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Supremo | Sessão

STF suspende análise de legalidade de revista íntima em presídio

Ministro André Mendonça pediu vista da ação.

Da Redação

quinta-feira, 27 de março de 2025

Atualizado às 16:36

Nesta quinta-feira, 27, após debates em sessão plenária, o STF voltou a suspender o julgamento sobre a legalidade da utilização de provas obtidas por meio de revista íntima em visitantes de presídios.

O relator da ação, ministro Edson Fachin, apresentou uma nova proposta de tese na tarde de hoje.

Contudo, os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino fizeram sugestões para o aperfeiçoamento do enunciado, o que levou o ministro André Mendonça a pedir vista do processo.

O caso será retomado na sessão da próxima quarta-feira, 2.

Caso

O caso concreto que motivou o recurso envolve o MP/RS, que contestou decisão do Tribunal de Justiça estadual. 

O tribunal absolveu uma mulher acusada de tráfico de drogas ao entender que a prova foi obtida de forma ilícita, já que ela foi submetida à revista vexatória ao tentar entrar no Presídio Central de Porto Alegre com 96 gramas de maconha no corpo para entregar ao irmão detido.

Voto do relator

Ministro Edson Fachin, havia reiterado, em 6/2, voto proferido em plenário virtual, pela proibição da revista íntima vexatória em visitantes de presídios, considerando-a uma violação à dignidade da pessoa humana e aos direitos fundamentais à integridade, intimidade e honra. 

Nesta quinta-feira, 27, o ministro, ao se manifestar, fez novas observações.

Para o relator, práticas como o desnudamento forçado, agachamentos, saltos, exposição de cavidades íntimas e toques corporais sob vigilância de agentes prisionais violam diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana.

Fachin observou que a aplicação generalizada e sem critérios dessas práticas, inclusive a adolescentes, idosos, pessoas com deficiência e demais visitantes cadastrados, configura "discriminação prévia dos familiares de presos", sem que haja uma justificativa legítima por parte do poder público para restringir direitos fundamentais.

Contrariando a posição do Ministério Público, o ministro afirmou que o debate não gira em torno da atribuição de um caráter absoluto à dignidade humana, mas sim do reconhecimento de que a proteção à convivência familiar de pessoas presas exige "estratégias mais adequadas nos protocolos das unidades prisionais".

Ao analisar os votos dos demais ministros, Fachin destacou que os pontos centrais da controvérsia estão na diferenciação entre revista pessoal, revista íntima e revista vexatória; na validade do consentimento do visitante submetido à revista manual; e nos efeitos processuais da declaração de ilicitude da prova obtida por meio dessas práticas.

Com base na resolução 28/22 do CNCP - Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, Fachin esclareceu que a revista pessoal inclui tanto o uso de equipamentos eletrônicos como detectores de metais e scanners corporais quanto, em casos excepcionais, a revista manual.

Esta última, porém, deve seguir critérios rígidos: o visitante deve permanecer com as roupas íntimas; a revista deve ser feita por agente do mesmo sexo; e, no caso de travestis, transexuais ou intersexuais, é assegurado o direito de escolha do gênero do agente.

A resolução também veda expressamente práticas como o desnudamento, toques íntimos, introdução de objetos nas cavidades corporais, uso de animais farejadores e exigência de agachamentos ou saltos.

Para Fachin, a adoção dessas diretrizes é essencial para que o Estado exerça seu poder de fiscalização dentro dos limites da proporcionalidade, com reforço do ônus de justificação por parte dos agentes públicos.

O ministro também citou precedente da Corte Interamericana de Direitos Humanos referente ao Complexo Penitenciário do Curado, em Recife, que, ao aplicar as Regras de Mandela e outras normas internacionais, reforçou a vedação a revistas humilhantes e degradantes. A Corte alertou que "a existência formal de normas não é por si só suficiente para assegurar a eliminação dessa prática", sendo necessário que as autoridades se abstenham de realizar tais revistas e promovam ações concretas para impedir sua naturalização como rotina prisional.

Ao final, propôs nova tese:

"1. Em visitas sociais nos presídios ou estabelecimentos de segregação é inadmissível a revista íntima com o desnudamento de visitantes ou a inspeção de suas cavidades corporais. A prova obtida por esse tipo de revista é ilícita, ressalvando-se as decisões proferidas e transitadas em julgado até a data deste julgamento.

