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Direito marcário

Às marcas, reitere-se: sua proteção não tem apenas a finalidade de assegurar direitos ou interesses meramente individuais do seu titular, mas objetiva, acima de tudo, proteger os adquirentes de produtos ou serviços, conferindo-lhes subsídios para aferir a origem e a qualidade do produto ou serviço, tendo por escopo, ainda, evitar o desvio ilegal de clientela e a prática do proveito econômico parasitário. Assim pode ser resumida a função social da marca à luz da Constituição Federal/88 e da lei 9.279/96.

11/2/2019

A Constituição Federal de 1988 enumerou, entre os direitos e as garantias fundamentais, a proteção à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país (artigo 5º, inciso XXIX, CR/88).

O assunto que já era tratado nas Constituições de 1824; 1891; 1934; 1946, sofreu evolução. Isso porque nas referidas Constituições se previa que os inventos industriais pertenceriam aos seus autores, aos quais ficariam garantido por lei um “privilégio temporário”, ou seria concedido pelo Congresso um “prêmio razoável” quando houvesse conveniência de divulgação do invento perante a sociedade.

Na Constituição de 1967, alterada pela emenda constitucional 1 de 1969, a questão se aperfeiçoou na medida em que o legislador manteve a garantia de concessão do “privilégio temporário” para os autores de inventos industriais e inovou, ao assegurar a propriedade das marcas de indústria e comércio, bem como a exclusividade do nome comercial.

A marca é o sinal visualmente representado, que é configurado para o fim específico de distinguir a origem dos produtos e serviços. Símbolo voltado a um fim, sua existência fática depende da presença desses dois requisitos: capacidade de simbolizar e capacidade de indicar uma origem específica, sem confundir o destinatário do processo de comunicação em que se insere: o consumidor.

Sua proteção jurídica depende de um fator a mais: a apropriabilidade, ou seja, a possibilidade de se tornar um símbolo exclusivo, ou legalmente unívoco do objeto simbolizado.

A doutrina nacional e estrangeira reconhece que há, pelo menos, quatro funções das marcas: (i) identificar o produto ou serviço, distinguindo-o do congênere existente no mercado; (ii) assinalar a origem e a procedência do produto ou serviço; (iii) indicar que o produto ou serviço identificado possui o mesmo padrão de qualidade; e (iv) funcionar como instrumento de publicidade, configurando importante catalisador de vendas.

Ao individualizar um produto, distinguindo-o das mercadorias concorrentes, a marca atua como verdadeiro investimento do comerciante em seu negócio, permitindo a conquista da preferência e da fidelidade do consumidor.

A proteção da marca tem como objetivos primordiais afastar a concorrência desleal e proteger o consumidor de possíveis erros. São essas as finalidades consagradas pela lei 9.279/96 (Lei de Propriedade Intelectual), em geral, assim como, em particular, no art.124, inciso XIX da referida lei1.

A concorrência é própria do regime de economia de mercado, havendo, naturalmente, que se considerar como intrínseca a esse sistema econômico a disputa entre empresas, desde que respeitadas as regras da competição.

O fundamento da proteção dos direitos definidos como propriedade industrial, especialmente das marcas de indústria, comércio e serviços, está na concorrência.

Em uma sociedade que tem como princípio fundamental a livre iniciativa (art. 1º, IV, da CR/88), é imprescindível a proteção à livre concorrência que, inclusive, constitui Princípio Geral da Ordem Econômica da Sociedade Brasileira (art. 170, IV, CR/88).

Por outro lado, deve-se considerar que a livre concorrência, como toda liberdade, não é absoluta e irrestrita. O seu direito encontra limites nos preceitos dos outros concorrentes pressupondo um exercício legal e honesto do direito próprio, expresso da probidade profissional. Excedidos esses limites surge a concorrência desleal.

Isso significa que em determinado mercado há regras a serem seguidas, as quais definem os limites entre os padrões aceitáveis e os inadmissíveis de concorrência. Nesse contexto, quando um concorrente utiliza métodos condenáveis de práticas de mercado, o Direito intervém e atua para reprimir a concorrência desleal.

Algumas marcas possuem notoriedade, o que tem o condão de alcança-la à categoria de marca notória, de alto renome.

A marca de alto renome é definida pelo INPI como a marca devidamente registrada, "cujo desempenho em distinguir os produtos ou serviços por ela designados e cuja eficácia simbólica levam-na a extrapolar seu escopo primitivo, exorbitando, assim, o chamado princípio da especialidade, em função de sua distintividade, de seu reconhecimento por ampla parcela do público, da qualidade, reputação e prestígio a ela associados e de sua flagrante capacidade de atrair os consumidores em razão de sua simples presença" (resolução INPI 107/13).

Nas marcas de alto renome, sobressai a ocorrência do fenômeno mercadológico denominado secondary meaning ("teoria do significado secundário da marca"), mediante o qual um sinal fraco (como os de caráter genérico, descritivo ou até evocativo) adquire eficácia distintiva (originariamente inexistente) pelo uso continuado e massivo do produto ou do serviço.

A distinguibilidade nasce da perspectiva psicológica do consumidor em relação ao produto e sua marca, cujo conteúdo semântico passa a predominar sobre o sentido genérico originário.

A proteção à propriedade intelectual é importantíssima, mas não é um fim em si mesmo, principalmente quando tratamos de produtos e mercados aquecidos.

Às marcas, reitere-se: sua proteção não tem apenas a finalidade de assegurar direitos ou interesses meramente individuais do seu titular, mas objetiva, acima de tudo, proteger os adquirentes de produtos ou serviços, conferindo-lhes subsídios para aferir a origem e a qualidade do produto ou serviço, tendo por escopo, ainda, evitar o desvio ilegal de clientela e a prática do proveito econômico parasitário. Assim pode ser resumida a função social da marca à luz da Constituição Federal/88 e da lei 9.279/96.

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1 Art. 124. Não são registráveis como marca: [...] XIX - reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia.

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*Luana Otoni de Paula é advogada sócia de Homero Costa Advogados.

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