Dino vota por aceitar denúncia de Bolsonaro: "golpe de Estado mata"
Ministro citou gravidade dos atos do 8 de janeiro e destaca que tentativa de ruptura da ordem constitucional causa mortes diretas e indiretas.
Da Redação
quarta-feira, 26 de março de 2025
Atualizado às 12:49
O ministro Flávio Dino votou pelo recebimento da denúncia apresentada pela PGR contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros acusados por tentativa de golpe de Estado.
Em sua manifestação durante a sessão da 1ª turma do STF, Dino afirmou que "golpe de Estado mata", ainda que não haja vítimas fatais no momento da ação, e citou o 8 de janeiro como marco de um atentado à ordem democrática brasileira.
O ministro rebateu o argumento, levantado por defesas, de que os manifestantes não estariam armados no dia dos ataques. Para isso, lembrou a análise feita pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos sobre os acontecimentos de 6 de janeiro no Capitólio.
"Conforme comprovado no tribunal, as armas usadas e transportadas no Capitólio incluem armas de fogo, spray, armas brancas, incluindo espadas, machados e facas, e armas improvisadas, como móveis destruídos, cercas, bicicletários, tacos de baseball e de hóquei, canos de PVC e luvas reforçadas", afirmou.
"É este conceito de armas que estamos tratando aqui", concluiu Dino.
Dino também destacou a presença de policiais e militares entre os envolvidos nos atos de 8 de janeiro. "E estes, não há dúvida, só andam armados. Há alguns que são mais apaixonados por suas armas do que por seus cônjuges. Dormem com as armas debaixo do travesseiro, na cama, ao lado da mesa de cabeceira. Transportam para onde vão", ironizou.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, fez um aparte durante a fala de Dino para mencionar um episódio ocorrido no Tribunal Constitucional Polonês, em que a idade de aposentadoria de ministros foi retroativamente reduzida, retirando cinco juízes do cargo.
Segundo Moraes, "é um atentado contra um dos Poderes, mas não é um golpe de Estado, porque os poderes políticos continuam". Dino brincou com a observação: "Eu, como vou fazer 60, sou contra a medida. Eu e Vossa Excelência". Moraes respondeu, rindo: "Vossa Excelência primeiro".
Na sequência, Dino citou precedente da ministra Cármen Lúcia, segundo o qual não cabe ao juiz, ao receber uma denúncia, redefinir a qualificação jurídica dos fatos narrados pela acusação. "Poderá fazê-lo na prolação da sentença", afirmou.
O ministro também mencionou o art. 5º, inciso XLIV da Constituição Federal, que considera inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.
"A Constituição definiu como altamente gravosa essa conduta. E, portanto, o juízo de proporcionalidade tem extração constitucional", disse. "A Constituição não fala em pessoas armadas, mas em grupos armados."
"Pouco importa se a pessoa tinha arma de fogo ou arma branca. O que importa é que o grupo era armado. O grupo portava armas de fogo, armas brancas e assim sucessivamente", prosseguiu Dino.
Para ele, a gravidade dos atos está nos objetivos e na natureza do ataque, e não na ausência de mortes no dia 8 de janeiro. "Golpe de Estado mata. Não importa se é no dia, no mês seguinte ou alguns anos depois."
O ministro citou ainda o filme "Ainda Estou Aqui", inspirado na obra de Marcelo Rubens Paiva, como exemplo da repercussão de regimes autoritários. "A arte é fonte do Direito também", afirmou Dino, ao mencionar o impacto das ações autoritárias sobre a vida das pessoas.
Denúncia
No julgamento, a 1ª turma do STF analisa a denúncia da PGR contra Bolsonaro e outros acusados por tentativa de golpe de Estado.
O processo é analisado em três sessões e pode resultar na abertura de uma ação penal contra o ex-presidente e outros envolvidos.
Na denúncia, a PGR sustenta que Bolsonaro integra o chamado "núcleo crucial" do grupo que teria planejado e articulado uma ruptura institucional com o objetivo de impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.
Entre os elementos reunidos estão reuniões, documentos e manifestações públicas que, segundo o órgão acusador, demonstram a tentativa deliberada de subverter o resultado das urnas.
O julgamento começou com a leitura do relatório do caso e seguirá com as sustentações orais das partes. Após essa fase, os ministros da 1ª Turma irão votar se aceitam ou não a denúncia.
Caso o colegiado decida pelo recebimento, Bolsonaro e os demais denunciados se tornarão réus em processo criminal perante o STF.
- Veja como foi a primeira parte do julgamento.
- Confira a íntegra da segunda parte da sessão.