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Mudança na práxis e o fim da crise das Medidas Provisórias

Sempre que algo começa a se apresentar como um problema em nossa legislação, a primeira coisa que se faz – às vezes até de forma impensada e automática – é propor-se uma mudança legislativa.

2/5/2005

Mudança na práxis e o fim da crise das Medidas Provisórias


Alcimor Aguiar Rocha Neto*

Sempre que algo começa a se apresentar como um problema em nossa legislação, a primeira coisa que se faz – às vezes até de forma impensada e automática – é propor-se uma mudança legislativa.

Em alguns casos de fato é o mais acertado a ser feito, porém, em muitos outros a mudança apenas no modo como se lhe dá, e a forma como se aplica uma lei é o problema maior. Somos conhecidos por termos uma legislação muito boa na maior parte dos casos mas não sabemos fazer com que seja cumprida.

Com as Medidas Provisórias não tem sido diferente. É necessário e legítimo que se ponha a disposição do Presidente da República um instrumento que lhe permita atacar problemas urgentes com uma medida que não possa esperar o tempo que demanda a discussão e tramitação de qualquer matéria pelo processo legislativo ordinário.

O trâmite de projetos de lei no Congresso Nacional é tormentoso, atribulado e demorado. Mesmo que haja um requerimento de urgência em um projeto de iniciativa do Executivo, em alguns casos não se mostra eficaz o suficiente para atender a demandas que realmente requerem uma urgência ainda maior.

É o Poder Executivo que se encontra mais próximo dos problemas apresentados pela sociedade. É este poder o encarregado de pôr em prática, ações que atingem de forma mais direta a sociedade. Daí sua legitimidade em lançar mão de instrumentos desta natureza.

A Constituição mesma prevê de forma clara os casos, ocasiões e circunstâncias nas quais se pode fazer uso das Medidas Provisórias. Em havendo relevância e urgência e em se tratando das matérias arroladas no art. 62 de nossa Carta Política, “o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”.

Ocorre, que o que se estar a assistir é a usurpação por parte do Poder Executivo das prerrogativas do Poder Legislativo. Usurpação esta que se consuma no momento em que se edita uma medida provisória sem que esta atenda aos pressupostos constitucionais. Não só se usurpa função privativa do Congresso Nacional como se relega à insignificância nossa Lei Maior. Portanto ao não se atender com uma medida provisória os pressupostos da urgência e relevância, a MP é duplamente inconstitucional. Primeiro e, justamente, porque desobedece tal dispositivo. Segundo porque não respeita um princípio basilar do Direito Constitucional petrificado por nossa Carta Magna, qual seja, o da separação e harmonia entre os Três Poderes. Deixaremos de citar os caso em que uma MP é aprovada mesmo sendo triplamente, ou até por quatro motivos, inconstitucional.

O dispositivo constitucional, em si, que regula as Medidas Provisórias não é falho. O é o modo como é tratado este instituto pelo Chefe do Executivo. Se fosse respeitado o art. 62 da Constituição, os congressistas calculam que entre 70% e 90% das MP's editadas neste ano, por exemplo, eram inconstitucionais por não atenderem, no mínimo, os pressupostos da relevância e urgência.

Note-se, portanto, que uma simples mudança, baseada no mínimo bom senso e sensibilidade que se exige do mais importante magistrado do país, na práxis, resolveria de uma vez por todas o impasse.

Um eminente e muito respeitado jurista, tem sustentado, há já um bom tempo, que a relevância e a urgência seriam “políticas”, ou seja, caberia ao presidente livremente apreciar o que seria ou não relevante e urgente, levando em conta apenas circunstâncias políticas-temporais, como a conveniência de se editar uma medida provisória, nem relevante nem urgente para a sociedade, mas de cuja não adoção resultasse prejuízo político para o Presidente da República. Discutível.

A mente formuladora de tal tese compõe hoje o quadro dos membros de nossa mais alta corte, sendo um dos onze responsáveis de guardar nossa Constituição Política.

Sabendo que não está arraigado na mente de nossa classe governista – mesmo por motivos histórico-culturais – a idéia do respeito absoluto à legalidade, poder-se-ia propor uma simples modificação na legislação apenas para garantir – ou tentar garantir – um maior respeito à Lei Magna. O estabelecimento de um limite de no máximo cinco Medidas Provisórias em trâmite nas duas Casas do Congresso, resolveria definitivamente o problema. É que se assim se proceder não se deixa margem alguma a interpretações subjetivas e ambíguas em demasia. Qualquer margem de discricionariedade que se dá na tomada de decisões tende a ter o limite desrespeitado pelo simples fato de não existir um limite objetivo.
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*Bacharelando em Direito na Universidade de Fortaleza – UNIFOR





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