O seguro de vida e a perpetuação do contrato no tempo
Eduardo Vieira de Carvalho Neto*
Acontece que o ordenamento jurídico brasileiro permite que Companhia de Seguros não renove o seguro de vida quando do término da sua vigência, normalmente, anual. Esta permissão está prevista no artigo 760 do Código Civil de 2002 (clique aqui), que determina que a apólice de seguro mencione o início e o fim de sua validade.
Na esfera administrativa, a SUSEP - Superintendência de Seguros Privados, através da circular 302/2005 (clique aqui), também permite o cancelamento ou não renovação da apólice de seguro de vida pela Companhia de Seguros, mediante comunicação prévia ao segurado, ou seja, mesmo que o segurado tenha contratado uma apólice de seguro de vida em grupo há mais de uma década, tendo ela sido regularmente renovada anualmente pela Companhia de Seguros, pode num determinado momento deixar de ser renovada quando do término de sua vigência, desde que a seguradora avise previamente o segurado, respeitando o prazo previsto na apólice.
O seguro de vida tem um propósito nobre, o de garantir renda ao segurado ou sua família, por certo período de tempo, após a sua invalidez ou morte e, via de regra, é contratada enquanto o segurado ainda é jovem, tem saúde e sabe que vai arcar com o pagamento do prêmio por muitas décadas. A Companhia de Seguros, por outro lado, pode receber o prêmio por décadas, enquanto o risco do sinistro é pequeno, e desistir da sua manutenção quando o segurado apresentar idade avançada e o risco do sinistro se tornar maior.
Causa espanto que injustiças como esta ainda sejam permitidas pela legislação brasileira, conforme demonstrado e, consequentemente, que acarretem flagrante prejuízo aos segurados e a sociedade. O segurado, diante da lei, não tem nenhuma garantia de que seu seguro de vida em grupo será para a vida toda, já que este pode ser renovado por anos a fio e, quando o risco se tornar mais gravoso para a Companhia de Seguros, ela poderá, legalmente, não renovar o contrato em proteção exclusiva aos seus ganhos e lucros.
Em caso análogo, para evitar que injustiças como esta aconteçam, a lei 9.656/98 (clique aqui), dos planos de saúde privados, em seu artigo 13 impôs a renovação automática da apólice a partir do vencimento do prazo inicial de vigência e vedou a rescisão unilateral do contrato pela operadora, salvo por fraude ou não pagamento do prêmio por mais de sessenta dias. Este dispositivo legal suprimiu qualquer possibilidade da operadora de plano de saúde cancelar, ou não renovar o plano ou seguro saúde, garantindo ao segurado uma segurança inédita por força de um contrato que, ele cumprindo suas obrigações, tem caráter vitalício.
O exemplo da lei 9.656/98 é uma solução viável para o contrato de seguro de vida em grupo. Basta para isso o nosso Congresso editar lei que altere o Código Civil, para incluir um artigo que proteja o segurado, nos mesmos moldes do artigo 13 de lei 9.656/98.
A inclusão de tal artigo visaria proteger o segurado de eventuais interesses exclusivamente econômicos da Companhia de Seguros, já que ele teria garantida sua permanência entre os segurados da empresa. Vale lembrar que as apólices de seguro de vida em grupo quando não renovadas expressamente ou renovadas fora das especificações do contrato, por mais de uma vez, passam a ter vigência por prazo indeterminado, de acordo com o disposto no artigo 774 do Código Civil de 2002.
Essa realidade jurídica traz para o contrato outra realidade quanto a possibilidade da sua não renovação unilateral por parte da Companhia de Seguros.
Nestes casos, a regra do artigo 760 deve ser aplicada junto com a regra dos artigos 421 e 801, §2º do Código Civil de 2002, que tratam, respectivamente, da função social do contrato e do quorum mínimo de segurados que expressamente tem que concordar com a alteração da apólice de seguro, o que impede que a Companhia de Seguros cancele a apólice quando no seu aniversário.
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*Advogado do escritório Penteado Mendonça Advocacia
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