Vários são os aspectos que devem servir de supedâneo para essa seleção. Impactos sobre o meio ambiente urbano, a demanda dos usuários e a respectiva capacidade de atendimento, qualidade, economicidade, acessibilidade, extensão e integração aos modais já existentes quando da prestação do serviço, principalmente ao trecho do metrô já construído e a construir, além do futuro VLT no subúrbio ferroviário, devem ser objeto da análise. São pressupostos basilares para qualquer interferência desta natureza e o seu atendimento é dever, em face dos princípios constitucionais da proteção ambiental, da eficiência, do planejamento e as regras da continuidade do serviço público e modicidade das tarifas, por exemplo.
Os critérios de deliberação não se resumem ao custo e tempo de implantação. Portanto, uma querela midiática, resumida ao embate entre o número de árvores a serem suprimidas é um equívoco, técnico e jurídico. A questão da fauna urbana, cujos exemplares não são nativos e podem ser repostos, resolve-se deslocamento, replantio e outras formas de compensação do impacto, certamente já previstas na licença ambiental, os quais devem ser precedidos de estudo de impacto ambiental – mais amplo e completo que o tão falado estudo de impacto de vizinhança, onde conste diagnóstico, prognóstico, alternativas de projetos e modais e os critérios econômicos, sociais e ecológicos que levaram a seleção do modal, a partir de atos transparentes e debates públicos, ao ensejo da denominada participação popular e gestão democrática da cidade.
Decisão e política pública dessa magnitude, não pode se basear apenas em critérios monetários e de prazo, mas, principalmente, nos fatores qualitativos já citados. Não pode olvidar, ainda, que circular, com qualidade de tempo, acomodação e trechos é direito de todo cidadão previsto na Carta Magna. Não há uma vida digna (art. 1º) onde a pessoa não se desloca de forma segura, confortável, ágil e que respeite o meio ambiente. Igualmente, não cumpre sua função social (art. 182) a cidade sem mobilidade e saneamento. Compete ao poder público cumprir com este dever, em decisão fundamentada, pública e objetiva, fundada em aspectos sociais, ambientais e econômicos, comprovando a viabilidade do BRT, sob pena de responsabilidade dos gestores.
Demais disso, cumpre esclarecer que obras de infraestrutura, como esta, causam impactos ambientais, mas, em rigor, são produzidas em áreas já antropizadas e, a longo prazo, após o período de implantação, permitem a mitigação de impactos dos mais diversos, além de comportarem atos compensatórios de ordem paisagística e natural no local e em outros espaços da metrópole. Igualmente importante é que as atenções da comunidade, dos três poderes, notadamente no âmbito do controle externo e interno, assim como do Ministério Público, deve incidir em torno dos estudo técnicos, de viabilidade, do planejamento orçamentário, da execução da obra e seus custos, prazo de entrega e conclusão total, para que não ocorra prejuízos ao erário. Finalmente, não se pode olvidar que já é sabido e conhecido que a execução de elevados e viadutos carrega, em si, a possível degradação social e desvalorização no seu entorno, devendo estarem previstas alternativas e soluções que as impeçam ou as minimizem.
Portanto, é inconstitucional, desprovido de base técnica e mesmo mesquinho polarizar a questão do BRT sem verificar todo o devido processo legal que levou a sua contratação, os motivos e motivações dos atos administrativos praticados e sem discutir a sua essência, ou limitar a questão das árvores – que tem alternativa de compensação e lembrando que o metrô suprimiu vinte vezes mais que o projeto do BRT. É preciso conhecer a fundo o projeto, seus impactos positivos e negativos, socioeconômicos e ambientais, além daqueles relacionados a qualidade de vida, de trabalho, segurança e tempo do cidadão soteropolitano, garantidos pelo art. 6° da Constituição, pena de violação às funções sociais da cidade e aos princípios da administração pública e da sustentabilidade, inscritos nos artigos 182 e 225 da nossa lei maior.
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*Georges Humbert é sócio do escritório Biazzo Simon Advogados. Professor, pós-doutor em Direito e Democracia pela Universidade de Coimbra – Portugal e doutor e mestre em Direito do Estado.