Para Toffoli, redes devem remover posts mesmo sem determinação judicial
Em extenso voto, ainda não concluído, ministro sinalizou que plataformas devem realizar controle prévio de conteúdo publicado.
Da Redação
quarta-feira, 4 de dezembro de 2024
Atualizado às 18:33
Nesta quarta-feira, 4, o STF, em sessão plenária, voltou a analisar se provedores de internet podem ser responsabilizados por não removerem conteúdo de terceiros mesmo sem ordem judicial. Está em pauta a constitucionalidade do art. 19 da lei 12.965/14 - conhecida como Marco Civil da Internet.
O dispositivo estabelece que, para assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, "o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário".
Nas sessões da última semana, foram ouvidos os amici curiae, e o relator do RE 1.037.396, ministro Dias Toffoli, iniciou a apresentação de seu voto.
Na tarde de hoje, o ministro deu continuidade à leitura, mas, devido ao avançado da hora, a sessão foi suspensa. Toffoli deve concluir seu voto na próxima quinta-feira, 5.
Perfil falso
No RE 1.037.396 (tema 987) , de relatoria do ministro Dias Toffoli, uma mulher ajuizou ação na Justiça paulista após descobrir, por meio de parentes, um perfil falso no Facebook que usava seu nome e fotos para ofender terceiros. Alegando que sua vida "tornou-se um inferno", pediu a exclusão do perfil e indenização por danos morais.
O JEC de Capivari/SP ordenou a exclusão do perfil e o fornecimento do IP, mas negou o pedido de indenização, com base no art. 19 do Marco Civil da Internet. O dispositivo limita a responsabilidade civil de provedores a situações em que, após ordem judicial, eles não removam o conteúdo infrator.
A autora recorreu. A turma recursal determinou indenização de R$ 10 mil, argumentando que exigir ordem judicial específica para remover perfis falsos desconsidera o CDC e a CF, que prevê o dever de indenizar.
No STF, o Facebook questiona a decisão, defendendo a constitucionalidade do art. 19. A empresa sustenta que a norma preserva a liberdade de expressão e impede censura, ressaltando que remover conteúdo sem análise judicial transferiria a empresas privadas o poder de limitar a comunicação pública, em contrariedade à CF e ao marco civil.
Conteúdo de usuários
No RE 1.057.258 (tema 533), de relatoria do ministro Luiz Fux, o STF analisa a responsabilidade de provedores de aplicativos e ferramentas de internet por conteúdo gerado por usuários. Aborda também a possibilidade de remoção de conteúdo que possa violar direitos de personalidade, incitar o ódio ou propagar notícias falsas mediante notificação extrajudicial.
No caso, a Google recorreu de acórdão da 1ª turma recursal cível do JEC de Belo Horizonte/MG, que confirmou a sentença condenatória responsabilizando a rede social Orkut pela remoção da página intitulada "Eu odeio a Liandra", além de determinar o pagamento de R$ 10 mil por danos morais. Mesmo após notificação, a Google se recusou a retirar do ar a página que continha ofensas à vítima.
Voto do relator
Ao começar a votar, ministro Dias Toffoli, relator do RE 1.037.396, criticou a imunidade das plataformas digitais conferida pelo art. 19 do Marco Civil da Internet, que limita a responsabilidade civil ao descumprimento de ordens judiciais.
Apontou que essa regra permite a permanência de conteúdos prejudiciais online, causando danos irreparáveis, e defendeu que o mesmo tratamento legal aplicado ao mundo físico deveria valer no ambiente digital.
Toffoli também destacou que as redes sociais priorizam o lucro, promovendo inverdades e conteúdos nocivos. Segundo S. Exa., o algoritmo das plataformas não valoriza a verdade ou ações positivas, mas sim o que gera engajamento, concluindo que o objetivo final das redes é financeiro.
Nesta tarde, ministro Dias Toffoli, destacou que os ambientes virtuais têm se tornado terreno fértil para a disseminação de notícias falsas de toda ordem, sem precedentes históricos.
Apontou que esses espaços são moldados por modismos, tendências, crenças e valores de uma nova cultura infundida pela mão invisível dos algoritmos, agravados pela ausência de regulamentação clara sobre os limites da liberdade de expressão.
Toffoli alertou que essa lacuna fomenta teorias da conspiração, polarização, discursos de ódio e um novo tipo de violência, a violência digital. Mencionou práticas como cyberbullying, exposição indevida, stalking, fraudes, ataques discriminatórios, revenge porn e disseminação de fake news como formas de agressão que precisam ser enfrentadas.
O ministro também afirmou que o art. 19 do Marco Civil da Internet acoberta esses atos enquanto não houver descumprimento de decisão judicial.
Pontuou que a violência digital frequentemente transborda o ambiente virtual, alcançando a realidade. Citou como exemplo o ataque ao STF, que foi anunciado em redes sociais, assim como o ataque ao Capitólio nos Estados Unidos e os atos de 8 de janeiro no Brasil.
Também mencionou ataques em escolas públicas, indicando que muitos desses eventos foram amplamente divulgados em redes sociais ou serviços de mensagens sem que houvesse qualquer ação efetiva por parte das plataformas para impedir os atos.
Toffoli também ressaltou que diversos projetos de lei chegaram ao Congresso Nacional visando enfrentar o problema, como o PL das Fake News. Contudo, afirmou que a tramitação foi sobrestada, e um grupo foi criado para a formulação de uma nova proposta, já que a anterior teria sido estigmatizada.
O ministro destacou que, em relação a blogs e plataformas jornalísticas, o site ou aplicativo deve seguir o mesmo regramento destinado ao jornalismo impresso, televisivo e radiofônico, conforme a lei 13.188/2015 (lei de direito de resposta).
Reforçou que a legislação exclui os comentários postados por terceiros, em consonância com o art. 3º da mesma norma, cuja constitucionalidade foi declarada pelo STF em julgamento anterior.
- Processos: RE 1.037.396, RE 1.057.258