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Direito à memória

Dino propõe discussão da lei da anistia a "crimes permanentes" na ditadura

Ministro citou filme "Ainda Estou Aqui" na argumentação.

Da Redação

segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

Atualizado às 12:03

O ministro do STF, Flávio Dino, considerou que deve ser discutido na Corte se a lei da anistia (lei 6.683/79) pode ser aplicada a crimes que tiveram início durante a ditadura militar, mas cujos efeitos se prolongam até o presente - os chamados crimes permanentes. 

Dino ressaltou que o tema exige atenção por sua complexidade jurídica e relevância histórica, propondo que seja tratado sob o sistema de repercussão geral, que permite ao STF definir um entendimento vinculante para instâncias inferiores da Justiça.

O que é crime permanente?

É aquele cuja consumação se estende no tempo, enquanto perdurarem seus efeitos. Diferentemente de crimes instantâneos, que se encerram com a prática do ato, os permanentes continuam ocorrendo até que a situação criada pelo crime seja cessada. Por exemplo, no caso de ocultação de cadáver, o crime persiste enquanto o corpo permanece escondido, renovando a prática a cada momento em que a ocultação continua.

Entenda o caso

A proposta do relator surge no âmbito de um recurso que discute crimes ocorridos durante a Guerrilha do Araguaia, como o homicídio cometido por Lício Augusto Ribeiro Maciel e a ocultação de cadáver praticada por Sebastião Curió, ambos militares do Exército Brasileiro.

Curió faleceu em 2022, mas o processo busca a condenação de Maciel.

Na 1ª instância, a denúncia do MPF foi rejeitada com base na lei da anistia. O TRF da 1ª região manteve a decisão, levando o caso ao STF, que deverá avaliar se aplica a repercussão geral.

 (Imagem: Gustavo Moreno/STF)

Dino propõe que Lei da Anistia não vale para ocultação de cadáver.(Imagem: Gustavo Moreno/STF)

Debate sobre crimes permanentes

Em decisão, Dino enfatizou que a ocultação de cadáver, por exemplo, continua acontecendo enquanto o paradeiro da vítima permanece desconhecido. 

"A manutenção da omissão do local onde se encontra o cadáver, além de impedir os familiares de exercerem seu direito ao luto, configura a prática do crime, bem como situação de flagrante."

O relator esclareceu que a proposta não revisa a decisão do STF na ADPF 153, que reconheceu a constitucionalidade da lei da anistia. 

"O debate do presente recurso se limita a definir o alcance da Lei de Anistia em relação ao crime permanente de ocultação de cadáver."

Dino detalhou que, por ser um crime permanente, a ocultação de cadáver tem sua ação prolongada no tempo. 

"A aplicação da Lei de Anistia extingue a punibilidade de todos os atos praticados até a sua entrada em vigor. Ocorre que, como a ação se prolonga no tempo, existem atos posteriores à Lei da Anistia", explicou o ministro.

A lei da anistia, promulgada em 1979, concedeu perdão a crimes políticos e conexos ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.

Contudo, a questão que se coloca agora é se delitos como a ocultação de cadáver, que se prolongam após 1979, podem ser punidos.

Para ilustrar o impacto humano desse tipo de crime, Dino mencionou o filme "Ainda Estou Aqui", inspirado no livro de Marcelo Rubens Paiva, que relata o desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva. 

"A história do desaparecimento de Rubens Paiva, cujo corpo jamais foi encontrado e sepultado, sublinha a dor imprescritível de milhares de pais, mães, irmãos, filhos, sobrinhos, netos, que nunca tiveram atendidos os seus direitos quanto aos familiares desaparecidos."

V. Exa. também lembrou da luta de Zuzu Angel, que buscou incansavelmente pelo paradeiro do filho Stuart Angel, como símbolo da persistência das famílias afetadas.

A proposta de repercussão geral ainda será analisada pelo plenário do STF, e, caso aprovada, estabelecerá uma diretriz sobre a possibilidade de punir crimes permanentes protegidos pela anistia. 

Leia a decisão.

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