STF: Shopping Centers não devem manter creche para filhos de funcionárias
Para o relator, ministro Dias Toffoli, norma trabalhista não pode ser interpretada para criar obrigações que não estão previstas na legislação atual.
Da Redação
terça-feira, 25 de fevereiro de 2025
Atualizado às 16:19
Por maioria, 2ª turma do STF reformou decisões das instâncias trabalhistas e entendeu que shopping centers não precisam manter creches para filhos de empregadas das lojas locatárias.
Prevaleceu o voto do relator, ministro Dias Toffoli, que foi acompanhado pelos ministros André Mendonça, Nunes Marques e Gilmar Mendes. Ficou vencido ministro Edson Fachin.
No caso, o MPT - Ministério Público do Trabalho ajuizou ação civil pública contra um Shopping Center, exigindo que construísse e mantivesse creche para os filhos das empregadas das lojas do centro comercial.
A fundamentação foi baseada no art. 389 da CLT, que determina que empresas com mais de 30 funcionárias devem oferecer espaço para amamentação.
O juízo de 1ª instância condenou o shopping a cumprir a obrigação, fixando multa diária de R$ 50 mil em caso de descumprimento, além do pagamento de indenização por danos morais coletivos no mesmo valor.
A decisão foi mantida pelo TRT e, posteriormente, pelo TST.
No julgamento de embargos, a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST reafirmou a obrigação do shopping, sob o argumento de que a interpretação da norma trabalhista deve se adaptar à realidade atual.
O relator do caso na Corte trabalhista sustentou que o shopping deve ser compreendido como um "sobre-estabelecimento" e que, ao obter lucros indiretos das lojas, também deve se responsabilizar pelas empregadas do local.
Diante da decisão desfavorável, o Shopping e a Abrasce - Associação Brasileira de Shopping Centers recorreram ao STF.
Voto do relator
O relator, ministro Dias Toffoli, ao analisar o caso, discordou do entendimento do TST e deu provimento aos recursos.
Segundo o ministro, não há base legal para estender aos shoppings obrigação exclusiva do empregador direto das funcionárias.
Além disso, Toffoli afirmou que a decisão da Justiça do Trabalho interferia indevidamente no princípio da livre iniciativa, ao determinar que um empreendimento comercial arcasse com custos que não lhe são atribuídos pela legislação.
O relator também citou precedentes do próprio STF, incluindo o julgamento da ADPF 501, no qual a Corte decidiu que o Poder Judiciário não pode atuar como legislador positivo, criando obrigações não previstas em lei.
Destacou que a obrigação primária pela assistência à primeira infância cabe ao Estado e questionou a necessidade de uma ação civil pública para impor essa responsabilidade a estabelecimentos privados.
"Do ponto de vista da realidade, nós estamos diante não de uma lei, nós estamos diante de uma ação civil pública. Ora, então, se foi necessária uma ação civil pública para impor essa obrigação, é porque a lei não o fez", disse Toffoli.
O ministro ressaltou que há legislação específica sobre a primeira infância, que estabelece a importância e os deveres do Estado na assistência infantil.
Toffoli também ponderou a respeito das mudanças no cenário do comércio.
"As compras presenciais estão desaparecendo. O emprego de vendedores em lojas presenciais está desaparecendo", destacou o ministro, observando a migração do comércio para o ambiente digital.
Ressaltou que muitos shoppings já operam com lojas menores e espaços compartilhados, o que altera a dinâmica do trabalho no setor. "O espaço físico está cada vez menos sendo procurado para os fins de troca de mercadoria por moeda. A compra e venda está cambiando largamente para a internet".
S. Exa. foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes, André Mendonça e Nunes Marques.
Veja trecho do voto:
Divergência
Ministro Edson Fachin, que pediu destaque do caso que era julgado no plenário virtual, divergiu.
Ressaltou que o direito a esses espaços não se restringe às crianças, mas também às mulheres mães, considerando a vulnerabilidade enfrentada no mercado de trabalho.
"A existência de berçários é imprescindível para assegurar às mães trabalhadoras a segurança no exercício do direito ao trabalho e à família, em razão da maior vulnerabilidade que as trabalhadoras enfrentam nas suas relações de emprego, já que elas se deparam com diversas dificuldades para a conciliação dos projetos de vida pessoal, familiar e laboral", afirmou Fachin.
O ministro citou que o inciso XX do art. 7º da CF é claro ao estabelecer proteção ao mercado de trabalho da mulher por meio de incentivos, que, no caso analisado, incluem a disponibilização de creches e berçários.
Segundo Fachin, a interpretação dos §§1º e 2º do art. 389 da CLT deve ser ampliada, garantindo máxima proteção ao direito fundamental ao aleitamento materno. "Revela-se como forma de densificação do direito humano e fundamental ao leitamento materno, merecendo a interpretação que não reduza o arco protetivo, mas sim que garanta a máxima efetividade dos direitos fundamentais à saúde e alimentação da criança, além da proteção à maternidade e à infância", argumentou.
Por fim, o ministro reforçou a necessidade de uma interpretação que ressignifique o conceito de "estabelecimento" na CLT, ampliando a proteção a mães e crianças. "Enfim, uma união de interesses com a finalidade de promover melhores condições de venda, de modo que a realização de negócios em comunhão apresente-se como um dado da realidade, não se podendo duvidar da responsabilidade que daí decorre da função social do empreendimento, da função social desses contratos, da própria função social da propriedade e da responsabilidade social da administradora do shopping", concluiu.
Veja trecho do voto:
- Processo: ARE 1.499.584