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Justiça em foco: a quem interessa atacá-la?

A partir do momento em que a escalada sem tréguas vigorou para o combate incessante da corrupção e o uso desenfreado do dinheiro público, a magistratura nacional passou a ser o foco da imprensa e dos comentários gerais, desde vencimentos, quanto custa um juiz para os cofres públicos, até desmandos pontuais que são invariavelmente generalizados.

11/9/2017

Enquanto a Justiça não fustigava e punia políticos e corruptos, nada existia contra ela. A partir do momento em que a escalada sem tréguas vigorou para o combate incessante da corrupção e o uso desenfreado do dinheiro público, a magistratura nacional passou a ser o foco da imprensa e dos comentários gerais, desde vencimentos, quanto custa um juiz para os cofres públicos, até desmandos pontuais que são invariavelmente generalizados.

No entanto, a produção da Justiça Estadual cresceu cerca de treze por cento, se comparada com igual período no ano passado. Os magistrados julgaram mais de 31 milhões de processos, restando um estoque de mais de 80 milhões de feitos.

Mas de quem é verdadeira e ineliminavelmente a culpa? As instituições do país precisam se conscientizar de que a ferramenta da Justiça tem má utilização, sob duplo prisma de visão. As ineficientes execuções fiscais são lançadas a rodo pelas municipalidades, evitando prescrição e enquadramento na Lei de Responsabilidade Fiscal, além do fator recursal. Em linhas gerais, o poder público, administração direta e indireta, de tudo recorre, chegando até a última instância, sem falar na confecção do precatório e a demora por mais de uma década de sua performação e efetivo pagamento.

Dentro desse quadro, o maior gerador de processos é, induvidosamente, o paquidérmico Estado brasileiro, o primeiro a cobrar e o último a pagar, donde discorre a necessária revisão do modelo para que a Justiça em foco não seja meramente uma máquina de fazer decisões, mas sobre ela incidam investimentos, planejamento e, sobretudo, um monitoramento para descobrir os gargalos e os entraves. Uma espécie de pesquisa científica para minorar os descalabros e descortinar as razões pelas quais alguns feitos ultrapassam a média e não chegam a bom termo.

Todos os órgãos de controle deveriam ter seus cargos preenchidos mediante concurso, não por meio de indicações de natureza política e não técnica. E os desvios praticados por juízes não atingem índices de dois por cento sobre a totalidade da classe – hoje perto de 18 mil magistrados espalhados Brasil afora.

O ataque agressivo feito à magistratura não se sustenta. Há um movimento que visa, antes de mais nada, a um encanto indisfarçável para jogar em prol da plateia. A quem interessa essa campanha difamatória, orquestrada e produzida com o intuito de menoscabar a magistratura e apequenar seu quadro institucional?

Há, sem sombra de dúvida, um caminhar maldoso de malfeitores, os quais foram pilhados em flagrante e não se conformam com suas punições por intermédio de amplo contraditório ou, no jargão, da colaboração premiada. Querem imputar aos juízes o descalabro econômico, o não crescimento, a recessão, o desemprego e falta de infraestrutura, como se o Judiciário tivesse a caneta para contratar e saber exatamente quais as deficiências do serviço público para preencher suas respectivas lacunas.

Efetivamente há um complexo agir de retaliação e grande incômodo, pois que estão perturbados e insatisfeitos quando a máquina judiciária opera e funciona nos interesses da sociedade.

Grandes peixões políticos foram pegos e presos e, de modo semelhante, empresários acima da lei, que nunca, jamais imaginaram que um dia estariam atrás das grades, ou usando uma tornozeleira para monitoramento à distância.

Querem, mediante atos e fatos, gerar no Parlamento uma ação que abafe o combate à corrupção e colocar em dúvida a honestidade e capacidade dos juízes, os quais, em sua maioria, são inseridos nos seus cargos por intermédio de concurso e somente se aprimoram para fins de promoção se demonstrarem competência e amplo discernimento.

Diariamente na mídia, nos jornais em geral e também na internet, a Justiça passou – a partir da ação 470, o famoso Mensalão – a ser policiada, vivenciada e calibrada pelos olhos desconfiados de muitos em cooperação com a imprensa. Querem retaliar para forçar um desassossego e imprimir um clima de intranquilidade e insegurança.

Qualquer reajuste de vencimentos pela inflação é tido como desvio, e bastaria pagar algum atrasado ou férias não usufruídas para haver estardalhaço. Acusam-nos de ter 60 dias de férias por ano, exceção das cortes superiores, as demais não tendo o privilégio de permanecer o tempo em gozo de férias, licença-prêmio ou dias de compensação. As estatísticas demonstram que 80% dos juízes saem de férias apenas 15 dias por ano, além de tantos outros que saem apenas poucos dias, a fim de evitar atolamento e entupimento dos acervos, notadamente nas cortes.

Precisamos ter muito claro e de forma transparente que a Justiça hoje é o foco de todas as manchetes, quer de prisão ou mesmo de soltura. Estão a cada dia mais avalizando e julgando os juízes, mas sempre com o viés de apontar defeitos, ver falhas ou corrigir situações as quais desagradam grupos políticos ou econômicos.

A independência, juntamente com a soberania e autonomia, são os maiores predicamentos da magistratura, a qual nos últimos anos se desvencilhou por completo do Legislativo e do Executivo, passando não só a ter liberdade e opinião própria, mas também punindo exemplarmente maus empresários que se serviram da corrupção para efeito de superfaturamento.

Os dias não são amistosos, mas ferir de morte a magistratura significará romper com sua tradição e abrir um perigoso precedente que poderá abalar o Estado Democrático e o equilíbrio essencial que está a cargo da Justiça, gostem ou desgostem nossos críticos de plantão com interesses até agora pouco revelados.

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*Carlos Henrique Abrão é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.

*Laércio Laurelli é desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.


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