (para não dizer “temor”) o que consta no art. 7º do regulamento, in verbis:

Art. 7º A concessão e o pagamento do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda e do benefício emergencial mensal de que tratam, respectivamente, os art. 5º e art. 18 da lei 14.020, de 2020, observadas as prorrogações de prazo previstas neste Decreto, ficam condicionados às disponibilidades orçamentárias. – destaques acrescidos.

Da leitura do dispositivo acima, aquilata-se que, de forma subliminar, o Governo Federal trouxe a possibilidade de, mesmo havendo acordo (individual ou coletivo) válido para a prorrogação da redução de jornada e salário e suspensão do contrato de trabalho, não ser pago ao trabalhador o benefício emergencial constante na lei 14.020/201 (outrora MP 936).

Diferentemente do que trouxe a supramenciona lei, o decreto impõe uma condição para o pagamento do benefício emergencial: a disponibilidade orçamentária. Aqui, enxergamos possível risco de ineficácia dos efeitos da redução da jornada e salário e/ou da suspensão do contrato de trabalho. Expliquemos:

É consabido que o principal objetivo da adoção das medidas ora mencionadas é garantir a sobrevivência das empresas e, por consequência, preservar os postos de trabalho. Todavia, caso o Governo Federal não conceda e pague o benefício emergencial ao trabalhador, é possível (ou até provável) que seja a empresa compelida a proceder com o adimplemento integral dos salários por conta da omissão do poder público.

Não é raro vermos decisões judiciais obrigando os empregadores a manter salários de empregados afastados, como na criação jurisprudencial da obrigação de pagar por conta do limbo jurídico previdenciário. Os principais fundamentos utilizados para esse tipo de ordem judicial são a dignidade da pessoa humana e a hipossuficiência do trabalhador em relação ao empregador.

Na brecha trazida pelo decreto em comento, se o governo federal não conceder e pagar o auxílio emergencial ao empregado, é (muito) provável que tal ônus recaia sobre o empregador que, a princípio não estaria obrigado a proceder com o pagamento de salários (parcial ou integral), mas por força dos fundamentos acima mencionados e também na agora super valorizada função social da empresa, pode ser compelido.

Importante mencionar que, ao contrário do que se pode imaginar num primeiro momento, não estaríamos diante de vilania da Justiça do Trabalho (que deveras é protetora), mas sim de oportunidade criada pelo próprio Executivo ao trazer explicitamente a possibilidade de “calote” aos empregados que tiverem seus contratos de trabalho atingidos pela redução da jornada e salário ou suspensão do contrato de trabalho.

Acaso não haja o pagamento do benefício emergencial, há fundado risco de determinação judicial no sentido de que o empregador deverá arcar com os salários no período de redução ou suspensão (por ser verba de natureza alimentar), podendo ser resguardado o direito de regresso em face da fazenda pública (União, in casu).

Sendo o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda2 criado justamente para preservar o emprego (fundamentalmente a empresa, pois sem ela não há trabalho) com o pagamento de parte ou totalidade dos salários de determinados empregados, na hipótese de o Governo Federal não arcar com a concessão e pagamento do benefício emergencial, teremos o completo esvaziamento do decreto 10.422, tornando-se inócuo e ineficaz.

Diante disso, é mister que as empresas tenham máxima cautela na adoção das medidas ora permitidas pelo decreto 10.422, a fim de que se evite ou mitigue os riscos de eventual “inadimplemento” por parte do Governo Federal no tocante ao pagamento do benefício emergencial constante da lei 14.020/20.

_________

1 Art. 5º Fica criado o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, a ser pago nas seguintes hipóteses:

I - redução proporcional de jornada de trabalho e de salário; e

II - suspensão temporária do contrato de trabalho.

§ 1º O Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda será custeado com recursos da União. [...]

2 Art. 1º Esta Lei institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. (Lei. 14.020/20)

_________

*Afonso Almeida é advogado do escritório MoselloLima Advocacia especialista em direito constitucional, administrativo e tributário.

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