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Projeto de Lei pretende proibir rescisória por violação legal na Justiça

Três deputados do PT (Maurício Rands/PE, Vicentinho/SP e Dra. Clair/PR) apresentaram no dia 24/06/03 projeto de lei (n. 1307/2003) visando proibir ações rescisórias, na Justiça do Trabalho, por violação legal, através da seguinte e nova redação ao artigo 836 da CLT.

20/7/2003

 

Projeto de Lei pretende proibir rescisória por violação legal na Justiça do Trabalho

 

Mário Gonçalves Júnior*

 

Três deputados do PT (Maurício Rands/PE, Vicentinho/SP e Dra. Clair/PR) apresentaram no dia 24/06/03 projeto de lei (n. 1307/2003) visando proibir ações rescisórias, na Justiça do Trabalho, por violação legal, através da seguinte e nova redação ao artigo 836 da CLT:

“É vedado aos órgãos da Justiça do Trabalho conhecer de questões já decididas, excetuados os casos expressamente previstos neste título e a ação rescisória, que será admitida na forma do disposto no Capítulo IV do Título IX da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil – nas hipóteses previstas nos incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII e IX do art. 485, dispensado o depósito referido nos arts. 488, inciso II, e 494 daquele diploma legal”.

Na justificativa no referido projeto de lei, os deputados petistas lembram que outrora a ação rescisória já foi considerada incabível no processo trabalhista pelo prejulgado n. 10 do Tribunal Superior do Trabalho e que a supressão seria aconselhável “a fim de ser removido obstáculo a necessária rapidez na solução dos conflitos decorrentes da execução do contrasto individual do trabalho; rapidez seriamente comprometida, porque o prazo de ajuizamento de ação rescisória é de 2 anos, contados do trânsito em julgado da decisão de mérito”.

 

Ainda segundo os mentores do PL 1307/03, “existem no processo do trabalho meios adequados e rápidos ao guerreio das sentenças e dos acórdãos proferidos pelas varas e tribunais regionais do trabalho que violarem literal disposição de lei ou afrontarem direta e literalmente dispositivo da Constituição Federal”, tais como os recursos ordinários (art. 895, CLT) e o de revista (art. 896, CLT), e que as ações rescisórias muitas vezes vêem sendo ajuizadas como mais um sucedâneo de recurso.

 

Duvidamos muito que algum processualista de escol avalize sinceramente uma alteração legislativa absurda como esta.

 

O dilema celeridade processual “versus” justeza das decisões não é novo. Cândido Rangel Dinamarco lembra que se fala “no binômio custo-duração como o eixo em torno do qual gravitam todos os males da justiça contemporânea (Vincenzo Vigoritti) e com toda a autoridade já foi dito que, em sugestiva imagem, que o tempo é um inimigo do direito, contra o qual o juiz deve travar uma guerra sem tréguas (Carnelutti)” (A Reforma do Código de Processo Civil, Malheiros, 3a. ed., São Paulo, 1996, pág. 140).

 

A melhor doutrina processual, entretanto, pugna pelo equilíbrio desses dois objetivos, e não o aniquilamento de um pelo outro, como obviamente seria o “efeito colateral” do PL, caso viesse a resultar efetivamente em lei.

 

O Juiz Francisco Antonio de Oliveira, ex-Presidente do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, em vários de seus julgados consignou que “o princípio da celeridade deve conviver de forma harmônica com o princípio do contraditório e do devido processo legal”, por vezes lembrando Carlos Maximiliano, para quem “o juiz que julga ouvindo somente uma das partes, poderá até fazer justiça, mas jamais será um juiz justo”.

 

Como se vê, do ponto de vista hipotético jamais se pode partir da presunção de que toda e qualquer sentença, só pelo fato de ser sentença, presuma-se de acordo com a lei. A possibilidade de sentenças ilegais não pode ser ignorada pelo sistema jurídico, mesmo que, mesmo que para esse mesmo objetivo várias espécies de recursos sejam especificamente destinados, como são os casos dos recursos de revista e de embargos à Seção Especializada do TST.SBDI.

 

Tanto é assim que várias ações rescisórias são julgadas procedentes pela própria Justiça do Trabalho, muitas delas justamente por se reconhecer que a última decisão de mérito viola a lei e/ou a Constituição Federal.

 

O pretexto, puro e simples, da celeridade não supera, no particular, a necessidade de justiça. Certamente causa mais prejuízos à sociedade decisões judiciais céleres e aberrantes do que outras tardias porém corretas. O ideal, é claro, é dotar o sistema de instrumentos para que o binômio seja celeridade-justiça. Suprimir a hipótese de ação rescisória por violação de lei ou norma constitucional é “trocar uma perna pela outra”; o ordenamento continuaria “manco”.

 

Do contrário, ter-se-ia que presumir a infalibilidade dos juízes (do trabalho), ou, pior ainda, tolerar sentenças ilegais só porque transitaram em julgado.

 

De qualquer modo, é a própria lei que não considera a ação rescisória um “obstáculo” à execução de decisões de mérito. O artigo 489 do CPC é literal ao dispor que “a ação rescisória não suspende a execução da sentença rescindenda”. É verdade que, mediante ações cautelares (incidentais à rescisórias), caso a caso os Tribunais refletem sobre a necessidade de se conceder liminares suspensivas, mas estas são implementadas somente quando se considera que sentenças possam mesmo estar eivadas de ilegalidade (“fumaça” ou “aparência de bom direito”).

 

O projeto de lei terá ainda uma longa tramitação no Congresso Nacional. Tomara sucumba logo, para o bem do Direito Processual.

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* Advogado do escritório Demarest e Almeida Advogados

 

 

 

 

 

 

 

 

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