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A utilização da arbitragem em obras públicas

A preferência na escolha da arbitragem como meio de solução de parte dos litígios garante maior segurança jurídica ao setor em análise e possibilita melhores decisões por conta da especialidade dos árbitros.

2/2/2017

No dia 25 de novembro de 2016 foi publicada a MP 752/16 que, dentre outros objetivos, buscou sanar uma série de impasses relacionados aos contratos de concessão realizados por meio do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), nos setores de infraestrutura.

O referido documento possui 26 artigos que tratam sobre as diretrizes gerais para a prorrogação e a relicitação de concessões, permitindo que estes contratos sejam prorrogados de modo antecipado, desde que sejam feitos investimentos adicionais, ou relicitados, caso a execução destes se demonstre inviável economicamente. De acordo com o Ministro de Planejamento, Dyogo Oliveira, a medida adotada pelo governo poderá gerar novos investimentos no montante de R$ 15 bilhões.

Além das novidades supramencionadas, observa-se que o documento teve também o objetivo de definir a arbitragem como uma possível ferramenta para solução de disputas entre a administração pública e as concessionárias. O instituto da arbitragem, nesse sentido, pode ser compreendido como mecanismo extrajudicial, no qual as partes decidem submeter um determinado litigio à um terceiro para fornecer uma decisão definitiva e executável, uma vez que a sentença arbitral é título executivo judicial, conforme art. 515, VII, do NCPC.

Nomeia-se este terceiro como "árbitro", assumindo, tão logo, deveres de imparcialidade e independência, fazendo, desse modo, jus à confiança depositada pelas partes. Em outras palavras, por meio da escolha da arbitragem, afasta-se os efeitos negativos da morosidade do Poder Judiciário brasileiro, uma vez que a escolha direta do julgador por conta da sua especialidade, além da lei aplicável ao procedimento e à matéria do conflito, possibilitam que decisões precisas e técnicas sejam proferidas em tempo recorde quando comparadas às da Justiça Estatal.

No intuito de dar efetividade à escolha da arbitragem nos contratos de concessão, verifica-se, pela leitura do art.15 da MP, que a relicitação dos contratos de parceria ficará condicionada à celebração de termo aditivo, no qual será incluído compromisso arbitral entre as partes prevendo a submissão do litígio à arbitragem.

Sob essa perspectiva, válido destacar a utilização do termo "compromisso arbitral", ao invés de "cláusula compromissória". Como se sabe, a "cláusula compromissória" seria a convenção por meio da qual as partes se comprometem à submeter eventuais litígios futuros derivados de um contrato específico à este tipo de procedimento. Compromisso arbitral, por outro lado, se refere a um litígio determinado, já ocorrido, atual. Pela análise do texto, entende-se que ocorreu uma falha técnica pelo legislador, já que o termo correto seria cláusula compromissória ou a palavra mais ampla, "convenção de arbitragem", conforme esclarece o art. 3º da lei de arbitragem brasileira.

Ademais, depreende-se da leitura do caput do art. 25 da referida MP uma possível violação ao princípio do livre acesso ao Poder Judiciário, previsto no art. 5.º, XXXV da CF, haja vista que litígios oriundos deste tipo de contrato somente poderiam ser objeto de um procedimento arbitral se já houvesse ocorrido decisão definitiva da autoridade competente em âmbito administrativo.

Não obstante, o texto acertou ao trazer, de modo explícito, quais seriam os conflitos passíveis de serem resolvidos por este método. Válido destacar que apenas direitos patrimoniais disponíveis seriam arbitráveis, como determina o art. 1º da lei 9.307/96. Seguindo este entendimento, o art. 25, §4º da MP 752/16 esclarece que

(i) as questões relacionadas à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos;

(ii) o cálculo de indenizações decorrentes de extinção ou de transferência do contrato de concessão e

(iii) o inadimplemento de obrigações contratuais por qualquer das partes seriam arbitráveis para fins daquela norma.

Ainda que a MP 752/16 tenha sido alvo de críticas por parte das operadoras privadas de aeroportos e pelas concessionárias de rodovias – que esperavam maiores benefícios por parte do governo, por conta da grave crise econômica que assola o país –, possível concluir que a preferência na escolha da arbitragem como meio de solução de parte dos litígios garante maior segurança jurídica ao setor em análise e possibilita melhores decisões por conta da especialidade dos árbitros.

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*Marcello Vieira de Mello é sócio fundador do escritório GVM - Guimarães & Vieira de Mello Advogados.


 




*Aécio Filipe Coelho Fraga de Oliveira é advogado da área de Contencioso, Arbitragem & French Desk do BMA e Secretário Geral da associação francesa São Paulo Accueil. Especializado em contencioso estratégico/arbitragem doméstica e internacional. Possui experiência em arbitragens comerciais nacionais e internacionais, defendendo os interesses de clientes em litígios que envolvem questões societárias, de mineração e telecomunicação perante instituições internacionais, como a CCI, AAA e todas as principais instituições brasileiras de arbitragem, inclusive a CAM/CCBC, a CAMARB, e a FGV. 



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