Lei seca - Advogado obtém no TJ/SP o direito de evitar bafômetro
Duas liminares concedidas nesta semana pela Justiça questionam a recente lei 11.705, também conhecida como lei seca.
Da Redação
sexta-feira, 11 de julho de 2008
Atualizado às 08:34
Lei seca
Duas liminares concedidas nesta semana pela Justiça questionam a recente lei 11.705 (clique aqui). Em SP, o advogado e empresário Percival Maricato obteve o direito de não fazer o teste do bafômetro. Em Brasília, uma juíza desconsiderou o exame clínico para atestar embriaguez.
Liminares
O advogado Percival Maricato, dirigente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes, conseguiu na Justiça de São Paulo o direito de não se submeter a testes do bafômetro.
Na liminar, o desembargador Márcio Franklin Nogueira garante ao autor da ação o direito de não se submeter ao bafômetro tampouco ser penalizado por isso. Ele lembra que "ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo" (v. abaixo a decisão na íntegra). E argumenta ainda que a lei pune da mesma forma o motorista embriagado e aquele que bebeu apenas uma pequena dose, com o perfeito domínio de seus reflexos.
Maricato quer atrair a atenção para o que chama de "excessos da lei seca no trânsito" e incentivar outras pessoas a comprarem essa briga na Justiça.
Em Brasília, um jornalista se envolveu em um acidente e a sua suposta embriaguez foi constatada por exame clínico. A desembargadora Sandra de Santis, da 1ª Turma Criminal do TJ/DF, entendeu que o exame visual não poderia ser usado como prova.
Marcar posição
"Eu quero provocar uma discussão na sociedade porque eu tenho certeza que, aos poucos, a opinião pública, a mídia, as pessoas vão perceber que está havendo um excesso e que os excessos, os desequilíbrios não são bons para uma democracia", diz Percival Maricato.
O representante da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego - Abramet criticou a liminar. "Está se partindo de uma premissa que existe uma dose segura. Se existe essa dose segura para todo mundo, que ela seja comprovada cientificamente", afirma Fábio Racy, diretor de relações institucionais da Abramet.
Decisão do des. Márcio Franklin Nogueira, de SP
A R. decisão de fls. 42/44: trata-se de HC preventivo, objetivando-se que o paciente não seja obstado em seu direito de ir e vir, não sendo obrigado a submeter-se ao chamado bafômetro, nem tampouco penalizado por tal negativa. Não há, na questão posta nos autos, conteúdo penal.
Centra-se o remédio heróico na liberdade de ir e vir, bem assim em penalidades administrativas. Dentre as autoridades apontadas como, coatoras, aparece o Secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo. Daí a competência da seção de direito público do Tribunal de Justiça de São Paulo.
A Lei 11.705, de 19/06/08, alterando diversos dispositivos do CTB (Lei n.º 9503/97), depois de dar nova redação ao seu art. 165 (dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência), punindo tal conduta com multa e determine dependência), punindo tal conduta multa e suspensão do direito de dirigir por doze meses, de dar nova redação ao art. 276 (qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades previstas no art. 165 deste Código), determina, no artigo 277, § 3.º: "Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo."
Em outras palavras, se houver recusa do condutor em submeter-se ao teste do bafômetro, estará sujeito a multa de R$955,00, a suspensão desde logo, do direito de dirigir por doze meses, e retenção do veiculo. Ocorre, no entanto, que a CF consagra princípio segundo o qual ninguém pode ser obrigado a fazer prova contra si mesmo.
Discorrendo sobre o mesmo, verdadeiro complemento dos princípios do devido processo legal e da ampla defesa, Antonio Magalhães Gomes Filho, citado por Alexandre de Moraes, afirma que, o direito a não incriminação constitui uma barreira instransponível ao direito à prova de acusação; sua denegação, sob qualquer disfarce, representará um indesejável retorno às formas mais abomináveis da repressão, comprometendo o caráter ético-político do processo e a própria correção no exercício da função jurisdicional (Constituição do Brasil interpretada, ed. Atlas, p. 400). Ora, não se pode punir alguém, ainda que administrativamente, pelo fato de exercitar direito constitucionalmente assegurado.
De fato, se a Constituição Federal assegura o direito de não fazer prova contra si mesmo, não se há de punir alguém que exercita tal direito. A regra em questão, numa analisa perfunctória, própria da cognição sumária que cerca essa fase processual, se reveste de inconstitucionalidade. Mas não é só. É preciso que se lembre do princípio da proporcionalidade ou da proibição de excesso, que a doutrina, de forma unânime, considera consagrado na Constituição Federal.
Outrossim, expressões do princípio da proibição de excesso (tomado, neste passo, como limitador do poder normativo do Estado) são princípios de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Porque o próprio princípio da proibição pode ter tido como de proporcionalidade em sentido amplo. O princípio de adequação exige que toda e qualquer punição, seja ela de caráter penal, seja de caráter administrativo, apenas possa ser aquela apta para a tutela do bem jurídico e que a medida adotada seja também adequada à finalidade perseguida.
O princípio da necessidade, por sua vez, estabelece que as punições somente sejam aplicadas quando necessárias. Por último, o princípio da proporcionalidade em sentido estrito obriga a ponderar a gravidade da conduta, o objeto da tutela, e a conseqüência jurídica. O princípio dirige-se tanto ao legislador, quando da elaboração da norma, como a juiz no momento de impor a sanção.
Ora, não se podem dizer adequadas, necessárias e proporcionais aquelas penalidades em relação ao motorista que seja surpreendido com qualquer concentração de álcool por litro de sangue (art. 276, caput). Estarão sujeitos, a mesma pena, nos termos da legislação em causa, tanto os motoristas que forem surpreendidos dirigindo completamente embriagados, como aqueles que tiverem ingerido pequena dose, com o perfeito domínio de seus reflexos, sem representar qualquer perigo ao trânsito.
Não se está a negar a necessidade de severa punição aos motoristas que dirigem embriagados. Mas daí a punir, também com severidade, quem dirige após ingerir um copo de cerveja, ou um copo de vinho, exemplificativamente, vai uma larga distância.
Os jornais, as rádios e os canais de televisão têm mostrado os absurdos que estão sendo cometidos, com a detenção de motoristas que, embora com alguma concentração de álcool por litro de sangue, não se podem dizer embriagados. Esse fato, por si só, caracteriza o justo receio que acomete o impetrante, e justifica a concessão da liminar.
Por tais razões, concedo, liminarmente, ordem de salvo conduto ao paciente para que, caso se negue a submeter-se ao bafômetro em diligência policial, não seja obrigado, por esse fato, a comparecer a repartição policial, não seja lavrada multa, não lhe seja imposta penalidade administrativa de suspensão do direito de dirigir, e não seja apreendido o seu veículo. Notifiquem-se as autoridades coatoras. Com as informações ou vencido o prazo de apresentação, à Douta Procuradoria da Justiça, para manifestação. Expeça-se Salvo Conduto. Intimar.
São Paulo, 8/7/08.
MÁRCIO FRANKLIN NOGUEIRA
Desembargador-Relator
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