Miragem jurídica
Raquel Cavalcanti Ramos Machado*
Trata-se de uma miragem jurídica, precisamente de um protocolo imaginário do TRF da 5ª Região. Explica-se: o advogado dirige-se a tempo e diligentemente a referido protocolo, encaminha a petição de recurso especial, mas após é surpreendido com a notícia de que tal petição foi interposta fora do prazo. E por quê? Sob a alegação de que a petição teria sido interposta no protocolo errado, de que àquele tempo deveria ter sido encaminhada ao protocolo da sede do TRF em Recife. Para tanto, é invocada decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) na qual este tribunal afirma não ser cabível a interposição de petições dirigidas ao STJ nos protocolos integrados dos TRF’s.
Essa fundamentação, do ponto de vista processual, é claramente descabida, pois como sabem mesmo os mais novatos operadores do Direito, cabe ao Tribunal Regional o exame de admissibilidade de referidos recursos. Assim, não se pode pretender que o advogado dirija-os diretamente ao STJ. Deve, portanto, protocolá-los perante o Tribunal Regional. O que não se pode protocolar no protocolo integrado é, por exemplo, uma petição dirigida diretamente ao STJ, sem que seja necessário qualquer exame de admissibilidade pelo TRF. Desse modo, e como foi criado um protocolo integrado do Tribunal Regional em cada Estado, é evidente que o recurso especial protocolado nos mesmos, ainda que no último dia, deve ser considerado tempestivo. A não ser assim, é de se admitir que tais protocolos não têm utilidade, ou são, como se disse, uma miragem.
Num momento em que o Poder Judiciário busca agilizar seus serviços e está a admitir até mesmo a prática de muitos atos processuais através da Internet, é lamentável um retrocesso no sentido de pretender que o advogado que não mora na mesma localidade do Tribunal Regional tenha de dispor de mecanismos mais demorados para praticar ato que poderia ser feito com muito mais agilidade em sua própria cidade.
O problema mais grave, porém, não é esse, mas sim o da violação à segurança jurídica, à boa-fé, à confiança e à razoabilidade, apenas para enumerar alguns princípios constitucionais desrespeitados por esse entendimento.
Realmente, no caso, há muito tempo os advogados estão acostumados a “dar entrada” de recurso especial no protocolo integrado do TRF, tendo sido sempre tal prática aceita como válida. O novo entendimento foi imposto sem que nenhum aviso expresso ou mesmo uma norma interna em sentido contrário tenham sido publicados. Pode-se afirmar que muitos foram pegos de surpresa, o que trouxe uma incerteza diametralmente contrária ao fim a ser promovido pelo Direito.
Entre crer que tal situação está sendo causada justamente por quem deveria fazer valer o Direito, e de que o protocolo integrado perdeu sua principal função, ou crer que os advogados apenas se enganaram com uma miragem, talvez seja mais saudável à Justiça a última opção. O problema é que o dito protocolo é bem palpável; então, por mais triste que seja admitir, no caso, talvez a miragem esteja mesmo na promoção da Justiça.
É de se esperar, porém, que assim como ocorreu quando o STF e o STJ declararam descabido o irrazoável entendimento segundo o qual o recurso interposto antes da publicação da decisão recorrida seria “intempestivo”, também seja por fim declarada a invalidade do entendimento em questão, e a Justiça se realize.
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* Advogada em Fortaleza/CE, Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET e da Comissão de Estudos Tributários da OAB/CE
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