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OAB/SE derruba no CNJ resolução "autoritária" do TJ/SE

Da Redação

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Atualizado às 09:31


OAB/SE

Derrubada no CNJ resolução 'autoritária' do TJ/SE

O presidente da Seccional da OAB de Sergipe, Henri Clay Andrade, conseguiu ontem derrubar no CNJ a resolução "autoritária" do Tribunal de Justiça do Estado, que modificava o horário de funcionamento do Fórum Gumersindo Bessa, em Aracaju, e mantinha restrições no horário de atendimento à população e a advogados.

A liminar foi concedida pelo conselheiro Joaquim Falcão, entendendo que a resolução afetaria não só juízes e funcionários, mas a toda a sociedade, e, conforme alegou a OAB/SE no procedimento de controle administrativo, prejudicaria o andamento processual no Estado.

Segundo a decisão do conselheiro do CNJ, não é possível adaptar toda uma rede de serviços jurídicos em um mês, sem que se implique em grandes riscos para os advogados, promotores e cidadãos. "Contratos profissionais advocatícios estão em curso, lotação de servidores públicos, rotinas estabelecidas para atender aos interesses dos usuários pelos advogados, procuradores e defensores, enfim, uma teia de relações sociais e jurídicas é afetada sem que seus integrantes tenham sido pelo menos consultados", afirmou Joaquim Falcão, lembrando que mudanças nos horários de atendimento em Fóruns normalmente se dão no início do ano fiscal. Isso acontece, segundo explicou, para que se permita às instituições envolvidas adaptarem orçamentos, avaliarem o impacto em seus quadros de pessoal e testarem procedimentos.

Ainda conforme a decisão do conselheiro do CNJ, até que se prove o contrário, não existe a urgência alegada pelo Tribunal de Justiça (30 dias) para a implantação da mudança no horário de funcionamento do Fórum. "A justiça é bem de primeira necessidade. Sua administração não deve correr riscos evitáveis pois o resultado é a insegurança", afirmou, no texto da liminar. Joaquim Falcão ressaltou, ainda, que advogados, o Ministério Público e a Defensoria Pública são "essenciais e indispensáveis à administração da justiça" e "por isso têm o direito de pelo menos se manifestar a respeito de mudanças nos horários de expediente forense, mesmo que ao tribunal compita o poder, privativamente, de tal decisão".

A resolução do TJ sergipano - agora cassada liminarmente - previa que, a partir de primeiro de agosto, o horário de funcionamento do Fórum Gumersindo Bessa seria das 7h às 13h e dos fóruns do interior das 8h às 14h. Os Juizados Especiais e o Tribunal de Justiça também funcionariam no turno matutino. Antes de ingressar com representação no CNJ, Henri Clay tentou convencer o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Artêmio Barreto, a revogar a resolução, mas não obteve êxito. A mudança de horário de funcionamento do Fórum Gumersindo Bessa quebraria uma tradição de mais de 50 anos e causaria dificuldades insuperáveis de trabalho aos promotores de justiça e aos advogados, segundo o presidente da OAB sergipana.

  • Abaixo a íntegra da decisão, em medida liminar, no procedimento de controle administrativo nº 2007.10.00.000798-6, proferida pelo conselheiro Joaquim Falcão.

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Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo em que o Requerente, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional de Sergipe, se insurge contra a Resolução 24/2007, expedida pelo Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, em que se determina novos horários de expediente forense a partir de 1° de agosto de 2007, conforme:

a) das 7h às 13h na comarca de Aracaju;

b) das 8h às 14h nas comarcas do interior.

Alega o requerente, em suma, que o expediente a ser implantado agravará problemas já existentes no TJSE, além de causar novos, quais sejam:

1) falta de eficiência na prestação jurisdicional, com o adiamento de audiências e restrições no atendimento à população e aos advogados;

2) penalização de estagiários com contratos firmados com o Poder Judiciário e com o Ministério Público, que deverão ser dispensados em razão de conflito com os horários acadêmicos;

3) impossibilidade de compatibilização entre audiências realizadas na capital e em comarcas do interior, já que há mais de 50 anos aquelas são realizadas pela manhã, enquanto estas ocorrem no período vespertino, permitindo aos advogados funcionarem em processos em comarcas diferentes;

4) impossibilitar que magistrados, promotores de justiça e defensores públicos atuem em mais de uma comarca simultaneamente, em substituição aos licenciados ou em férias, prática que, segundo o requerente, corroborada pelo Ofício 351/2007 enviado pela Procuradora-Geral de Justiça de Sergipe ao Presidente do Tribunal de Justiça de Sergipe, permite um melhor e ininterrupto atendimento à população;

5) alega ainda, por fim, que a Resolução atacada não atentou para os "mandamentos constitucionais de que "O advogado é indispensável à administração da justiça (Art. 133); O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado (art.127)"" por ter sido expedida sem que a OAB ou o Ministério Público tenham sido ouvidos.

É o relatório. DECIDO LIMINARMENTE:

A Constituição Federal, em seu artigo 96, estabelece claramente a autonomia administrativa e financeira dos tribunais para a determinação do horário de funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais:

Art. 96 - Compete privativamente:

I - aos tribunais:

a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;

Dentro desta competência privativa inclue-se, é obvio, a discricionariedade de estabelecer seu horário de funcionamento.

Assim também tem entendido o próprio CNJ, quando solicitado a se manifestar a respeito de uma uniformização dos horários de expediente judicial no PP 73, em que funcionou como relatora a Conselheira Germana Moraes:

Entretanto, no caso que ora se cuida, onde a parte requerente busca a fixação de horário unificado para todo o Poder Judiciário, entendo que tal medida vulnera o disposto nas alíneas "a" e "b" do inciso I do art. 96 da Carta Magna de 1988, cuja dicção é a seguinte: (...)

Não é esta, entretanto, a questão em tela. Dado que inexistem direitos absolutos em uma sociedade democrática, que por definição é marcada pela diversidade de interesses sociais legítimos e, portanto, por direitos também diversos, e às vezes até antinômicos, indaga-se: quais os limites desta autonomia? e como deve ser exercida, de modo a não prejudicar outros direitos também sob guarida constitucional?

Concretamente: pode o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe mudar seu horário de funcionamento estabelecido há mais de cinqüenta anos em nome da busca de uma maior eficiência, como alegado pela Resolução 24/2007 e como reza o artigo 37 da CF? Entendo que sim. Desde, porém, que alguns requisitos sejam preenchidos e determinados limites sejam respeitados, afastando qualquer entendimento de uso indevido da discricionariedade. Que limites e requisitos são estes? Esta é a questão.

Primeiro, é necessário entender, sistemicamente, que a administração da justiça, que tem no Poder Judiciário seu maior e principal responsável, é, na verdade, um sistema organizacional complexo. Um sistema integrado por diversas partes, órgãos, processos e profissionais indispensáveis. Além do próprio Tribunal, no caso, são indispensáveis conforme a Constituição, primeiro, os usuários, depois, os profissionais envolvidos; e entre eles os profissionais da advocacia, do ministério público e da defensoria pública, por exemplo. Nenhum sistema organizacional poderá ser eficiente tendo suas partes integrantes desagregadas. A tarefa de agregar para se alcançar a eficiência é, primordialmente, do Tribunal. Na administração de sistemas complexos inexiste eficiência unilateral. O ideal é que mudanças desse porte sejam feitas de maneira convergente.

Ora, no caso em tela existem evidências consideráveis de que a mudança de horário, ao invés de agregar os atores da justiça e aumentar a sua eficiência, poderia ter o efeito reverso, terminando por prejudicá-la. Basta conferir os argumentos expostos pela requerente nos itens 1, 2, 3, 4 e 5 do relatório desta decisão e o Ofício 351/2007 enviado pela Procuradora-Geral à Presidência do TJSE.

Em segundo lugar, é necessário prudência e cautela para que o exercício da discricionariedade seja, além de eficiente, legal e legítimo como demanda qualquer grande mudança organizacional. Nesta cautela e prudência reside o respeito aos direitos dos usuários e dos profissionais sem os quais o Poder Judiciário não poderia funcionar.

Considere-se que se trata de mudar um horário, uma tradição, um hábito de mais de cinqüenta anos. Vale, pois, lembrar um dos maiores observadores do comportamento humando de todos os tempos: Marcel Proust. Proust dizia que o hábito é a segunda natureza do homem. Não se deve mudar a segunda natureza da administração, sendo a justiça a primeira, em um prazo tão exíguo de apenas um mês.

Até prova em contrário, que não afasto, não parece possível adaptar toda uma rede de serviços jurídicos e judiciais em um mês sem que se implique em grandes riscos. Contratos profissionais advocatícios estão em curso, lotação de servidores públicos, rotinas estabelecidas para atender aos interesses dos usuários pelos advogados, procuradores e defensores, enfim, uma teia de relações sociais e jurídicas é afetada sem que seus integrantes tenham sido pelo menos consultados.

Em geral, esse tipo de mudança é feita não no meio do ano fiscal ou judicial, mas em seu início, de modo a permitir que todas as instituições envolvidas possam ao menos tentar adaptar seus orçamentos, avaliar o impacto em seus quadros de pessoal e testar novos procedimentos. Até ter prova em contrário, o que não afasto, inexiste urgência - 30 dias - para implantação desta estruturante mudança. A justiça é bem de primeira necessidade. Sua administração não deve correr riscos evitáveis pois o resultado é a insegurança.

A administração da justiça não é um fim em si mesma. É apenas meio para garantir o acesso dos cidadãos à própria justiça. Esta é sua finalidade maior. Este o direito maior a ser protegido. Um direito fundamental. Sem uma justiça ágil e de fácil e não traumático acesso inexiste democracia. A autonomia dos tribunais, o estabelecimento de horário de expediente forense, são, sim, direitos dos tribunais, mas subordinados a este fim maior.

Trata-se de caso que afeta não apenas os juízes e funcionários mas toda a sociedade, já que, conforme alega o requerente, pode-se ter prejudicado o estreito andamento processual.

Os advogados, o Ministério Público e a Defensoria Pública são essenciais e indispensáveis à administração da justiça e por isso têm o direito de pelo menos se manifestar a respeito de mudanças nos horários de expediente forense, mesmo que ao tribunal compita o poder, privativamente, de tal decisão. Aliás, como lembra Niklas Luhmann, este poder só é legítimo quando traz a paz social.

Isto posto, presentes os requisitos para a concessão da liminar, defiro o pedido de suspensão da Resolução 24/2007 do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, na data da ciência desta decisão, até o julgamento em Plenário deste PCA, com o retorno dos horários de expediente forense praticados antes de sua publicação, determinando:

a) que se intime, com a MÁXIMA URGÊNCIA, a presidência do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe informando-lhe da decisão;

b) que se intime, com cópia integral dos autos, o Ministério Público do Estado de Sergipe, a Defensoria Pública do Estado de Sergipe e o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe para que, em 7 dias, prestem as informações que julgarem relevantes para o julgamento da matéria;

c) que se intime, também com cópia integral dos autos, a Associação dos Magistrados de Sergipe - AMASE, para que, em 7 dias, se pronuncie, caso seja de seu interesse;

d) que, por se tratar de decisão liminar suspendendo ato administrativo, seja levado à Sessão Plenária com prioridade, colocado em pauta para a próxima sessão, para referendo.

Oficie-se, dando ao requerente ciência da decisão.

Brasília, 01 de agosto de 2007.

Conselheiro JOAQUIM FALCÃO
Relator

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