TST: Testemunha que move ação de assédio será ouvida em caso de colega
Para a 2ª turma, o fato de as duas processarem a empresa pelo mesmo motivo não gera suspeição.
Da Redação
segunda-feira, 7 de outubro de 2024
Atualizado às 15:42
A 2ª turma do TST determinou que uma testemunha seja ouvida em uma ação por assédio sexual movida por uma trabalhadora contra seu empregador. O colegiado entendeu que o fato de a testemunha também ter acionado a Justiça contra a empresa pelo mesmo motivo não configura, por si só, troca de favores. A relatora, ministra Maria Helena Mallmann, destacou que, em ações que investigam atos ilícitos contra a liberdade sexual, a palavra das vítimas possui especial relevância probatória. "Esse tipo de violência é praticado de forma velada, o que dificulta significativamente sua demonstração em juízo", ressaltou.
No caso em análise, a trabalhadora, que à época tinha 18 anos, alegou que, ao exercer suas funções como terceirizada em regime temporário, era obrigada a se agachar constantemente para realizar a separação de materiais. Segundo a trabalhadora, o supervisor se aproveitava desses momentos para forçar contato físico. Ao ser confrontado, o supervisor teria dito que ela deveria obedecê-lo, "pois quem manda sou eu, vocês têm que fazer tudo ao que falo". Uma colega de trabalho, que também afirmou ter sido assediada, compartilhou sua indignação com a autora da ação. A trabalhadora relatou ter informado os fatos à tomadora de serviços e solicitado transferência de setor, mas foi demitida em vez de ter seu pleito atendido.
Em sua defesa, a prestadora de serviços argumentou que a dispensa ocorreu em razão do término da demanda que motivou a contratação, alegando ainda que não tinha conhecimento dos fatos, pois apenas intermediava a mão de obra. A tomadora de serviços, por sua vez, negou a ocorrência de assédio. "O que se observa é uma conduta imatura da trabalhadora, normal ao primeiro emprego, mas nunca a caracterização de conduta que dê ensejo a algo tão grave, como o assédio sexual", sustentou.
Durante a audiência de conciliação, uma testemunha indicada pela trabalhadora confirmou os relatos da colega e afirmou ter ouvido de uma empregada da tomadora de serviço que, para serem efetivadas, "teriam que dar" para o supervisor. Ao procurar o RH, a testemunha teria ouvido da responsável pelo setor que a empresa já havia recebido outros relatos e estava "trabalhando" com o supervisor para solucionar a questão. No entanto, dias depois, ambas foram dispensadas.
A empresa questionou a validade do depoimento da testemunha, alegando que ela também ajuizou ação contra a empresa pelo mesmo motivo e, por isso, não teria isenção para depor. Para a empresa, a situação configurava "troca de favores".
A juíza de primeiro grau acolheu o argumento da empresa e ouviu a colega apenas como informante, o que conferiu menor peso ao depoimento. Assim, julgou improcedente o pedido de indenização da trabalhadora, por entender que não houve prova do assédio sexual além do depoimento da informante. A sentença foi mantida pelo trt da 3ª região, que entendeu ser evidente o interesse da informante na causa, por ter ação semelhante contra a empresa.
Ao analisar o recurso da trabalhadora, a ministra Maria Helena Mallmann explicou que, de acordo com a jurisprudência do TST (Súmula 357), o simples fato de uma testemunha ter ou ter tido uma ação contra o mesmo empregador não a torna suspeita.
No caso, nem a juíza nem o TRT apontaram indícios concretos de troca de favores. A ministra lembrou, ainda, que a comprovação do assédio sexual no ambiente de trabalho é uma tarefa desafiadora, que exige de quem julga sensibilidade para perceber as peculiaridades desse tipo de situação, considerando especialmente o fato de se tratarem de eventos traumáticos "praticados de forma furtiva, disfarçada, suscitando nas vítimas sentimento de estigma e vergonha".
Nesse sentido, o CNJ adotou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Segundo a relatora, a adoção dessa perspectiva na Justiça do Trabalho é de extrema importância, porque é esse ramo do Judiciário que busca corrigir as assimetrias entre o capital e o trabalho.
Para Maria Helena Mallmann, o TRT, ao concluir que a testemunha tinha interesse na causa, deixou de considerar o contexto em que o conflito está inserido, "marcado por fatores sobrepostos de opressão". Assim, a admissão da testemunha apenas como informante prejudicou o direito de defesa da trabalhadora.
Por unanimidade, a Turma determinou o retorno do caso ao TRT para que seja conferida eficácia plena ao depoimento da testemunha e reexaminadas as provas. (Carmem Feijó)
O processo tramita em segredo de justiça.
Informações: TST.