Credor de câmbio pode receber antes de outros na recuperação, decide STJ
Segundo colegiado, a decisão visa proteger as exportações e garantir o fluxo de caixa dos exportadores.
Da Redação
quinta-feira, 28 de novembro de 2024
Atualizado às 11:54
A 3ª turma do STJ decidiu que credores de adiantamento de contrato de câmbio não necessitam aguardar o pagamento dos demais credores sujeitos à recuperação judicial para receber os valores que lhes são devidos. O caso em análise envolveu uma execução contra uma empresa em recuperação judicial devido a um débito originado de adiantamento de contrato de câmbio.
O credor solicitou a penhora de valores e a suspensão da expedição de alvarás para pagamento dos credores habilitados no processo de recuperação. O juízo responsável pela recuperação determinou a transferência dos valores penhorados para o juízo da execução, com base na natureza do crédito. Entretanto, o tribunal de segunda instância considerou que a transferência desses valores, enquanto ainda existissem credores habilitados na recuperação, representaria desconsiderar o plano de recuperação e prejudicar o próprio processo.
No recurso apresentado ao STJ, o credor argumentou que o crédito decorrente de adiantamento de contrato de câmbio não está sujeito à recuperação judicial. O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator na 3ª turma, afirmou que os valores entregues ao devedor em razão de adiantamento de contrato de câmbio para exportação não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, conforme o art. 49, parágrafo 4º, da lei 11.101/05.
Segundo o ministro, nessa operação, os recursos são adiantados em moeda nacional para o exportador, "por conta de uma exportação a ser realizada no futuro, metodologia muito valorizada pelo comércio exterior, pois incentiva as exportações, permitindo aos exportadores que obtenham financiamento antecipado, com a redução dos riscos cambiais e a melhora de fluxo de caixa".
Dessa forma, o produto da exportação não integra o patrimônio da empresa exportadora em recuperação, que recebeu a antecipação de valores, mas sim da instituição financeira que concedeu o adiantamento. O ministro explicou que "a opção do legislador em não submeter esses créditos aos efeitos da recuperação judicial teve como objetivo proteger as exportações, incentivando as instituições financeiras a continuar concedendo antecipação de crédito aos interessados".
Villas Bôas Cueva observou que, diferentemente do que ocorre na falência, a expectativa na recuperação judicial é que o devedor consiga quitar todas as suas dívidas, de acordo com as condições e os prazos estabelecidos. Assim, o plano de recuperação deve demonstrar a capacidade da empresa de pagar todas as dívidas e continuar operando no mercado.
No caso analisado, o ministro afirmou que a decisão de segunda instância se baseou em uma interpretação equivocada de que alguns credores deveriam receber antes de outros, "a partir de uma ordem de pagamento que não está na lei". Conforme destacou, "os créditos que não estão submetidos aos efeitos da recuperação judicial podem ser perseguidos pelos credores, sem modificação no montante devido e no vencimento".
O relator indicou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, o credor pode solicitar diretamente ao juízo da recuperação a devolução dos valores do adiantamento de contrato de câmbio. "Não há como postergar o pagamento do credor do adiantamento de contrato de câmbio para após o encerramento da recuperação judicial", afirmou.
Segundo Cueva, "a frustração do processo de soerguimento ocorre com o não pagamento dos créditos, estejam ou não submetidos aos efeitos da recuperação, pois em qualquer dos casos poderá ser requerida a falência do devedor. Além disso, os créditos não submetidos aos efeitos da recuperação judicial não precisam ser habilitados, o que, porém, não autoriza que sejam preteridos".
- Processo: REsp 2.070.288
Confira aqui o acórdão.