2. A autoridade administrativa, de forma fundamentada e por escrito, tem o poder de não permitir a visita, diante da presença de indício robusto, de ser a pessoa visitante e portadora de qualquer item corporal oculto ou sonegado, especialmente de material proibido, como produtos ilegais, drogas ou objetos perigosos. São considerados robustos indícios embasados em elementos tangíveis e verificáveis, como informações prévias de inteligência, denúncias fundamentadas, comportamentos suspeitos detectados por sistemas de monitoramento ou até mesmo a detecção inicial por equipamentos de triagem.

3. Confere-se o prazo de 24 meses, a contar da data deste julgamento, para aquisição e instalação de equipamentos, como scanners corporais, esteiras de raio-x e portais detectores de metais em todos os estabelecimentos penais.

4. Fica determinado ao ministério da Justiça e da Segurança Pública que, por meio dos recursos do Fundo Penitenciário Nacional e do Fundo Nacional de Segurança Pública, promover a aquisição ou locação e distribuição de scanners corporais para as unidades prisionais, em conformidade com sua atribuição de coordenação nacional da política penitenciária, assegurando a proteção dos servidores, a integridade dos detentos e a dignidade dos visitantes, prevenindo práticas abusivas e ilícitas, sem interferir na autonomia dos entes federativos e garantindo a aplicação uniforme das diretrizes de segurança penitenciária no país.

5. Devem os entes federados, no âmbito de suas atribuições, garantir que a aquisição ou locação de scanners corporais para as unidades prisionais esteja contemplada no respectivo planejamento administrativo e orçamento, com total prioridade na aplicação dos recursos.

6. Em regime de transição, excepcionalmente na impossibilidade de utilização do scanner corporal, esteira de raio-x, portais e detectores de metais, a revista íntima para ingresso em estabelecimentos prisionais, diante de indícios robustos de suspeita, deverá ser motivada para cada caso específico e dependerá da plena concordância do visitante. Vedada em qualquer circunstância a execução da revista como forma de humilhação e disposição vexatória. Deve ser realizada em local adequado, exclusivo para tal verificação e apenas em pessoas maiores e que possam emitir consentimento válido, de acordo com protocolos gerais e nacionais pré-estabelecido e por pessoas do mesmo gênero, obrigatoriamente médicas ou médicos nas hipóteses de exames invasivos.

6.1 O excesso ou abuso da realização da revista íntima acarretarão responsabilidade do agente público ou do profissional de saúde habilitado e ilicitude de eventual prova obtida.

6.2 Caso não haja concordância do visitante, a autoridade administrativa poderá, de forma fundamentada e por escrito, impedir a realização da visita. 

6.3 O procedimento de revista em criança, adolescente ou pessoa com deficiência intelectual que não possa emitir consentimento válido, será substituído pela revista invertida direcionada à pessoa a ser visitada.

6.4 Após esse período de transição, fica vedada a revista íntima com o desnudamento de visitantes ou a inspeção de suas cavidades corporais, restando somente permitida a revista pessoal, desde que não vexatória."

Sugestões

Na sessão desta tarde, os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino apresentaram sugestões à tese proposta pelo relator.

Entre os principais pontos, os ministros defenderam a modulação dos efeitos da decisão, atribuindo à tese caráter prospectivo, o que significa que suas consequências jurídicas passarão a valer apenas para fatos futuros.

Outro destaque foi a flexibilização quanto à ilicitude da prova obtida por meio de revista íntima. Diferentemente do que previa a redação original, que a considerava automaticamente ilícita, os ministros sugeriram que, em situações específicas, essa avaliação seja feita caso a caso - conforme o item 6.1 da nova redação.

Também foi suprimido o prazo de 24 meses inicialmente fixado para que os presídios se adaptassem com a instalação de scanners corporais, esteiras de raio-x e detectores de metais. Além disso, a exigência de que exames invasivos fossem realizados exclusivamente por médicos foi substituída pela recomendação de que sejam feitos, preferencialmente, por profissionais de saúde.

A nova versão da tese ainda amplia a responsabilidade pela aquisição dos equipamentos, incluindo os Estados ao lado da União, e elimina a obrigatoriedade de previsão orçamentária prioritária pelos entes federativos. Foi suprimida, igualmente, a previsão de vedação definitiva da revista íntima com desnudamento após a fase de transição.

