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Saúde e religião

STF decide que testemunhas de Jeová podem recusar transfusão de sangue

Por unanimidade, a Corte assegurou que paciente pode exigir procedimento médico diferenciado em razão de sua religião.

Da Redação

quarta-feira, 25 de setembro de 2024

Atualizado às 16:00

Nesta quarta-feira, 25, o STF julgou, por unanimidade, em sessão plenária, que testemunhas de Jeová podem recusar transfusão de sangue no SUS (RE 1.212.272) e que a União deve custear procedimentos alternativos à transfusão de sangue no sistema público de saúde (RE 979.742).

Em agosto, ocorreram as sustentações orais das partes envolvidas e as manifestações dos amici curiae. 

Acompanhe ao vivo:

Recusa à transfusão

O RE 1.212.272 envolve mulher testemunha de Jeová que, devido a uma doença cardíaca, foi encaminhada para a Santa Casa de Misericórdia em Maceió/AL para uma cirurgia de substituição de válvula aórtica.

Por motivos religiosos, ela recusou a transfusão de sangue, assinando um termo de consentimento sobre os riscos, mas negou a autorização prévia para transfusão, resultando no cancelamento da cirurgia.

A Justiça de Maceió manteve a decisão de que a cirurgia não poderia ocorrer sem a possibilidade de transfusão devido aos riscos.

A paciente recorreu, argumentando que a exigência de consentimento violava sua dignidade e direito à saúde, alegando que cabe a ela decidir sobre os riscos do tratamento.

Tratamento diferenciado

No caso do RE 979.742, a União recorre contra a decisão que a condenou, junto ao Estado do Amazonas e o município de Manaus, a custear uma cirurgia de artroplastia total em outro Estado para um paciente, já que o procedimento sem transfusão de sangue não está disponível no Amazonas.

A Procuradoria-Geral da República sugeriu que o Estado deve cobrir os custos de tratamentos que respeitem a liberdade religiosa, desde que esses tratamentos alternativos estejam disponíveis no sistema público de saúde.

Votos da semana passada

Na semana passada, os ministros Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo, e Gilmar Mendes, relatores, sublinharam que a liberdade religiosa garante ao paciente o direito de recusar a transfusão de sangue, além de exigir um tratamento alternativo, desde que a decisão seja tomada de maneira livre, consciente e informada sobre as consequências.

O ministro Barroso também votou a favor de que, havendo tratamento alternativo à transfusão no SUS, o Estado deve assegurar que o paciente Testemunha de Jeová tenha acesso a esse tratamento, incluindo o custeio de transporte e estadia em outro estado, desde que os custos não sejam desproporcionais.

O voto dos relatores também incorporou, após sugestões dos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e André Mendonça, que a recusa de tratamento com transfusão de sangue deve ser feita apenas em nome próprio. 

Ou seja, os pais não podem negar o tratamento médico aos filhos menores - nesses casos, o princípio do melhor interesse para a saúde e vida da criança e do adolescente deve prevalecer.

Em seu voto, o ministro Alexandre de Moraes destacou que o Estado não estaria sendo subserviente a uma determinada religião ao deixar de impor a transfusão de sangue.

"Não fere a laicidade do estado. Mas o Estado estaria impondo a sua vontade contra um dogma muito caro às testemunhas de Joevá. Estaria ferindo um dogma que é uma das bases da crença religiosa de inúmeras pessoas."

Já o ministro Luiz Fux, afirmou que a transfusão de sangue contra a vontade do paciente, ainda que em ordem judicial, "configura tratamento desumano e degradante". 

Apontou também que a violação do direito a saúde se configura "por proteção insuficiente se a pessoa é deixada ao desamparo, forçado a optar por uma vida digna ou a morte, quando existem tratamento alternativos razoáveis". 

Dessa forma, o Supremo definiu a tese que, no RE 1.212.272:

"1. Testemunhas de Jeová, quando maiores e capazes, tem o direito de recusar o procedimento médico que envolva transfusão de sangue com base na autonomia individual e na liberdade religiosa. 2. Como consequência, em respeito ao direito à vida e à saúde, fazem jus aos procedimentos alternativos disponíveis no SUS. Podendo, se necessário, recorrer a tratamento fora de seu domicílio."

E no RE 979.742:

"1. É permitido ao paciente no gozo pleno da sua capacidade civil recusar-se a se submeter a tratamento de saúde por motivos religiosos. A recusa a tratamento de saúde por razões religiosas é condicionada à decisão inequívoca, livre, informada e esclarecida do paciente, inclusive quando veiculada por meio de diretiva antecipada de vontade. 2. É possível a realização de procedimento médico disponibilizado a todos pelo SUS, com a interdição da realização de transfusão sanguínea ou outra medida excepcional, caso haja viabilidade técnico científica de sucesso, anuência da equipe médica com sua realização e decisão inequívoca livre e informada e esclarecida do paciente."

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