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A descriminalização do crime de desacato pelo STJ e o Estado Democrático de Direito

O anteprojeto do novo Código Penal - lei 236 de 2012 - em trâmite no Senado prevê a descriminalização do crime de desacato com a revogação desta tipificação do rol legal de crimes.

12/6/2017

O Código Penal prevê em seu artigo 331 que é crime “desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela”. A pena para este delito pode chegar até a 2 anos de detenção. Recentemente o STJ ao julgar o

Recurso Especial 1.640.084/SP proferiu decisão entendendo pela descriminalização de tal delito. A fundamentação foi no sentido de que esta previsão legal viola o artigo 13 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que estabelece a liberdade e o direito de expressão.

O voto do Relator Ministro Ribeiro Dantas é claro ao expor que a existência de crime de desacato demonstra a desigualdade entre funcionários públicos e particulares, ato completamente contrário ao Estado Democrático de Direito instituído pela Constituição Federal de 1988.

Esclarece, ainda, que “a CIDH já se manifestou no sentido de que as leis de desacato se prestam ao abuso, como meio para silenciar ideias e opiniões consideradas incômodas pelo establishment, bem assim proporcionam maior nível de proteção aos agentes do Estado do que aos particulares, em contravenção aos princípios democrático e igualitário”.

Apesar de ainda termos a previsão legal no Código Penal de tal crime, é possível verificar que esta decisão é um novo passo para a descriminalização de delitos que ainda estão estabelecidos e que são resquícios da Ditadura Militar, que violam por completo os direitos individuais constitucionais em prol da defesa de regras autoritárias.

Vale ressaltar que o anteprojeto do novo Código Penal - lei 236 de 2012 - em trâmite no Senado prevê a descriminalização do crime de desacato com a revogação desta tipificação do rol legal de crimes.

Ainda há muito que percorrer para que crimes como este sejam de fato revogados da nossa legislação federal, contudo, decisões como esta retomam o verdadeiro sentido do Estado Democrático de Direito que foi instituído em nosso Estado, mas ainda não se vê inteiramente respeitado e em pleno vigor.

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*Mariana Cardoso Guimarães é advogada e sócia do escritório Homero Costa Advogados.

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