Por fim, a redação revisada removeu as hipóteses que autorizavam o impedimento da visita com base em indícios robustos, retirando critérios objetivos que conferiam respaldo à atuação administrativa.

Veja a tese reformulada conforme sugestões dos ministros:

"1. Em visitas sociais nos presídios ou estabelecimentos de segregação é inadmissível a revista íntima com o desnudamento de visitantes ou a inspeção de suas cavidades corporais. A prova obtida por esse tipo de revista é ilícita, salvo decisões judiciais em cada caso concreto. A presente tese tem efeitos prospectivos.

2. A autoridade administrativa, de forma fundamentada e por escrito, tem o poder de não permitir a visita, diante da presença de indício robusto, de ser a pessoa visitante e portadora de qualquer item corporal oculto ou sonegado, especialmente de material proibido, como produtos ilegais, drogas ou objetos perigosos. São considerados robustos indícios embasados em elementos tangíveis e verificáveis, como informações prévias de inteligência, denúncias fundamentadas, comportamentos suspeitos detectados por sistemas de monitoramento ou até mesmo a detecção inicial por equipamentos de triagem.

3. Confere-se o prazo de 24 meses, a contar da data deste julgamento, para aquisição e instalação de equipamentos, como scanners corporais, esteiras de raio-x e portais detectores de metais em todos os estabelecimentos penais.

4. Fica determinado ao ministério da Justiça e da Segurança Pública, bem como aos Estados, por meio dos recursos do Fundo Penitenciário Nacional e do Fundo Nacional de Segurança Pública, promover a aquisição ou locação e distribuição de scanners corporais para as unidades prisionais, em conformidade com sua atribuição de coordenação nacional da política penitenciária, assegurando a proteção dos servidores, a integridade dos detentos e a dignidade dos visitantes, prevenindo práticas abusivas e ilícitas, sem interferir na autonomia dos entes federativos e garantindo a aplicação uniforme das diretrizes de segurança penitenciária no país.

6. Excepcionalmente na impossibilidade, ou inefetividade, de utilização do scanner corporal, esteira de raio-x, portais e detectores de metais, a revista íntima para ingresso em estabelecimentos prisionais, diante de indícios robustos de suspeita, deverá ser motivada para cada caso específico e dependerá da plena concordância do visitante. Vedada em qualquer circunstância a execução da revista como forma de humilhação e disposição vexatória. Deve ser realizada em local adequado, exclusivo para tal verificação e apenas em pessoas maiores e que possam emitir consentimento válido, de acordo com protocolos gerais e nacionais pré estabelecidos e por pessoas do mesmo gênero, prefeencialmente profisisonais de saúde.

6.1 O excesso ou abuso da realização da revista íntima acarretarão responsabilidade do agente público ou do profissional de saúde habilitado e ilicitude de eventual prova obtida.

6.2 Caso não haja concordância do visitante, a autoridade administrativa poderá, de forma fundamentada e por escrito, impedir a realização da visita. 

6.3 O procedimento de revista em criança, adolescente ou pessoa com deficiência intelectual que não possa emitir consentimento válido, será substituído pela revista invertida direcionada à pessoa a ser visitada."

Alto número, maior risco

Ao se manifestar nesta tarde, ministro Alexandre de Moraes alertou para os riscos à segurança causados pelo alto número de visitas a presos nos fins de semana. Segundo o ministro, quase 500 mil pessoas acessam o sistema prisional aos sábados e domingos, o que agrava as deficiências estruturais das unidades.

Moraes citou que, entre 2023 e 2024, foram feitas cerca de 625 mil apreensões de itens ilícitos durante as visitas.

Veja:

No virtual

No plenário virtual, o caso já contava com cinco votos favoráveis à proibição da prática, sob o argumento de que viola os princípios da dignidade da pessoa humana e da proteção à intimidade, honra e imagem.

O relator, ministro Edson Fachin, foi acompanhado pelos ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes e pelas ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber (atualmente aposentada). Ministro Cristiano Zanin acompanhou o relator com ressalvas.

A divergência foi aberta pelo ministro Alexandre de Moraes, que votou pela legalidade do procedimento. Seu entendimento foi seguido pelos ministros Nunes Marques, André Mendonça e Dias Toffoli.

Com o pedido de destaque formulado por Moraes, o julgamento foi interrompido e transferido para o plenário físico, onde foi reiniciado.

Veja o placar formado no plenário virtual: