Ministro Marco Aurélio defende o fim da aposentadoria por idade
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Da Redação
sexta-feira, 17 de outubro de 2008
Atualizado às 08:54
Idade
Ministro Marco Aurélio defende o fim da aposentadoria por idade durante homenagem a ministros
O fim da aposentadoria compulsória por idade (hoje aos 70 anos, no serviço público) foi defendido, ontem, 16/10, pelo ministro Marco Aurélio, durante solenidade em homenagem aos ministros Olavo Bilac Pinto e Raphael de Barros Monteiro. O centenário de nascimento de ambos, nascidos em 1908 e falecidos, respectivamente, em 1985 e 1974, foi lembrado pelo Plenário do STF.
Escolhido para fazer o discurso em homenagem a Bilac Pinto, o ministro Marco Aurélio qualificou a aposentadoria compulsória daquele magistrado, aos 70 anos, em 8 de fevereiro de 1978, como "castigo da aposentadoria compulsória, cujas balizas hão de ser revistas em prol do interesse nacional".
"É chegada a hora de ter-se presente não o critério da idade cronológica para definir a velhice, mas, como proclamado pela Organização Mundial de Saúde, a funcional, medida com base na autonomia da pessoa, na aptidão para realizar tarefas rotineiras", afirmou o ministro, na presença, entre outros, de familiares dos dois ministros, ministros aposentados, representantes a OAB e do MP.
"À luz desse novo entendimento, devem-se repensar preceitos constitucionais que arbitrariamente imprimem limite não biológico à capacidade produtiva de um ser humano, que restringem o exercício livre do universal direito ao trabalho", continuou. "A aposentadoria há de representar uma recompensa, nunca um castigo, para quem, pelo tanto que se dedicou à causa pública (como Bilac Pinto), merece ao menos ser considerado digno e apto a concluir, por si mesmo, já ter cumprido a própria jornada".
Legados
Em seu pronunciamento, Marco Aurélio mencionou alguns legados deixados pelo ministro Bilac Pinto, tanto como ministro do STF (de 1970 a 1978), quanto como deputado federal (durante 15 anos). Comerciário, bancário, escrivão de delegacia de polícia, estudante, advogado, professor universitário, deputado, Secretário de Estado (em Minas Gerais, seu estado natal), líder e presidente de partido (a extinta UDN), presidente da Câmara dos Deputados, jurista, estadista e, por fim, ministro do STF e do TSE, foram teses contidas em acórdãos de que ele foi relator que deram origem a boa parte das súmulas editadas pelo STF, na época. Marco Aurélio citou, entre elas, as de número 559, 560, 561, 569, 571, 574, 576, 577, 579, 582, 588, 590, 591, 592 e 595.
De sua carreira política, o ministro Marco Aurélio mencionou a participação de Bilac Pinto na redação do Manifesto dos Mineiros, em 1943, que clamou por abertura democrática durante a ditadura Vargas, atitude punida com a aposentadoria como professor da Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, cargo que conquistara em concurso público e que reassumiu com a redemocratização do país, em 1945.
O ministro citou, também, a dedicação do então deputado às causas de liberdade e da probidade administrativa. Neste campo, como lembrou Marco Aurélio, Bilac Pinto logrou, entre outros, a aprovação da Lei nº 3.502/1958, regulando o seqüestro e o perdimento de bens nos casos de enriquecimento ilícito, por influência ou abuso de cargo ou função pública, também conhecida como Lei Bilac Pinto.
Igualmente de projeto de sua autoria se originou a Lei 4.319/64, (clique aqui) que criou o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. Bilac Pinto foi autor, também, de emenda substitutivo a projeto de lei complementar à CF transformado na Lei 4.717/65 (clique aqui), que instituiu a ação popular.
Monopólio estatal
O ministro Marco Aurélio lembrou igualmente que foi graças a um substitutivo de Bilac Pinto à Mensagem nº 469, encaminhada pelo governo Vargas ao Congresso Nacional para criação da Petrobrás e do Fundo Rodoviário Nacional, que foi instituído o monopólio estatal do petróleo. Conforme lembrou o ministro, o governo havia proposto um sistema misto, combatido por Bilac Pinto, cuja tese acabou prevalecendo no Congresso e resultou na Lei nº 2.004, de 3 de outubro de 1953 (clique aqui), sancionado pelo presidente Getúlio Vargas, que criou a Petrobrás.
