Portaria de FIP na região Amazônica entrará em vigor no começo de 2025
Ricardo Vieira, especialista em Direito Societário do escritório Barcellos Tucunduva Advogados, aponta prós e contras da nova regulamentação.
Da Redação
sexta-feira, 6 de dezembro de 2024
Atualizado às 17:41
Prevista para entrar em vigor em janeiro de 2025, a Portaria que regulamenta a aplicação em fundos de investimento em participação (FIP) para capitalização de empresas de base tecnológica na Amazônia Ocidental ou no Estado do Amapá traz maior segurança jurídica, mas nasce desatualizada. É o que aponta o especialista em Direito Societário do Barcellos Tucunduva Advogados, Ricardo Vieira.
Elaborada em conjunto pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) e a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), a nova Portaria revoga e substitui a Portaria MDIC nº 1.753, de 16/10/2018, trazendo mudanças substanciais.
Empresa de base tecnológica
Uma das primeiras alterações observadas por Vieira está no conceito de "empresa de base tecnológica", que atualmente considera a observância de duas ou mais características como desenvolvimento de bens, serviços ou processos tecnologicamente novos, comercialização de Direito de Propriedade Intelectual (patentes), despesas em pesquisa em desenvolvimento maiores que 5% da receita bruta, desenvolvimento de software, entre outros.
De acordo com Vieira, a nova definição aponta para "organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, que utilizem conhecimentos científicos ou tecnologias como insumos básicos e cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios, processos produtivos, produtos ou serviços ofertados".
"Há uma aparente simplificação do conceito, mas o enquadramento ficou mais restrito. Empresas enquadradas hoje no conceito da portaria 1.753 talvez não possam mais receber os recursos incentivados a partir do próximo ano", ressalta o especialista. "Além disso, a exigência de que a empresa seja nascente ou em operação recente, com até 10 anos de inscrição no CNPJ, é uma inovação", completa.
Atividade principal
A portaria 1.753 já exige que a empresa investida tenha sede ou atividade principal na Amazônia Ocidental ou no Estado do Amapá, mas não havia definição objetiva do que caracterizaria tal atividade principal.
Para 2025, além de exigir um "estabelecimento formalizado com endereço" na região, a nova portaria define atividade principal como "atividade de pesquisa, desenvolvimento, produção ou inovação com potencial para geração de receita para empresa de base tecnológica investida" e exige que seja compatível com um dos conceitos tratados no decreto 10.521/20: Pesquisa básica; pesquisa aplicada; desenvolvimento experimental; inovação tecnológica; formação ou capacitação profissional; serviços de consultoria científica e tecnológica.
"Ficou claro que o estabelecimento da empresa na região deve desenvolver tais atividades, não bastando, por exemplo, manter uma equipe comercial na região, enquanto pesquisa e desenvolvimento são realizados em outras localidades", destaca Vieira. "Apesar de trazer clareza ao conceito, a portaria desconsidera a dinâmica do trabalho remoto e a potencial escassez de profissionais de pesquisa e desenvolvimento na região".
Retrocesso e desatualização
Para o especialista doBarcellos Tucunduva Advogados, um dos grandes retrocessos da nova portaria está no limite de receita bruta, que foi reduzido de R$ 50 milhões para R$ 16 milhões ou proporcional ao número de meses em atividade, embora não tenha mais limite para 3 anos anteriores.
"É um retrocesso que vai limitar consideravelmente a quantidade de empresas aptas a receber os recursos", avalia Vieira. "O próprio valor adotado está desatualizado, já que corresponde ao limite das empresas alvo de FIP Capital Semente da regulação anterior, a instrução CVM 578, de 2016. Essa instrução foi revogada em 2022 pela resolução CVM 175, que elevou a receita bruta limite de 'capital semente' para R$ 20 milhões", explica.
Outra decisão destacada como "perda de oportunidade" pelo advogado foi a manutenção da proibição de investimento em empresas que sejam controladas, direta ou indiretamente, por sociedade ou grupo de sociedades que apresentem ativo total superior a R$ 80 milhões ou receita bruta anual superior a R$ 100 milhões no exercício social imediatamente anterior ao primeiro aporte do FIP.
"Novamente, o regulador perdeu a oportunidade de atualizar os valores nos moldes da resolução CVM 175, que os aumentou respectivamente para R$ 100 milhões e R$ 150 milhões para operações de 'capital semente'", afirma Vieira.
Uma das inovações mais bem-vindas da resolução CVM 175 foi a possibilidade de o regulamento do FIP estabelecer um prazo para aplicação dos recursos recebidos de seus cotistas, o que facilitava também os investimentos realizados no âmbito da portaria 1.753.
A nova portaria limita essa vantagem, estabelecendo um prazo de até 6 meses para aplicação dos recursos do FIP após cada integralização de cotas. Para Vieira, "foi um retrocesso em relação à resolução 175, mas já é um prazo maior do que o anteriormente previsto pela instrução 578".
Pontos positivos
O especialista pondera, no entanto, que a nova portaria também traz alguns pontos positivos. O investimento em ativos no exterior, por exemplo, permanece vedado, mas de acordo com a definição da resolução CVM 175. "Como essa definição é um pouco mais ampla do que a anterior, temos um ganho nessa questão".
Outra alteração significativa, segundo o advogado, é a regra de proibir à empresa de base tecnológica a distribuição de mais de 25% dos lucros durante o período em que receberem aporte de recursos pelos FIPs.
"Essa redação dava margem a interpretações diversas e podia comprometer a atratividade da empresa para novos investidores. Com a nova portaria, a vedação fica mais clara e será aplicável durante o chamado 'período de execução do investimento', definido como 'o período em que a empresa de base tecnológica executa e despende o recurso recebido a título de aplicação do FIP'. Expirado esse período, que não pode passar de 5 anos, não haverá mais a limitação".
Vieira também aponta para o que ele considera uma inovação da portaria: A previsão de quitação de débito e investimento de saldo residual das obrigações de investimento em PD&I -Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação mediante aplicação em FIP. "Esse ponto segue o que está previsto no art. 2º da lei 8.387, que trata da aplicação dos saldos residuais caso os investimentos em atividades de PD&I não atinjam, em um determinado ano, os mínimos fixados na lei".
Numa avaliação final, Ricardo Vieira entende que "a nova regulamentação é mais restrita, mas é também mais clara e deve trazer um nível maior de segurança jurídica, uma demanda antiga do setor".