Atividade jurídica para ingresso na magistratura – considerações sobre a Resolução nº. 11 do Conselho Nacional de Justiça
Leandro J. Silva*
Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt*
I - zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências.
Com a publicação da Resolução n° 11, que trata da definição de atividade jurídica, dentre outras disposições, pelo Conselho Nacional de Justiça, começam a surgir novas indagações.
Em primeiro lugar, a norma que rege o ingresso na carreira da magistratura consta da própria Constituição Federal que, por força da Emenda Constitucional nº. 45/2004, estabeleceu em seu artigo 93, inciso I, o seguinte:
Art. 93. “Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação”;
Já se entendia que não seria possível considerar atividades exercidas, antes da condição de Bacharel em Direito, como sendo atividades jurídicas. Ao se analisar esse aspecto da norma constitucional, deve-se levar em consideração a intenção do constituinte ao elaborar a Emenda Constitucional, qual seja, de que o Bacharel em Direito possuísse três anos de experiência. Desta forma, interpretando-se o dispositivo constitucional, a finalidade que o constituinte derivado quis imprimir à norma foi a exigência de três anos de atividade na área jurídica ao indivíduo formado em Direito, ou seja, ao Bacharel em Direito, conforme se verifica analisando os estudos realizados no Congresso Nacional.
A recente Resolução n° 11, de 31 de janeiro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, regulamentou a noção de atividade jurídica nesse mesmo sentido ora exposto, buscando estabelecer regras e critérios gerais e uniformes quanto ao tema, uma vez que tal assunto ainda não consta do Estatuto da Magistratura.
Assim, o art. 1º busca explicitar o alcance da norma constitucional ao determinar que somente será computada a atividade jurídica posterior à obtenção do grau de bacharel <_st13a_personname w:st="on" productid="em Direito. O">em Direito. O art. 2º, por sua vez, afirma que atividade jurídica consiste naquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito, bem como o exercício de cargos, empregos ou funções, inclusive de magistério superior, que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico, vedada a contagem do estágio acadêmico ou qualquer outra atividade anterior à colação de grau. Estão compreendidos no cômputo do período de atividade jurídica os cursos de pós-graduação na área jurídica reconhecidos pelas Escolas Nacionais de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados de que tratam o artigo 105, parágrafo único, I, e o artigo 111-A, parágrafo 2º, I, da Constituição Federal, ou pelo Ministério da Educação, desde que integralmente concluídos com aprovação (art. 3º).
No momento da inscrição definitiva do concurso deverá ser feita a comprovação do período de três anos de atividade jurídica. Aqui a Resolução seguiu caminho diverso do disposto na Súmula nº 266 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “o diploma ou habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não na inscrição para o concurso público”, o que certamente ensejará inúmeras demandas perante o Poder Judiciário.
Para os ocupantes de cargos, empregos ou funções não privativos do bacharel em Direito, a comprovação do tempo de atividade jurídica será realizada mediante certidão circunstanciada, expedida pelo órgão competente, indicando as respectivas atribuições exercidas e a prática reiterada de atos que exijam a utilização preponderante de conhecimento jurídico.
Deve-se entender que houve o esclarecimento por parte da Resolução da real abrangência do dispositivo constitucional em tela, a respeito da matéria. Não houve usurpação de espaço reservado à lei em sentido formal. A presente norma tratou apenas de elucidar a compreensão daquilo que o próprio constituinte derivado já buscava, não pretendendo inovar o ordenamento jurídico. O CNJ realizou a sua função pública de controle da atividade administrativa, prevista constitucionalmente, ao dissipar as divergências a respeito do corrente entendimento da expressão “atividade jurídica”.
O art. 6º da resolução em tela, por outro lado, extrapola dos limites normativos do Conselho, ao criar impedimento de integrar comissão do concurso e banca examinadora, para todo aquele que exercer a atividade de magistério em cursos formais ou informais voltados à preparação de candidatos a concursos públicos para ingresso na carreira da magistratura até três anos após cessar a referida atividade de magistério. Nessa hipótese, a Resolução invadiu o campo da reserva legal, ao criar proibição que não possui expressa menção na lei em sentido formal. Nesse sentido, Lenio Luiz Streck, Ingo Wolfgang Sarlet e Clèmerson Merlin Clève, no artigo “Os limites constitucionais das resoluções do CNJ e do CNMP, publicado na Revista Jurídica Última Instância, em 14 de novembro de 2005, afirmam que “as resoluções que podem ser expedidas pelos aludidos Conselhos não podem criar direitos e obrigações e tampouco imiscuir-se (especialmente no que tange à restrições) na esfera dos direitos e garantias individuais ou coletivas. O poder “regulamentador” dos Conselhos esbarra, assim, na impossibilidade de inovar”.
Tal compreensão é necessária para impedir eventual violação aos direitos fundamentais dos cidadãos, uma vez que estamos em um efetivo Estado Democrático de Direito. Apenas a lei em sentido formal, instrumento normativo originário, elaborado pelos representantes do povo, tem o condão de restringir as liberdades do cidadão.
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*Professores
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