STF valida emenda que flexibiliza regime de servidores públicos
Para maioria dos ministros não houve vício no processo legislativo que alterou norma constitucional.
Da Redação
quarta-feira, 6 de novembro de 2024
Atualizado às 15:56
Nesta quarta-feira, 6, STF declarou, por maioria, a constitucionalidade da EC 19/98, que flexibilizou o regime jurídico único dos servidores públicos. Ficou vencida a relatora, ministra Cármen Lúcia e os ministros Edson Fachin e Luiz Fux.
O tribunal, considerando o longo período desde a concessão de medida cautelar pela relatora, que suspendia a emenda, decidiu que a eficácia da decisão será ex nunc - ou seja, válida apenas a partir de agora - visando a segurança jurídica e o interesse social.
Além disso, vedou mudanças de regime para servidores atuais, a fim de evitar complicações administrativas e previdenciárias.
Regime Jurídico Único
Criado pela Constituição de 1988 (art. 39), o regime jurídico único prevê a unificação da forma de contratação e o tratamento jurídico dos servidores públicos, conferindo-lhes, geralmente, estabilidade no cargo após período probatório, além de direitos específicos, como aposentadoria diferenciada e garantias de permanência no serviço público.
Ele padroniza as relações de trabalho dos servidores da administração direta, autarquias e fundações públicas, diferenciando-os dos trabalhadores do setor privado, que seguem a CLT.
A EC 19/98 tentou flexibilizar essa regra, permitindo que servidores públicos fossem contratados tanto pelo regime estatutário (próprio dos servidores públicos) quanto pelo regime celetista (da iniciativa privada). Ela criou conselhos de política de administração e remuneração de pessoal, compostos por servidores designados pelos respectivos Poderes.
Caso
Os partidos PT e PDT ajuizaram ação no STF argumentando que a emenda foi aprovada sem o devido processo legislativo, violando o princípio da igualdade ao diferenciar a forma de contratação dos servidores.
Em 2007, o STF suspendeu os efeitos da EC 19, restabelecendo o regime jurídico único para servidores da administração direta, autarquias e fundações.
Voto da relatora
Em 2021, ministra Cármen Lúcia, relatora da ação, votou contra a norma impugnada, seguindo a decisão do STF de 2007.
S. Exa. ressaltou que houve irregularidades graves no processo legislativo que alterou o regime jurídico dos servidores públicos. Apontou que, apesar de a proposta ter sido rejeitada no primeiro turno de votação na Câmara dos Deputados, ela foi reintroduzida em um segundo turno, prática que ela classificou como uma "manobra" para burlar as exigências constitucionais.
A ministra destacou que a emenda não atingiu o quórum de 3/5 dos votos, necessário para aprovações desse tipo. Para Cármen Lúcia, a reintrodução da proposta, após sua rejeição inicial, violou o processo formal de reforma constitucional, em clara afronta à decisão do plenário da Câmara no primeiro turno. Além disso, a CF veda a reavaliação de matérias rejeitadas ou prejudicadas na mesma sessão legislativa, norma que também foi descumprida.
Cármen relembrou que o processo foi iniciado no STF em 2000, e a decisão cautelar só veio em 2007, após seis anos e quatro pedidos de vista. O Supremo, na época, suspendeu os efeitos da emenda e restabeleceu o regime jurídico único para os servidores da administração direta, autarquias e fundações públicas.
Nesse sentido, votou pela inconstitucionalidade formal da norma.
- Veja o voto da relatora.
Na tarde desta quarta-feira, 6, ministro Edson Fachin acompanhou a relatora, afirmando que o rito constitucional para votações dessa natureza não é uma questão interna do Legislativo.
Destacou a relevância e gravidade da questão, que envolve a manutenção do RJU no serviço público e a possibilidade de contratos sem regras estatutárias.
Segundo Fachin, a ação inicial alega incompatibilidade com dois dispositivos constitucionais específicos (§2º e §4º do art. 60 da CF), caracterizando o tema como constitucional e não meramente regimental.
Ministro Luiz Fux também acompanhou a relatora.
Divergência
Ministro Gilmar Mendes antecipou o voto, entendendo que o Legislativo apreciou a demanda nas respectivas Casas Legislativas, com as devidas fases.
Dessa forma, como os procedimentos foram seguidos e apreciados pelo Poder Legislativo, a norma não poderia ser considerada inconstitucional, como forma de "autocontenção" do Judiciário.
Nesta quarta-feira, 6, ao votar, ministro Nunes Marques acompanhou a divergência para afastar a inconstitucionalidade formal, destacando que o processo legislativo foi conduzido conforme o regimento interno da casa legislativa e dentro dos debates apropriados.
Segundo o ministro, o Judiciário não deve interferir em questões relacionadas ao procedimento interno do Legislativo, pois isso envolve atos típicos da atividade legislativa e respeita a autonomia entre os poderes.
No mesmo sentido votou ministro Flávio Dino. Entendeu que a análise dos efeitos de "destaque de votação em separado", de natureza exclusivamente regimental, não gera matéria passível de controle de constitucionalidade. Para S. Exa., esse tipo de questão pertence ao campo regimental e não cabe ao Judiciário avaliá-la do ponto de vista constitucional.
Ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso também acompanharam a divergência.
- Processo: ADIn 2.135