Barros Monteiro
Coube ao vice-presidente do STF, ministro Cezar Peluso, fazer o discurso em homenagem ao ministro Raphael de Barros Monteiro, paulista de Areias que integrou a Corte Suprema no período de 1967 a 1974. Lembrando que ele era oriundo de uma tradicional família de juízes, Peluso disse que seu pai e um irmão - Washington de Barros Monteiro - assim como ele próprio, foram desembargadores do TJ/SP, dois filhos foram desembargadores do TJ/SP e o mais velho deles, Raphael de Barros Monteiro Filho, aposentou-se recentemente como ministro do STJ, de que foi presidente.
Peluso lembrou que Barros Monteiro foi juiz por vocação, e ele próprio estava consciente disso. Tanto que, quando deixou o TJ/SP, disse, na solenidade de despedida: "Jean-Paul Sartre, numa frase amarga, disse que não se escolhe a vocação: acerta-se ou malogra-se, eis tudo. Não é verdade. Posso assegurar que fui, sou e serei juiz por vocação. Só essa me fez permanecer na função judicante até hoje, e somente ela far-me-á nela permanecer até que a Providência ainda me dê forças para tanto".
Formado em 1930 pela Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, Barros Monteiro passou em concurso público para funcionários dos Correios e Telégrados do estado, iniciou sua carreira de advogado e, em 1935, passou em concurso para juiz. Em 1949, passou a integrar o TJ/SP como desembargador, exercendo, ao mesmo tempo, o cargo de professor de Direito Judicial Civil na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Presidiu o TJ/SP no período de 1966 e 1967 e integrou, também, o TRE/SP), cuja presidência exerceu em de 1961 a 1963.
Além de ser membro do STF, Barros Monteiro integrou, também, o TSE, do qual foi presidente de fevereiro a novembro de 1973
Peluso lembrou que o ministro Barros Monteiro se preocupava com a pouca divulgação das atividades do Judiciário, temendo que, por isso, viesse a se tornar quase desconhecido como um dos Poderes do Estado. Por isso, ao presidir a instalação do Ano Judiciário de 1967, no TJ/SP, afirmou: "Já é tempo de divulgar nos setores populares que o nosso governo é tripartido de que os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário estão no mesmo plano constitucional, cada um na sua esfera de ação, desempenhando suas atribuições peculiares, todos três delegados em exercício da soberania do povo paulista".
PGR e OAB
Após os discursos dos ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso, foi a vez de o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, e o presidente do Conselho Federal da OAB, Cezar Britto, prestarem suas homenagens.
Antonio Fernando afirmou que, para além da formalidade, a homenagem aos dois ministros é "substancialmente justa". Segundo ele, Bilac Pinto e Barros Monteiro marcaram suas passagens no Supremo "com o brilho destacado de suas inteligências e dedicação à Justiça".
O procurador-geral lembrou a biografia destacada de Bilac, especialmente na área do direito público, e sua intensa participação na vida política brasileira. Quanto à Barros Monteiro, ele ressaltou como a vida do ministro foi voltada à realização da Justiça. Outros juristas afirmavam que Barros Monteiro foi "magistrado da verdade e do Direito".
O presidente do Conselho Federal da OAB rememorou que tanto Bilac Pinto quanto Barros Monteiro tiveram na advocacia o ponto de partida para suas carreiras.
Quanto a Bilac, Britto afirmou que o ministro pontificou "não apenas o direito, mas a política nacional". Bilac sempre rechaçou de forma contundente a ditadura de Getúlio Vargas, chegou a ser destituído de suas cátedras por isso e contribuiu de forma efetiva para o processo de redemocratização do país, em 1945. Apoiador incondicional de projetos nacionalistas, mesmo sendo oposição a Vargas foi "voz decisiva para a campanha do petróleo é nosso".
Britto definiu Barros Monteiro como um "trabalhador do direito, ao qual serviu com generosidade e talento". O presidente da OAB ressaltou o período em que o ministro presidiu a associação de magistrados de São Paulo, ocasião em que deixou claro que o magistrado não poderia ficar alheio à sociedade.
Cezar Britto também anunciou que no dia 16 de janeiro a OAB realizará evento para discutir a aposentadoria compulsória dos ministros Evandro Lins e Silva, Hermes Lima e Victor Nunes Leal. Os três foram aposentados no dia 16 de janeiro de 1969 pelo regime militar, com base no Ato Institucional 5.
"Que a história nos ensine nesse episódio que a democracia é o melhor dos regimes. Que a ditadura que não respeita o Judiciário jamais possa voltar e que o dia 16 de janeiro seja lembrado como a data de resistência para todos nós", disse Britto.
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Clique aqui e confira a íntegra do discurso do ministro Marco Aurélio.
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Clique aqui e confira a íntegra do discurso do ministro Cezar Peluso.
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